1941 – SÓ UM VOLTOU… E PASSOU PELO RIO, RECIFE E NATAL

A Interessante História do Piloto da Luftwaffe Franz von Werra, o Único Prisioneiro de Guerra Alemão Que Conseguiu Voltar Para a Sua Pátria. E no Caminho Dele Estava o Brasil. Uma Vitória da Espionagem Nazifascista em Nosso País e Como Eles Enganaram a Polícia de Getúlio Vargas..

Rostand Medeiros – https://pt.wikipedia.org/wiki/Rostand_Medeiros

Franz von Werra, cujo nome original era François Gustave von Werra, nasceu em Leuk, no cantão suíço de Valais, em 13 de julho de 1914. Era filho do Barão Leo von Werra, um nobre empobrecido devido a decadência econômica dos seus negócios.

Quando a família perdeu as finanças, seu pai confiou a educação de Franz e de sua irmã Emma à família da Baronesa von Haber, uma representante autorizada da aristocracia alemã. Eles cresceram na casa Haber e o menino mudou seu nome, tornando-se Franz von Werra.

Franz von Werra

Em 1936, após a sua formatura, Werra alistou-se na Luftwaffe, a Força Aérea da Alemanha de Hitler. Obteve sua licença de piloto em 1938 e foi designado para um esquadrão de caça. Com a eclosão da Segunda Guerra, Werra e a sua unidade participam da conquista da França e em maio de 1940 ele derruba sozinho dois bombardeiros franceses e é condecorado com a Cruz de Ferro. Consta que teria destruído mais duas aeronaves inimigas.

Desenho com o esquema de cores do caça Messerschmitt ME 109 do tenente Werra.

A Autopromoção de Um Piloto de Caça.

Durante a Batalha da Inglaterra, quando os pilotos alemães se bateram contra os aviadores da Força Aérea Real, ou Royal Air Force (a famosa RAF), Werra alegou que derrotou e destruiu nove aviões ingleses, quatro no ar e cinco em terra. No entanto, por falta de testemunhas, seus superiores creditaram apenas quatro aeronaves abatidas em voo e ele recebeu uma segunda condecoração.

Werra e o filhote de leão.

Ambicioso, o tenente Franz von Werra logo percebeu que para ter uma carreira de sucesso na Luftwaffe não bastava apenas conquistar vitórias no ar, era necessário realizar muita autopromoção. Ele começou a usar regularmente o título de “Barão” e em uma ocasião, quando um grupo de jornalistas visitou a sua esquadrilha para uma sessão de fotos e entrevistas, o tenente Werra apareceu com um pequeno leão vindo de um zoológico alemão. O animal era chamado de Simba e o piloto disse aos visitantes que ele era “o mascote da unidade”. Como era uma mascote bem diferente, os fotógrafos fizeram a festa. A série resultante de fotografias mostrava Werra posando no cockpit de seu caça Messerschmitt ME 109, usando o boné de oficial e segurando Simba para a câmera. As imagens do piloto e do leãozinho apareceram nas mais populares revistas da Alemanha.

Em 5 de setembro de 1940, caças ME 109 decolaram de Calais, França, em direção à Inglaterra, como parte de uma escolta para um ataque de bombardeiros, sendo um dos caças pilotado por Werra. No retorno da missão eles foram atacados por vários aviões de caça Spitfire e a aeronave de Werra foi atingida. Ele então realizou um pouso de emergência bem sucedido em uma área de plantação. Depois que a nuvem de poeira baixou, o piloto do Messerschmitt danificado levantou o capô e saiu do cockpit ileso. Percebeu que não tinha como fugir e ficou ao lado da aeronave. Seus captores o encontraram queimando calmamente seus documentos de voo.

O caça Messerschmitt ME 109 de Werra nas mãos dos ingleses.

O Cativeiro e as Fugas.

Franz von Werra foi levado pelos militares para interrogatório. Ocorre que os ingleses sabiam do gosto daquele alemão pelos holofotes e lhe dedicaram uma atenção especial.

Os oficiais dos serviços de informação lhe questionaram várias vezes, usando seus melhores meios disponíveis para fazê-lo falar. Segundo Werra explicou em seu relatório, produzido após ele conseguir retornar para Berlim e que depois foi transformado em um livro (Einer kam durch. Fluchtbericht des Fliegerleutnants Franz von Werra / Um conseguiu passar –  Relatório de fuga do Tenente Franz von Werra), ele resistiu e nunca perdeu a calma, fechando-se em um silêncio quase absoluto.

Depois de vinte dias de infrutíferos interrogatórios, os britânicos o transferiram para um campo de prisioneiros em uma antiga casa chamada Grizedale Hall, localizada em um pântano a 30 quilômetros do Mar da Irlanda, no noroeste da Inglaterra.

Grizedale Hall.

O piloto alemão estava determinado a escapar e logo estudou as características daquela prisão. Em 7 de outubro, com a cooperação dos outros prisioneiros, Werra realizou a sua fuga. Durante uma caminhada diurna fora do acampamento, quando os ingleses ordenaram uma parada para descanso, o piloto alemão deslizou sobre um muro de pedra seca e ganhou o campo. Após descobrirem que ele fugira, os guardas alertaram os agricultores locais. Werra conseguiu ficar escondido durante três dias, mas no quarto foi localizado por dois soldados da Home Guard, a força de vigilância interna da Inglaterra na época. Estava em uma cabana de materiais agrícolas, mas percebeu a chegada dos seus captores e novamente conseguiu escapar. Em 12 de outubro ele foi visto por agricultores, que informaram as autoridades e a área onde se encontrava foi cercada. Finalmente Werra foi achado em uma depressão lamacenta no chão completamente exausto. Foi levado de volta para Grizedal Hall, onde passou 21 dias de confinamento na solitária.

Local da prisão em Swanwick, o casarão “The Hayes”.

Mais tarde o piloto alemão foi transferido para Swanwick, região de Derbyshire, centro da Inglaterra, onde foi encarcerado em uma grande casa construída na década de 1860. Chamada “The Hayes”, essa velha residência foi denominada na Segunda Guerra como “Campo 13” e apesar das medidas de alta segurança desse local, Werra começou a estudar a possibilidade de uma nova fuga.

Werra conseguiu desenvolver um plano com outros quatro companheiros e começou a construir um túnel subterrâneo. Trabalharam por cerca de um mês e mesmo com um colapso parcial do teto da galeria e o risco constante de serem capturados, os cinco presos fugiram na noite de 20 para 21 de dezembro de 1940.

O túnel aberto por Werra e seus companheiros no subsolo do casarão “The Hayes” ainda existe.

Segundo Werra comentou em seu relatório, o plano era um tanto simples, como imprudente: ele iria até uma base aérea dos ingleses, se apresentaria na porta da frente como um capitão da aviação holandesa e tentaria na base da conversa se apossar de uma aeronave.

Nessa época a Holanda havia sido ocupada pelos alemães e muitos dos seus pilotos voavam agora em esquadrilhas britânicas. Ele deu um jeito de fazer junto com seus companheiros de prisão um traje de voo improvável e uma identidade falsa. Mas as suas principais armas eram o seu talento e a sua audácia para inventar histórias.

Aviadores holandeses na Inglaterra, sendo fotografados em um caça Spitfire.

