É VERDADE QUE O BRASIL VENCEU UMA GRANDE BATALHA NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL?

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O mais correto seria dizer que o Brasil conseguiu grandes vitórias em pequenas batalhas da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

A Força Expedicionária Brasileira (FEB) entrou em combate na Europa a partir do segundo semestre de 1944. Do lado dos aliados (Inglaterra, França, União Soviética e Estados Unidos), a FEB enfrentou as forças do Eixo (Alemanha, Itália e Japão) em território italiano, no chamado front do mediterrâneo. “Tivemos duas importantes vitórias em pequenas batalhas: Monte Castelo, em fevereiro de 1945, e Montese, em abril de 1945”, afirma o historiador Vágner Camilo Alves, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ).

Se alguém duvida de que essas batalhas foram secundárias no contexto geral da Segunda Guerra, basta analisar o efetivo brasileiro em ação. A FEB participou do conflito com apenas uma divisão de infantaria, enquanto só no front do Mediterrâneo os aliados contavam com um total de 23 divisões.

Aqui no Brasil, propagandas ufanistas, principalmente na época do governo militar (1964-1985), criaram a impressão de que a conquista de Monte Castelo – montanha da cordilheira apenina, no norte da Itália – foi uma batalha fundamental na Segunda Guerra.

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Apesar dessas ressalvas sobre a real dimensão de nossas vitórias, a atuação dos soldados brasileiros foi heróica. Mesmo mal treinados, com equipamento inadequado e enfrentando um frio de até 15 ºC negativos, eles conseguiram derrotar as forças alemãs que estavam entrincheiradas no alto do monte Castelo.

A ação brasileira fez parte de uma ofensiva maior de todo o IV Corpo do Exército dos Estados Unidos – do qual a FEB era uma das divisões. O resultado dessas operações conjuntas foi a expulsão dos alemães dos montes Apeninos, permitindo uma ofensiva dos aliados no norte da Itália que marcaria o fim dos confrontos no país.

Guerra no morro Tropas brasileiras enfrentaram até “fogo amigo” para conquistar Monte Castelo.

  1. A FEB já havia tentado tomar o monte Castelo três vezes no fim de 1944, acumulando cerca de 400 mortos e feridos. Na noite de 20 de fevereiro de 1945, a artilharia brasileira bombardeia os alemães posicionados na montanha dando início à quarta tentativa. Cinco ou seis caça-bombardeiros, possivelmente do esquadrão “Senta Pua”, metralham os alemães
  2. Na manhã do dia 21, três batalhões de infantaria da FEB recebem ordem de avançar para tentar tomar o monte. Os alemães respondem com fogo cerrado e a artilharia brasileira dá o troco, mas perde a mira e quase atinge nossas próprias tropas. O avanço é interrompido
  3. Ao meio-dia, o general americano Mark Clark, comandante das operações na Frente Italiana, visita o general brasileiro Mascarenhas de Moraes e vem a ordem para o avanço continuar. Uma unidade de elite americana toma espinhaços próximos para ajudar a subida dos brasileiros
  4. Perto das 14 horas, batedores relatam a chegada de reforços alemães que vieram de regiões próximas. Mesmo assim, as tropas brasileiras seguem avançando e atacam o penúltimo ponto antes de alcançar o cume do Monte Castelo
  5. Às 15h30, os combates diminuem e uma relativa calma se impõe na montanha. Os soldados brasileiros aproveitam para atender feridos e acompanhar as evoluções de um teco-teco da FEB que sobrevoa lentamente a área em missão de reconhecimento
  6. Às 16h20, a artilharia brasileira concentra seu fogo sobre a montanha, e o cume se transforma numa grande cratera. Oculta pela fumaça, uma unidade da FEB avança, mesmo sabendo que os aliados americanos ainda não conseguiram conquistar um ponto estratégico
  7. Sob uma chuva de morteiros nazistas, patrulhas brasileiras e alemãs se enfrentam em combates corpo-a-corpo, usando submetralhadoras, pistolas e fuzis com baioneta. Às 17h50, o tenente-coronel brasileiro Emílio Rodrigues Franklin anuncia pelo rádio: “Castelo é nosso!”