Aproveitando-se de seu bom conhecimento de inglês, o jovem tenente chegou a uma base aérea da RAF chamada Codnor Park Station, onde convenceu os guardas que era o “capitão van Lott” e entrou. Disse então a um funcionário local que seu avião teve que fazer um pouso forçado ao retornar de uma missão sobre a Dinamarca e que ele telefonasse para a base de Hucknall pedindo que fosse buscá-lo. Esperando o carro, a polícia submeteu o piloto a algumas perguntas sobre a sua história, concluindo que aquele estranho dizia a verdade. O carro chegou e ele partiu.

Base de Hucknall.

Na base de Hucknall sua história foi ainda verificada por um oficial de plantão, que telefonou para uma base, a qual o holandês disse que pertencia. Nesse meio tempo Von Werra pediu para ir ao banheiro e deixou a sala, caminhou até o hangar e, com a ajuda involuntária de um mecânico, entrou na cabine de um avião de caça Hurricane. Enquanto tentava freneticamente ligar a aeronave, o oficial de serviço saltou sobre a asa com a arma na mão e o prendeu. Os ingleses ficaram impressionados, pois até então ninguém tinha sido capaz de entrar em uma base aérea pelo portão da frente e quase se apossar de uma aeronave para fugir. O audacioso piloto alemão foi enviado de volta para o campo Swanwick.

Os ingleses já estavam fartos dele e decidiram enviá-lo em janeiro de 1941 para o distante Canadá, junto com outros 1.050 prisioneiros alemães.

A Fuga do Navio.

Ele cruzou o Oceano Atlântico no navio Dusshes of York e a bordo começou a arquitetar uma nova fuga.

Navio Dusshes of York.

Werra conheceu entre os prisioneiros alguns oficiais de submarinos alemães e descobriu que se o navio fosse tomado à força, seria possível conseguir apoio dos submarinos germânicos espalhados pelo Atlântico Norte e chegar até a costa da França dominada pelos alemães.

Mas havia um empecilho: o Dusshes of York transportava 1.050 alemães prisioneiros e 1.500 soldados britânicos armados, que iriam para a África do Norte lutar contra as tropas do Afrika Korps, comandado pelo famoso general Erwin Rommel. Aí realmente complicou para um possível motim a bordo.

Prisioneiros alemães desembarcando no Canadá.

Mas o endiabrado piloto da Luftwaffe não parou. Logo ele deu um jeito de roubar os documentos, dinheiro e um uniforme do contramestre Arthur Wood, um dos tripulantes do navio. Preparou-se corretamente e escapuliu quando a nave atracou no porto da cidade canadense de Halifax. Demorou mais de três horas para os ingleses e canadenses descobrirem a sua fuga e começaram uma busca pela cidade.

Apesar de ter conseguido com esse roubo certa quantidade de libras esterlinas, a moeda da Inglaterra, Werra descobriu amargamente que o comércio local estava proibido de transacionar com dinheiro estrangeiro devido ao estado de guerra. Continuou então a circular feito um vagabundo pelos próximos dias. Chegou a ver a sua foto em um cartaz de procura-se e tratou de ser ainda mais cauteloso. Por onde passou em Halifax se apresentou como um marinheiro inglês em busca de trabalho. Chegou a dormir no relento e conseguiu alguma comida.

Docas de Halifax em 1941.

Espertamente ele lembrou que próximo aos portos de todo mundo, sempre existiram pessoas para as quais as regras e as leis normalmente são burladas. Ele encontrou essa pessoa na figura de um chinês, que tinha um bar perto do cais. Era um lugar de péssima fama, que aparentemente também servia de prostíbulo, mas o proprietário do estabelecimento não teve problemas em trocar o dinheiro inglês por dólares canadenses e conseguiu para ele um quarto verdadeiramente imundo, mas com uma cama grande e alguma comida.

Marinheiros na região do Porto de Halifax durante a Segunda Guerra Mundial 

Mas a Real Polícia Montada do Canadá continuava procurando Werra em toda Halifax e eles fizeram uma verdadeira operação pente fino na área do porto. Não demorou quando dois homens da lei chegaram até o seu quarto e procuraram saber quem ele era. Em um primeiro momento os policiais até acreditaram na sua conversa de homem do mar desempregado e em busca de trabalho. Só que um deles desconfiou do linguajar refinado daquele homem, bem diferente do rude e típico palavreado dos marinheiros ingleses, normalmente cheio de palavrões. Werra continuou tentando levá-los na conversa, mas acabou novamente preso.

Nessa ocasião, por um ato de rebeldia ao se negar a colocar algemas com a alegação que era um oficial da Luftwaffe, levou foi uma boa surra dos policiais canadenses!

Cruzando a Fronteira e Se Tornando Uma Estrela.

Ele foi colocado em um trem com os mesmos prisioneiros que conhecera no Dusshes of York e, sem nenhuma novidade, começou a planejar uma nova fuga.

Soube que o trem estava seguindo para um lugar chamado Schreiber, no Lago Superior, na província de Ontário, onde os oficiais alemães seriam alojados no chamado “Campo W” e que o trajeto levaria três dias para ser completado.

Para a sorte de Werra, os canadenses colocaram cerca de 200 homens da Guarda de Veteranos Canadenses, que já haviam servido na Primeira Guerra Mundial. Aquilo para alguém com o currículo de Franz von Werra era uma situação muito positiva.

Não demorou e ele conseguiu saltar do seu vagão quando a composição fazia uma curva e diminuiu a velocidade. Só que a ação foi à noite, com uma temperatura de menos 20 graus célsius, a neve com mais de um metro de profundidade e um céu magnificamente estrelado.

Werra novamente deu muita sorte, pois a fuga só foi descoberta na manhã seguinte. Sete outros prisioneiros tentaram escapar do mesmo trem, mas foram logo recapturados.

Já o fugitivo solitário alcançou a pé a fronteira com os Estados Unidos, delimitada pelo Rio São Lourenço, que na época estava congelado. Ele tentou atravessar o rio caminhando sobre o gelo, mas então encontrou um canal aberto e foi obrigado a desistir. Voltou então para a região canadense, tomou posse de um barco a remos e conseguiu chegar ao território dos Estados Unidos.

Nessa época esse país mantinha-se neutro em relação à guerra na Europa, mas o clima interno era completamente a favor dos ingleses.

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Foto do tenente Werra em jornais americanos.

O fugitivo conseguiu chegar à cidade americana de Ogdensbur, no estado de Nova York, e entregou-se à polícia. Quando encontrou um guarda caminhando na rua, ele levantou os braços e disse “- Eu me rendo!”.

As autoridades de imigração o acusaram de entrar ilegalmente no país e foi arbitrada uma fiança de 5.000 dólares. No outro dia o advogado do consulado alemão de Nova York chegou à cidade e pagou a fiança. O juiz local encerrou o processo e Franz von Werra estava novamente livre. Naquela mesma noite ele viajou para Nova York, onde a colônia alemã o recebeu com entusiasmo.

No outro dia após a sua chegada, esteve com o Cônsul Geral Dr. Hans Borchers e o General Friedrich von Bötticher, adido militar da Embaixada da Alemanha em Washington. Diante da situação, o consulado alemão lhe deu dinheiro, e crédito para ele comprar ternos caros das melhores lojas de roupas masculinas da Quinta Avenida.

Logo ele começou a sair pelas ruas da “Big City” americana e se apresentar a todos como o “Barão von Werra”. As qualidades de autopromoção de Werra o fizeram rapidamente se tornar famoso em todo o país, enquanto a história de sua fuga se espalhava por todo o mundo.

A chegada de Werra em um joprnal americano.

Ele se deixou fotografar com mulheres bonitas, visitou os teatros da Broadway e as pequenas e intimistas casas noturnas da Times Square. Quase sempre estava acompanhado por uma legião de admiradores. Deu entrevistas e, sem nenhuma surpresa, começou a se gabar por se considerar “um estrangeiro ilegal nos Estados Unidos”. Aos jornalistas, Werra deu uma versão muito embelezada de sua história.

Nesse meio tempo o governo canadense passou a exigir a sua extradição como um reles ladrão, pois ele havia roubado um barco para escapar pelo Rio São Lourenço. Essa era uma forma de contornar a extradição ilegal de um prisioneiro de guerra de um país neutro. O Cônsul Geral Borchers ofereceu-se para enviar aos canadenses um cheque de 35 dólares — o valor que o barco havia custado. Os canadenses recusaram. Eles queriam Werra, não o cheque.

Em 1º de fevereiro, um tribunal federal em Albany, capital do estado de Nova York, julgou o imigrante ilegal Franz von Werra. O tribunal não conseguiu chegar a um veredito final, sendo a audiência adiada e a sua fiança foi arbitrada em 10.000 dólares (algumas fontes afirmam que foram 15.000). Mas o Cônsul Geral Borchers pagou sem pestanejar.

Werra e sua fuga foram noticiados em jornais de todo o mundo.

Nos bastidores, uma batalha feroz por Werra se desenrolava.

Enquanto o público americano estava, em geral, bastante satisfeito com o fugitivo e suas aventuras, as relações entre os Estados Unidos e a Alemanha Nazista pioravam a cada dia e se tornou óbvio que aquele fugitivo era um problema complicado.

Já para o governo inglês, além de Werra ter se tornado um sério aborrecimento pelas muitas fugas empreendidas, havia algo muito pior. Aquele piloto havia se tornado um perigo para a segurança militar, pois testemunhara as técnicas de interrogatório durante a sua prisão e, se conseguisse retornar a Alemanha, levaria para os nazistas toda a sua experiência. Algo que futuramente poderia ser utilizado contra os ingleses.

Nova York em 1941.

Em meio a toda essa confusão, na noite de 24 de março de 1941, Franz von Werra partiu de Nova York sem que as autoridades americanas percebessem.

Ele então embarcou em sua última grande jornada, que o levaria a percorrer metade do mundo, com passagem pelo Brasil.

Rumo ao Sul Caliente.

Passando por uma longa série de mudanças de trem, táxis, ou carros particulares, Werra chegou à cidade de El Paso, no Texas, onde ele poderia misturar-se a uma verdadeira legião de humildes trabalhadores mexicanos, que cruzavam a fronteira do seu país com os Estados Unidos em busca de trabalho nas lavouras texanas.

Cartão postal de El Paso, no Texas, em 1941.

O fugitivo ultrapassou a fronteira em meio aos que retornavam dos Estados Unidos e conseguiu chegar à estação ferroviária de Ciudad Juárez, onde comprou uma passagem de trem destinada à Cidade do México.

Werra viajou na terceira classe, a mais barata, reservada apenas para os mexicanos mais pobres. Mas ele tinha certeza que os funcionários da alfândega mexicana deixariam em paz aqueles que utilizavam aquela parte do trem. E acertou, pois ninguém lhe perturbou naquela longa viagem através do território mexicano.

Trabalhadores mexicanos em uma lavoura nos Estados Unidos na década de 1940.

O alemão sentou-se espremido entre fazendeiros, operários, trabalhadores do campo, moças de pele escura, velhas de cabelos brancos emaranhados e crianças chorando. Em seu relatório afirmou que “Os mexicanos tagarelaram da manhã à noite”. Mas eram pessoas de boa índole, que lhe ofereceram um pouco da sua comida e lhe estenderam jarras de barro com água e vinho. Ele tentou se comunicar com muitos gestos, mas os nativos não entenderam absolutamente nada.

Depois de dois dias e meio viajando 1.970 quilômetro no compartimento superlotado e quente, ele não precisava mais se preocupar em ser reconhecido. Estava suado, com o terno amassado, sujo, coberto com a poeira cor vermelha-tijolo daquele país e que constantemente entrava pelas janelas abertas do vagão.

Estação Central da Cidade do México.

Na noite de 28 de março, Werra chegou à Cidade do México, na Estação Central. A embaixada alemã havia recebido a informação que o fugitivo era esperado naquele dia. Quando a multidão se dispersou, Werra foi até o pátio da estação e viu um grande Mercedes-Benz preto, com o motorista examinando as pessoas que saíam. Ele não prestou atenção alguma a Werra em seu traje mexicano. O piloto então ficou na sua frente e lhe disse sorrindo: “Grüß gott!” (Bom dia!). O motorista o encarou e então compreendeu a situação. Com uma risada larga, abriu a porta do carro, bateu discretamente os calcanhares e disse “Seja bem-vindo à Cidade do México tenente Werra”.

Na embaixada alemã, Franz von Werra se transformou no estudante “Bernd Natus”, o nome que constava em um passaporte falso, que incluía vistos de trânsito para o Peru, a Bolívia e o Brasil.

Consulado da Alemanha Nazista no México em 1940.

Evidentemente tudo foi tratado de maneira muito discreta, sem recepções à imprensa, entrevistas ou celebrações públicas no México. Werra conta que passou o fim de semana recluso na propriedade do cônsul alemão em Cuernavaca e chegou até a fazer algumas compras para sua noiva Elfi, e ainda lhe escreveu contando suas aventuras. Werra visitou vários monumentos astecas e ficou maravilhado diante dessas testemunhas do grande passado do México.

A Fuga Durante a Semana Santa.

Voou do México para o Peru em 1º de abril. Após três dias deixou Lima, onde havia se hospedado com o cônsul alemão, e seguiu em um avião de transporte trimotor Junkers Ju 52 para a Bolívia. Passou uma noite na capital La Paz, e em 9 de abril voou para o território brasileiro em uma aeronave do Lloyd Aéreo Boliviano, pertencente a empresários alemães. Chegou sem problemas a Corumbá, Mato Grosso.

Aquele era um tempo onde viajar de avião no Brasil era para muito poucos e os jornais da época registravam os que tinham esse privilégio. Era normalmente divulgadas as listas de passageiros, que também não eram muitos. Assim é possível compreender a operação de apoio ao tenente Werra no Brasil.

O hidroavião JU-52 Maipó, do Sindicato Condor.

Os jornais informaram que no dia 8 de abril de 1941, partiu do Rio de Janeiro o hidroavião Junkers Ju 52, batizado como “Maipó”, e pertencente à empresa aérea Sindicato Condor. Essa era uma subsidiária da Deutsche Lufthansa, que operava em todo o Brasil. A aeronave tinha como destino Cuiabá, com escala em Corumbá, e transportava onze passageiros, entre eles o engenheiro alemão Gustav Albert Salz, que desembarcou em Cuiabá. Consta então nos jornais que Salz retornou para o Rio um dia após a sua chegada à capital mato-grossense, utilizando o mesmo hidroavião “Maipó” e que na escala de Corumbá embarcou um certo elemento de nome Bruno Krause. Eles dois estavam entre os quatro passageiros que desembarcaram no Rio no dia 10 de abril, que Werra afirma em seu relatório ter sido a data de sua chegada à então Capital Federal.