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Atrás da linha vermelha

As forças do Eixo na Itália tinham uma linha de defesa chamada Gustav. Quando ela foi rompida pelos aliados, em 1944, os alemães se retiraram para o norte, no alto da cordilheira apenina. Lá, montaram nova linha defensiva, a Gótica, da qual fazia parte o Monte Castelo.

Mergulhe nessa

Na livraria:

O Brasil e a Segunda Guerra Mundial: História de um Envolvimento Forçado – Vagner Camilo Alves, Editora Loyola, 2002

Guerra em Surdina: Histórias do Brasil na Segunda Guerra Mundial – Boris Schnaiderman, Editora Brasiliense, 1995

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Na internet:

http://www.exercito.gov.br/NE/2001/02/9801/feb801.htm

http://www.cpdoc.fgv.br/nav_historia/htm/anos37-45/ev_brnaguerra_operacoes.htm

FONTE – Roberto Navarro | Edição 36, Revista Mundo Estranho – http://mundoestranho.abril.com.br/materia/e-verdade-que-o-pais-venceu-uma-grande-batalha-na-segunda-guerra

70 ANOS DA ENTRADA DO BRASIL NA II GUERRA MUNDIAL – “FIZ A GUERRA DO COMEÇO AO FIM. ELA É UMA SELVAGERIA”

Depoimento: Boris Schnaiderman, escritor e tradutor

FONTE – http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,fiz-a-guerra-do-comeco-ao-fim-ela-e-uma-selvageria,921586,0.htm

Boris Schnaiderman na época da guerra.

Meu nome? Sou Boris Schnaiderman, com “sch”.

Nasci em 1917 em Úman, na Ucrânia, vim para o Brasil em 1924 e lutei no 2.º Grupo de Artilharia. Fui para a guerra porque queria ir. Era pacifista, mas achava absolutamente necessário lutar contra a Alemanha de Hitler. Fui convocado na véspera do embarque à Itália. Tudo foi em segredo. Tomamos o trem – luzes apagadas – e fomos ao porto. A viagem à Europa foi inesquecível. Enquanto viver, vou lembrar: foi terrível.

Na Itália, fui calculador de tiro. Eu era o controlador vertical, calculava o deslocamento do tubo-alma. O tubo do canhão se chama tubo-alma e eu calculava seu deslocamento vertical – havia outro sargento que media o horizontal. O primeiro tiro da artilharia brasileira fui eu que calculei. Atirei muito em cima de Monte Castelo. Inclusive vi de longe a nossa aviação em voo picado, descendo sobre as posições das metralhadoras alemãs. Depois, vi o chão estremecer com o bombardeio em Montese.

Dormíamos junto da central de tiros, caso fosse necessário atirar à noite. E tinha medo. Não há quem não tenha. Recebíamos bombardeio de artilharia. Caía a primeira granada e a gente sabia que o inimigo estava regulando o tiro. Ouvíamos o zunido e nos jogávamos no chão.

Mas é preciso frisar que havia uma diferença muito grande entre a nossa condição, na artilharia, e a do soldado de infantaria. Tanto é que eles nos chamavam de “saco B”. Eles passavam de caminhão e nos chamavam: “Ô, saco B!” Sabe por quê? Porque havia o saco A e o saco B. O A nós carregávamos nas costas em qualquer mudança de posição, com os objetos de uso imediato. O B era para objetos de reserva…

No dia da vitória, nós estávamos entrando na cidade de Stradella, na Lombardia, e eu desci do caminhão. Aí veio um italiano barbudo, bigodudo. Ele me agarrou, me deu um beijo na face e disse: “Eu estava te esperando. Faz 20 anos que eu te espero e só agora você chegou”.

O escritor e tradutor Boris Schnaiderman na atualidade

Fiz a guerra do começo ao fim. Ela é uma selvageria, mas naquela guerra todos tínhamos de nos unir. Se a Alemanha vencesse, o que seria de nós, não é? Uma coisa terrível.

Eu era de uma família de judeus completamente assimilados. Eu não tinha nenhuma formação de tradição judaica. Não falava iídiche, mas com a guerra ficou o sentimento de que pertencia a uma comunidade perseguida. Sentia-se o antissemitismo mesmo no Brasil. Eu lembro de tudo… e, às vezes, ainda tenho pesadelos com a guerra.” / MARCELO GODOY (TEXTO) e EVELSON DE FREITAS (FOTO)