Seria então Bruno Krause uma nova e falsa identidade de Franz von Werra?

Notícia publicada após a passagem do tenente Werra pela América do Sul, mostrando a rota da sua fuga.

Meses depois que esse piloto alemão passou pela América do Sul e conseguiu chegar ao seu país, jornais cariocas publicaram uma nota vinda da agência de notícias norte-americana United Press, que basicamente resumiu parte da trajetória do fugitivo pelos países sul-americanos e informou que ele vinha com nome falso. Isso pode apontar que os americanos da OSS que estavam no encalço de Werra, tenham perdido a sua pista na capital peruana por ele utilizar os nomes falsos de Bernd Natus e Bruno Krause. Em tempo, a OSS era a sigla em inglês para o antigo Office of Strategic Services, ou Escritório de Serviços Estratégicos, o serviço de inteligência dos Estados Unidos na época da Segunda Guerra e que hoje é conhecido como CIA.

E qual foi à razão do engenheiro alemão Salz realizar essa viagem tão longa e de maneira tão rápida? Seria para ele dar apoio e cobertura a Werra? Não sabemos!

Mas temos conhecimento que o engenheiro Salz havia inicialmente chegado ao Brasil em 29 de maio de 1940, vindo do Peru, passando depois pela Bolívia e utilizando a mesma rota aérea que o “Maipó” percorreu em 10 de abril de 1941 para chegar ao Rio. Outra informação aponta que ele morava no 8º andar de um prédio na Avenida Rio Branco, 128, Centro do Rio. Guardem o endereço!

Rua Paissandu, no bairro do Flamengo, onde ficava a sede da Embaixada Alemã no Brasil em 1941.

Em seu relatório Werra não informa, mas como ele fez isso no México e no Peru, é muito provável que após a sua chegada ele tenha se dirigido a Embaixada da Alemanha, que nessa época ficava na bela e arborizada Rua Paissandu, número 53, no bairro do Flamengo.

Se em seu relatório Werra não comenta nenhuma visita a embaixada do seu país no Rio, entretanto afirma que esteve na sede da empresa LATI, ou Linee Aeree Transcontinentali Italiane. Essa era uma empresa de aviação e também um verdadeiro valhacouto de espiões do Eixo atuando no Brasil. Sua sede ficava no térreo de um edifício na Avenida Rio Branco, 104, Centro do Rio, a poucos metros de onde morava o engenheiro alemão Gustav Albert Salz.

Propaganda da empresa LATI no Rio, com seu endereço.

Seria apenas coincidência?

Independente dessa questão, temos que observar a astúcia das autoridades alemãs que atuaram na fuga do piloto da Luftwaffe, que culminou com a sua chegada ao Rio em plena Quinta Feira Santa. Em um país que nessa época era majoritariamente católico, o feriado da Semana Santa era o melhor momento para qualquer fugitivo estar circulando tranquilamente por aqui.

Mas qual seria a melhor maneira de continuar essa fuga e voltar ileso para a Alemanha?

Uma Empresa Complicada.

Certamente o avião era o melhor transporte para Werra e naquele momento no Brasil só os italianos da LATI poderiam resolver a questão.

Chegada de avião da LATI no Rio – Fonte – Arquivo Time-Life.

A LATI foi oficialmente fundada em 11 de setembro de 1939, dez dias após o início da Segunda Guerra Mundial, como uma empresa aérea destinada a atuar em uma rota que buscava ligar a Itália à América do Sul em menos de 48 horas.

Os voos experimentais foram então iniciados em 3 de outubro de 1939 e a empresa contava com apoio do governo italiano. Tanto que o seu diretor era simplesmente Bruno Mussolini, filho do ditador Benito Mussolini. Com esse aporte a organização da empresa e dos seus voos seguiu bem rápido e em 22 de dezembro ocorreu o voo inaugural partindo do Brasil para a Itália.

Chegada de avião da LATI no Rio – Fonte – Arquivo Time-Life.

Os italianos utilizaram nesta rota da LATI os confiáveis e resistentes aviões trimotores Savoia Marchetti SM.75, SM.76, SM.82 e SM.83. Até 19 de junho de 1940, essas aeronaves conseguiram realizar quase 60 travessias atlânticas, levando principalmente correspondência, a uma média de 260 a 330 kg de malotes por voo, além de alguns passageiros adicionais.

A linha previa uma viagem semanal nas duas direções, com a rota partindo de Roma (Itália), depois Sevilha (Espanha), Lisboa (Portugal), Villa Cisneros (atual cidade de Dakhla, no Saara Ocidental, na época uma possessão espanhola), Ilha do Sal (no Cabo Verde, então colônia portuguesa), Natal, Recife e Rio de Janeiro.

Chegada de avião da LATI no Rio – Fonte – Arquivo Time-Life.

Com o tempo, os voos regulares entre o Brasil e a Europa passaram a transportar importantes figuras nacionais e estrangeiras, além de correios especiais dos diplomatas alemães e italianos, que não podiam ser violados. Muitos desses diplomatas eram na verdade espiões nazifascistas disfarçados. Já nos voos de retorno a Europa seguiram materiais raros e estratégicos, como diamantes, platina, mica, substâncias químicas, livros e filmes de propaganda dos Aliados. Um verdadeiro “buraco” no bloqueio militar e econômico efetuado pelos ingleses contra a Alemanha e a Itália.

Mas tinha mais. O historiador norte-americano Stanley E. Hilton, em seu livro Hitler’s Secret War In South America, 1939-1945: German Military Espionage and Allied Counterespionage in Brazil informou que membros da embaixada americana no Brasil transmitiram aos britânicos que durante as travessias no Oceano Atlântico, os pilotos da LATI estavam visualizando navios britânicos, marcando suas posições em mapas e informando os alemães para enviar seus submarinos e afundá-los.

Mas os voos da LATI não seguiam sem problemas e houve um bem sério!

Em 15 de janeiro de 1941, um SM.75C com a matrícula I-BAYR, partiu de Natal para a ilha do Sal com dez tripulantes e passageiros. Ao se aproximarem de Fernando de Noronha o motor central nº 2 perdeu potência e o piloto foi forçado a descer a aeronave no mar. Ninguém que estava a bordo foi encontrado com vida. Existiu na época a informação que esse acidente poderia ter ocorrido pela sobrecarga de minerais estratégicos sendo contrabandeados para o aliado alemão, ou por uma bem montada operação de sabotagem dos ingleses.

Houve outras situações negativas envolvendo a LATI e sua atuação no Brasil, mas agora uma de suas aeronaves serviria para uma missão diferenciada; transportar clandestinamente um combatente das forças armadas nazistas para a Alemanha. 

A Viagem Para o Nordeste do Brasil.

Como comentamos anteriormente, Franz von Werra chegou na Quinta Feira Santa ao Rio de Janeiro. Já a sua partida se deu no dia 13 de abril de 1941, Domingo de Páscoa. E o que ele fez no Rio enquanto ali esteve? Não sabemos, pois nada deixou escrito em seu relatório.

Provavelmente ele ficou mesmo escondido na embaixada, ou na casa de algum funcionário. Até porque a espionagem britânica atuava então fortemente no Brasil e recapturar Werra, ou mesmo matá-lo, seria algo bastante desejado.

Campo do Ibura durante a Segunda Guerra Mundial.

Nos jornais cariocas não existe nenhuma informação da partida de alguma aeronave da LATI para o Nordeste do Brasil no dia 13. Mas no Diário de Pernambuco, encontrei uma nota (abaixo) que comenta sobre a aterrissagem da aeronave Savoia Marchetti SM.83, prefixo I-ASSO, no Campo do Ibura, Recife. Eram 13h50min do domingo e a bordo vinha um único passageiro – Berd Notus.

Após desembarcar e diante de sua situação, seria de esperar que esse único passageiro agisse de maneira discreta e sem chamar a atenção. Mas foi tudo exatamente o contrário.

Notus (Werra) não resistiu e começou a dar declarações ao encontrar o jornalista do Diário de Pernambuco que estava de plantão no Ibura e acompanhava os pousos e as decolagens das aeronaves. Apresentou-se como “estudante” e “filho do ministro da Alemanha no México” e chegou ao cúmulo de afirmar que “vai à Alemanha alistar-se na Luftwaffe” e que “esperava lutar ainda esse ano”. Só faltou dizer que era um “Barão”!

Era uma total falta de senso de segurança, muita irresponsabilidade e, certamente, um extremo excesso de arrogância. Aparentemente o tenente alemão nem se importou com a presença de Gino Portesi, um capitão da Regia Aeronáutica, a força aérea fascista, que além de ter sido o piloto do avião que trouxe Werra do Rio, era o subdiretor no Brasil da Ala Littoria, a companhia aérea nacional italiana e controladora do capital da LATI.

Através de um documento (acima) da Delegacia de Ordem Política e Social, DOPS, de Recife, produzido em 5 de maio de 1942, descobrimos que realmente o piloto alemão quase colocou tudo a perder no Campo do Ibura. Nesse documento, produzido um ano depois da passagem de Franz von Werra pela capital pernambucana, existe a informação que um inspetor da Polícia Marítima desconfiou do jovem falastrão que se dizia “estudante” e apresentou o passaporte nº 298. Mas ficou só nisso.

A verdade é que Werra passou pelo Brasil e a polícia do ditador Getúlio Vargas nem se deu conta e nem tomou conhecimento. Isso se ele não recebeu algum tipo de ajuda de alguma autoridade brasileira. Situação que não duvido, dado o grande número de simpatizantes nazifascistas em nosso país.

Esquema de cores de um trimotor SM.82 da empresa LATI.

Na mesma tarde o fugitivo embarcou em um moderno Savoia Marchetti SM.82 de prefixo I-BATO. Era uma aeronave recém-construída, que transportava dez passageiros, possuía um piloto automático, banheiro, rádios aprimorados e dois tanques de combustível adicionais. Além da tripulação, o I-BATO transportava oito passageiros, sendo cinco alemães e três italianos, entre eles Werra e Portesi. A aeronave decolou do Ibura utilizando a potência máxima de seus três poderosos motores Alfa Romeo 128RC e chegou a Natal cerca de uma hora depois.

No Campo de Parnamirim.

A pista era longa, mas de terra batida. Entretanto era boa, bem preparada, com 700 metros de extensão, 40 de largura e o SM.82 aterrissou sem problemas no chamado Campo de Parnamirim. Sabemos que Natal entrou na rota de retorno da LATI porque Recife não possuía em seu campo de pouso uma pista longa o suficiente para permitir a decolagem das aeronaves completamente carregadas.

A aeronave chegou pilotada por Guido Pavia, com Bruno Palermo como copiloto, Michele de Toma como radiotelegrafista e Alfredo Piacentini como mecânico. Foi informado que transportava “grande quantidade de mercadoria e malas postais”.

No antigo jornal natalense O Diário, futuro Diário de Natal, encontrei a informação que normalmente o avião da LATI vinha para a capital potiguar na sexta feira, mas aquele chegou em pleno Domingo de Páscoa e isso aparentemente não foi visto como estranho ou anormal.  

Os tripulantes e passageiros foram então acomodados no que era conhecido como “Hotel da LATI”, próximo do hangar da empresa. Não existem maiores informações sobre esse local, mas tudo indica que era tipo uma estalagem, sem maiores confortos, servindo apenas para acomodar os que embarcariam na manhã seguinte para a travessia do Atlântico Sul.

Situação atual da antiga casa de apoio construida para os aviadores franceses no Campo de Parnamirim.

Próximo ao hangar dos italianos existia outros dois Hangares, uma casa de apoio, uma estação de rádio e outras infraestruturas. Elas pertenciam aos franceses da Air France e algumas delas estavam ali desde o início da década anterior. Inclusive a casa de apoio havia servido em algumas ocasiões ao mítico piloto francês Jean Mermoz, quando das suas passagens por Natal. Não era sem razão que nos primeiros tempos de sua utilização, aquele local era conhecido como o “Campo dos Franceses”.

Não sabemos de nenhuma outra movimentação específica no Campo de Parnamirim naquela tarde e início da noite de 13 de abril de 1941, mas sabemos que nessa época o aeroporto estava com uma boa movimentação de estrangeiros, com vários deles circulando por Natal e as regiões Norte e Nordeste. Segundo os jornais natalenses, poucos dias antes de Werra desembarcar no Campo de Parnamirim, em 5 de abril, esteve em Natal uma “missão comercial japonesa” com quatro membros. Eles viajavam em um hidroavião do Sindicato Condor batizado como “Curupira”, que depois de Natal seguiu para Belém do Pará.

Situação atual do antigo hangar da LATI no Campo de Parnamirim.

E após a chegada do fugitivo Werra ao Rio Grande do Norte, ele teria vindo para Natal? Acho difícil!

Era algo que chamaria bastante a atenção para alguém com um passado que, se não era muito conhecido pela população local, certamente era conhecido de muitos estrangeiros que circulavam na cidade, a grande maioria deles de países contrários aos interesses da Alemanha, Itália e Japão, os países do Eixo. E em caso de Werra ser reconhecido, coisa que poderia acontecer com a sua terrível e constante indiscrição, logo os ingleses estariam no seu encalço.

Além do mais, se havia alguma coisa interessante naquela parte do Brasil para ser vista por um piloto da Luftwaffe, estava no próprio Campo de Parnamirim onde ele havia desembarcado. Pois dali era possível ver como o dinheiro do governo americano alterava drasticamente aquele lugar.

A grande base de Parnamirim Field durante a Segunda Guerra Mundial.

Desde novembro de 1940 que o governo de Franklin Delano Roosevelt, utilizando a fachada de uma das empresas de aviação do país, estava construindo vários aeroportos em todo o Brasil, sendo o maior o de Parnamirim. Pelo mesmo motivo, estes eram empreendimentos destinados à aviação civil. Mas que sem muitas alterações poderia acomodar centenas de aeronaves militares e com diversas finalidades.

Diante daquela situação e da oportunidade, acredito que dificilmente Werra e os outros ocupantes deixaram de dar uma espiadinha no que estava acontecendo naquela grande obra e levar essa informação aos seus superiores em Roma e Berlim. E se assim fizeram, certamente visualizaram a partir do hangar da LATI e com a utilização de binóculos, pois as construções estavam a 1.700 metros de distância.

Aeronave da companhia aérea LATI – Este tipo de aeronave opera voos entre Roma e Rio de Janeiro – Fonte – http://www.spmodelismo.com.br/howto/ac/lati.php

No outro dia, por volta das cinco da manhã, o Savoia Marchetti SM.82 de prefixo I-BATO decolou de Natal.

O Fim da Sua Sorte.

A estrela da sorte brilhou mais uma vez para Franz von Werra.

A aeronave italiana cruzou o Atlântico Sul sem problemas. Na sequência aterrissou em Barcelona e Werra trocou de avião pela última vez. Na quinta-feira, 17 de abril de 1941, ele chegou a Roma, desembarcando no Aeroporto de Guidonia, pisando em solo do Eixo pela primeira vez em mais de meio ano.

Werra estava livre e sua fuga foi bem-sucedida. Ele voou para a Alemanha a bordo de um bimotor Junkers Ju 90 e finalmente chegou em Berlim, no Aeroporto de Tempelhof, onde sua noiva Elfi e os amigos lhe esperavam.

Haviam decorrido exatamente 32 semanas desde a derrubada do seu avião de caça e sob todos os aspectos, a sua audaciosa fuga foi realmente prodigiosa.

Foi algo que o levou desde os campos de prisioneiros da Inglaterra, através do Atlântico, até chegar ao Canadá. Depois atravessou o congelado Rio São Lourenço e entrou clandestinamente nos Estados Unidos. Mesmo em meio a muita divulgação, ele conseguiu burlar as autoridades daquele país e atravessou sua larga extensão até o México, circulando completamente incógnito. Finalmente chegou à América do Sul, passou sem problemas pelo Brasil e em poucos dias atravessou o Atlântico Sul até a Europa.

O agora capitão Franz von Werra.

Rapidamente Franz von Werra tornou-se um herói em toda a Alemanha.

Houve um encontro com Adolf Hitler, que lhe concedeu uma alta condecoração.

Já Joseph Goebbels, o Ministro da Propaganda do Reich alemão, celebrou freneticamente o jovem Werra, que adorava ser o centro das atenções. Foi Goebbels que afirmou que durante o curso de sua fuga, Werra escreveu regularmente cartões postais para a sua irmã e nunca se esqueceu de enviar postais para os oficiais ingleses que haviam lhe interrogado.

O intrépido aviador foi promovido a capitão e chegou a ser recebido pelo obeso Hermann Goering, o todo poderoso chefe da força aérea alemã. Nesse meio tempo von Werra se casou com a sua noiva, na melhor tradição da pompa nazista.

O antigo prisioneiro relatou ao comando alemão sobre seu tratamento como um prisioneiro de guerra e com base em sua própria experiência esses relatos ajudaram a melhorar as técnicas para os pilotos alemães capturados atrapalharem ao máximo os britânicos no momento dos interrogatórios. Inclusive consta que esses relatos ajudaram a melhorar o tratamento dos prisioneiros de guerra dos países aliados presos na Alemanha.

O agora capitão Franz von Werra retornou então à luta e foi inicialmente enviado para frente russa. Nesse front de guerra ele elevou até julho de 1941 o seu registro para 21 vitórias aéreas. Quando sua esquadrilha foi retirada da Rússia, ele passou a voar em patrulhas sobre o Mar do Norte.

Em 25 de outubro de 1941, apenas sete meses depois de seu retorno à Alemanha, Werra estava realizando um voo de rotina, em mais um patrulhamento solitário, quando a sua sorte acabou. Ele desapareceu sobre o Mar do Norte, nas proximidades da cidade holandesa de Vlissingen. Provavelmente foi uma falha no motor da aeronave que o levou ao desastre e seu corpo nunca foi encontrado. Ele viveu apenas 27 anos.

O ator alemão Hardy Krüger no papel do tenente Werra.

Em 1957 a história de Werra foi tema de um filme chamado The One That Got Away, estrelado pelo alemão Hardy Krüger no papel principal. Consta que a película produzida pelo cinema inglês conseguiu uma grande bilheteria na Europa, principalmente na Alemanha.

Atualmente o avião com o qual ele caiu na Inglaterra, está em exposição no Museu da Força Aérea Real em Folkestown, Kent, sul do país.

HISTÓRIA MILITAR DO RIO GRANDE DO NORTE – PARTE 1 – AS LUTAS

Felipe Nery de Brito Guerra – Publicado originalmente na Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte – IHGRN, 1927, Volumes XXIII e XXIV, páginas 218 a 228.

* Informação do Blog Tok de História – Busquei atualizar alguma coisa da ortografia do texto do Desembargador Felipe Guerra, escrito em agosto de 1920, sem, contudo, alterá-lo. Devido a sua extensão, foi necessário dividi-lo em duas partes, uma dedicada as lutas e outra aos combatentes potiguares, que será a nossa próxima publicação.

Escrever a história militar do Rio Grande do Norte desde o início de sua colonização, principiada em fins do século XVI seria, pelo menos até princípios do século XVIII, escrever a história do Rio Grande do Norte, porquanto esse espaço de tempo, abrangendo um período de cerca de dois séculos, foi preenchido por sangrentas agitações, lutas e guerras.

A dominação francesa, exercida então por piratas, aventureiros, desclassificados, sem outros ideais a não ser o lucro mercantil, sempre receosos e a espera de ataques dos portugueses. O que é certo, porém, é que essa permanência constante e demorada dos franceses, embora sem estabelecimento conhecido, representava um perigo para as vizinhas e próximas capitanias, principalmente a Paraíba, de onde haviam sido repelidos.

“O mal vem do Rio Grande”, dizia-se em Pernambuco e na Paraíba. E assim, para acabar com esse mal, foi resolvida a conquista do Rio Grande, da qual foi incumbido Manoel Mascarenhas Homem, tendo Jerônimo de Albuquerque alcançado melhor êxito na empresa.

Piratas franceses no Brasil – Fonte – httpswww.goianarte.com

Não tinham então os franceses regulares instalações. Viviam, entretanto, em estreitas relações com os selvagens, habitando mesmo suas aldeias. É o que se depreende da célebre “História do Brasil” de Frei Vicente do Salvador, escrita em 1627, e onde se lê que logo ao chegar Manoel Mascarenhas Homem “ali desembarcaram e se entrincheiraram de varas de mangue para começarem a fazer o forte e se defenderem dos Potiguaras que não tardaram muitos dias. Vieram uma madrugada, infinitos, acompanhados de cinquenta franceses, que haviam ficado das naus no porto dos Búzios e outros que ali estavam casados com Potiguaras”.

Manoel Mascarenhas Homem, que lutou no Rio Grande do Norte contra os franceses – Fonte – https://pt.wikipedia.org/wiki/Wikip%C3%A9dia

E assim ofereceriam os selvagens, auxiliados por seus aliados franceses, tenaz resistência. O que não impediu, entretanto, a fundação do “Forte dos Reys”, permitindo a criação da povoação do Natal dois anos depois — 25 de dezembro de 1599. Foi celebrada a paz com os Potiguaras, conseguida por Jerônimo de Albuquerque com a mediação de um selvagem “principal e feiticeiro”, chamado ILHA GRANDE.

A conquista do litoral brasileiro havia sido começada do norte para o sul, sendo depois continuada do sul para o norte, tendo, principalmente esta última, contado com eficaz cooperação dos naturais da terra, já representados por brancos, filhos de portugueses, por mestiços e pelos selvagens que, subjugados e pacificados pelos portugueses, eram aproveitados como seus aliados.

Os selvagens constituíam sempre o grosso das forças conquistadoras, embora não fossem, em regra, os elementos mais resistentes nos combates. Eram, entretanto, os mais resistentes às longas marchas, aos transportes e aos mais serviços exigidos em campanhas rudes e aventurosas, em que não podia se contar com auxílios minguadíssimos e retardados, senão impossíveis.

Forte dos Reis Magos, por Frans Post (1638)
– Fonte – http://noisnafolia.no.comunidades.net/pontos-turisticos

Os Potiguares, que dominavam o litoral do Rio Grande do Norte, uma vez pacificados, foram valiosos e fortes elementos para a conquista do norte. Não existindo mais o “mal vindo do Rio Grande», que passara para o Ceará e para o Maranhão, foi resolvida a conquista desses pontos, onde os franceses procuravam se firmar. Ainda foram os Potiguares elementos preponderantes para a conquista do primeiro daqueles territórios.

Expulsos os franceses do litoral, de Paraíba ao Maranhão, as novas populações que procuravam se estabelecer não ficaram na tranquilidade da paz. Nem todas as tribos haviam feito amizade com os colonizadores; e mesmo no meio daquelas tidas como amigas, surgiam ataques e desconfianças que traziam para a região um verdadeiro estado de guerra, rompendo a duvidosa paz, sempre de curta duração..

Veio depois a guerra holandesa. O Rio Grande do Norte foi duramente sacrificado na luta. Tomada a Fortaleza dos Reis Magos (12 de dezembro de 1533) por uma força holandesa guiada por Calabar, sofreu o Rio Grande do Norte com o invasor até o final da guerra holandesa no Brasil. Esteve assim esta terra dezenove anos sob o domínio batavo.

Florin holandês de ouro. Essa foi a primeira moeda a conter o nome Brasil e foi produzida pelos holandeses durante a ocupação de Recife – Fonte – https://en.wikipedia.org/wiki/Dutch_guilder

Calabar conseguira angariar para os holandeses a amizade dos Índios Janduís, que unidos aqueles praticaram horríveis massacres. Fácil é de imaginar o que seria a guerra movida por selvagens açulados por aventureiros da pior espécie, como parece que eram os holandeses enviados para o Rio Grande do Norte. Chegaram a negociar prisioneiros como animais para o corte, destinado a pasto dos antropófagos Janduís.

Finda a guerra holandesa pela expulsão dos invasores, continuou a luta no Rio Grande contra os Índios, sempre dispostos a defender sua vida selvagem e sem peias. Houve mesmo uma rebelião generalizada dos nativos que durou longos anos, nada respeitando, nem a vida nem os habitantes do Rio Grande, que já contava elementos de prosperidade. Foi calculado que os índios mataram “perto do trinta mil cabeças de gado grosso e mais de mil cavalgaduras”. Essa rebelião durou de 1688 a 1720, quer dizer, 32 anos, talvez mais, porquanto não se acha bem estudado esse ponto da história. Foi um movimento sério e perigoso. Pedidos insistentes de socorro partiram para Pernambuco, para a Bahia, e até diretamente seguiu um emissário para Lisboa, levando uma representação do Senado da Câmara ao Rei, tais as delongas do auxílio reclamado.

“Cena da Expedição do Tenente-Coronel Affonso Botelho”, aquarela do artista Joaquim José de Miranda (1771) que retrata o confronto entre indígenas e bandeirantes. Provavelmente cenas como essa ocorreram no Rio Grande do Norte – Fonte – https://www.historia.uff.br/impressoesrebeldes/revolta/guerras-barbaras/

Do litoral ao alto sertão era grande o perigo que ameaçava a própria Natal, sendo, o ponto culminante da rebelião a ribeira do Assú. Vieram em excursões guerreiras tropas da Paraíba, de Pernambuco e da Bahia. Vieram os ”terços paulistas” que haviam lutado em Palmares, vieram companhias do Batalhão de Henrique Dias. Essas forças, os melhores elementos de luta então disponíveis pelo Governo do Brasil, subiram até as cabeceiras do rio Assú, foram às ribeiras do Seridó, do Apodi até ao Jaguaribe, em perseguição dos índios que foram afinal pacificados, isto é, aniquilados, escorraçados, sendo tomada a providência de aldear os restantes. Ainda em tais aldeamentos apareciam insurreições dos índios motivadas por excessivos rigores e injustiças. Nenhuma condescendência havia para o infeliz selvagem, a quem de fato era negado qualquer direito.

Seguramente Miguel Joaquim de Almeida Castro, o Padre Miguelinho, foi o potiguar que mais expresivamente tomou parte na revolução de 1817 e acabou sendo fuzilado. Em junho de 1906, no 89º aniversário do fuzilamento, o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, promoveu uma série de homenagens em Natal . Houve uma sessão solene no então Teatro Carlos Gomes, atualmente Teatro Alberto Maranhão, na noite de 12 de junho de 1906, onde um coro feminino cantou o “Hino de Miguelinho”, letra de Henrique Castriciano e música de Luigi Maria Smido, cuja a capa da partitura apresentamos acima – Fonte – https://gamfrente.blogspot.com/2017/03/padre-miguelinho-luz-do-rio-grande-do.html

Na revolução de 1817, não é ignorado o papel que representou o Rio Grande do Norte. Pode-se dizer que essa página luminosa da história nacional se caracteriza no seu conjunto mais pela pureza de seus chefes, pelo estoico heroísmo dos que nela figuram, pela elevação dos ideais, pelo pendor doutrinário, do que por feitos militares e ação guerreira. E foi essa seguramente uma das causas que apressaram o fracasso da revolução.

Em agitações partidárias passou a Província as fases da Independência Nacional. Tomou parte na revolução da “República do Equador”.

Os corajosos e mal organizados destroços das forças revolucionárias de 1824 seguiram por terra, em dificultosa marcha por ínvios sertões de Pernambuco ao Ceará, procurando junção com as forças que nessa Província apoiavam o movimento revolucionário. Foi uma verdadeira retirada de cerca de três mil pessoas, conduzindo duas peças de artilharia, arrastadas por caminhos impraticáveis e arrostando todas as dificuldades que podem acompanhar forças sem disciplina, sem organização militar, sem recursos e sem alentadoras esperanças.

Quadro “Estudo para Frei Caneca”, de Antônio Parreiras (1918), mostrando o padre revolucionário em seu julgamento – Fonte – https://en.wikipedia.org/

Atravessaram o sertão do Rio Grande do Norte entrando pelo Seridó, seguindo para Pau dos Ferros pelos limites entre Rio Grande do Norte e a Paraíba. No Seridó, onde o presidente provisório da Paraíba deixou sua família, que com ele vinha acompanhando a expedição, da qual também fazia parte o nobre, elevado e culto espírito que era Frei Caneca, não foram hostilizadas as forças. Em Caicó, demoraram-se oito dias, concertando as carretas das peças que eram puxadas por bois. Em Patu de Fora, começou a expedição a sofrer hostilidades e também a hostilizar. Foram incendiadas algumas casas e fazendas.

Em Torrões (ou Torões), Patu, houve forte tiroteio, morrendo mais de trinta pessoas de parte a parte. Parece que batalhões irregulares de Portalegre organizaram guerrilhas, unindo-se depois com as forças legalistas do Rio do Peixe (PB).

Foto – Rostand Medeiros.

Serenada a luta pela submissão dos rebeldes, seguiram-se o martírio e as exageradas punições de infelizes chefes rebeldes, sonhadores antecipados dos ideais republicanos, vítimas da crueldade das juntas militares, tão tristemente célebres na história pátria.

Os habitantes do Rio Grande do Norte conservaram sempre prontos para qualquer emergência, chegando a formar batalhões de tropas irregulares, contra os reacionários de 1832, apoiando a política do então ministro da justiça e depois Regente do Império, padre Diogo Antônio Feijó.

Iniciada no Ceará em dezembro de 1831, com a proclamação de Joaquim Pinto Madeira, essa revolta obedecia aos ideais do Partido Restaurador, ou Caramuru, apoiado pelos portugueses. Formou-se no sertão do Rio Grande do Norte batalhões de tropas irregulares que marcharam para o Crato contra os revolucionários. De Martins e Portalegre seguiu um batalhão sob o comando do coronel Agostinho Pinto de Queirós. Conta-se que na primeira noite de marcha dois soldados de família do Martins, os irmãos Patrícios, tentaram voltar para casa, sendo por isso, ao amanhecer, sumariamente fuzilados. O comandante da tropa foi processado por esse fato e depois, por prescrição, isento da pena.

Pintura em azulejo de Armando Lopes Rafael (2010), representando Joaquim Pinto Madeira – Fonte – https://www.historia.uff.br/impressoesrebeldes/revista/a-guerra-dos-cacetes-bentos/

Sob o comando do coronel José Teixeira se organizou um batalhão no Seridó, do qual faziam parte os homens válidos das principais famílias. Incorporada à força combatente e reunida em Caicó, o padre Francisco de Britto Guerra, então vigário da cidade e representante da Província na Câmara Temporária, onde entrara como suplente, intimamente relacionado com o padre Feijó, e talvez o principal fator do movimento, promoveu uma grande solenidade cívico-religiosa por ocasião da partida da força. Seguiram todos montados para Pombal onde se uniram as forças da Paraíba, principiaram a receber instrução militar ministrada pelo alferes Canuto, de tropa de linha do Ceará.

Nas várzeas do Rio do Peixe (PB), houve o primeiro encontro entre esse batalhão do Seridó e as forças de Pinto Madeira, tendo estas atacado de surpresa, procurando tomar o valioso comboio dos víveres e munições dos seridoenses. O resultado foi as forças de Madeira retirando-se do combate com a perda de doze homens.

Manuel de Assis Mascarenhas, presidente da Província do Rio Grande do Norte ente 1838 a 1841, em cujo governo concedeu a patente de Coronel Comandante ao seridoense Joãop Gomes da Silva, pela sua capacidade de luta nos combates contra as forças de Pinto Madeira em 1831 – https://pt.wikipedia.org

O batalhão do Seridó continuou em marcha afim de reunir-se com as forças legalistas que no Ceará procuravam abafar a revolta, havendo pelo caminho alguns encontros. Terminada a luta, voltou a tropa ao Caicó, onde foi recebida com festas, aclamações, Te Deum na igreja, etc. Por ocasião dessas festas da chegada, foi aclamado pelos soldados o comandante das forças o quartel mestre João Gomes da Silva, que se havia distinguido na expedição, aclamação que anos depois no governo de Manoel de Assis Mascarenhas (1838 – 1841) foi confirmada com a patente de Coronel Comandante.

Muito é de notar que em todas essas lutas político-partidárias, os sertanejos do Rio Grande do Norte, serenados os ânimos, evitavam ódios inúteis, crueldades, perseguições e delações contra os vencidos.

A tradição narra mesmo o fato de haver Simão Gomes de Britto, capitão de milícias em Campo Grande, recebido ordem superior para prender o Coronel Cavalcante, implicado na revolução de 1817. Mas este apresentou a ordem de prisão ao seu amigo e pediu para que tomasse suas precauções. Acrescentou: — “Dê no que der, não o prenderei, porque sei que não cometeu crime”. E efetivamente não tentou fazer a prisão. Entretanto, o Coronel Cavalcante, ou porque se julgasse inocente, ou por altivez de caráter, ou ainda para evitar a responsabilidade do amigo, foi se entregar, e sofreu os rigores daqueles horríveis cárceres, onde foram martirizados os patriotas de 1817.

Óleo sobre tela de Eduardo de Martino, que retrata a troca de tiros que culminaram na primeira passagem de navios brasileiros por Passo de Tonelero em 1851, onde os argentinos construíram fortificações que bloqueavam a navegação no Rio Paraná. Domínio público, Revista de História da Biblioteca Nacional – Fonte – https://multirio.rio.rj.gov.br/index.php/historia-do-brasil/brasil-monarquico/8979-quest%C3%B5es-platinas-a%C3%A7%C3%B5es-militares-no-segundo-imp%C3%A9rio

Nas guerras contra as repúblicas do Rio da Prata numerosos filhos do Rio Grande do Norte acudiram em defesa da pátria.

Quatro meses depois de declarada a Guerra do Paraguai, embarcou em Macau um contingente de mais de sessenta voluntários, dos quais trinta e três eram do Assú, além de onze de Campo Grande, que haviam seguido diretamente para a Capital. É conhecido o fato de haver o Dr. Olinto José Meira de Vasconcelos, então Presidente da Província (1863 – 1866), dirigido a palavra na capital, a grupos que se achavam em manifestações em frente ao quartel, apelando para o patriotismo de todos e pedindo dar um passo à frente aqueles que quisessem seguir para a guerra. Mais de 400 voluntários moveram-se para a frente. De todos os pontos da Província seguiram Voluntários da Pátria, sendo também crescido o número de recrutados. E o papel que na guerra desempenharam os rio-grandenses-do-norte ajudou ao merecido renome adquirido pela infantaria do norte.

O brasileiro Symphonio dos Santos uniformizado para combater na Guerra do paraguai – Fonte – http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=92142

Na proclamação da República, na revolução federalista do sul, na revolta da armada, em Canudos, os filhos do Rio Grande do Norte cumpriram sempre seu dever.

Sob as ordens de Plácido de Castro, nas lutas acreanas, encontraram-se também inúmeros rio-grandenses-do-norte, destemidos e audazes pioneiros da colonização e conquista das mais recuadas fronteiras da Pátria, os quais tangidos do torrão natal por atormentadoras secas, forneceram, com seus irmãos de outros Estados, por igual vítimas da calamidade, os elementos vitais, talvez os únicos possíveis para o colossal empreendimento da colonização da Amazônia.

De fato, outras populações vivendo certamente sob um clima mais doce e uma natureza mais amena, não estariam, como os nossos sertanejos, tão habituados a receber e aguentar o choque e a destruição das mortíferas forças da natureza amazônica, com a mesma resignação, com o mesmo esforço e coragem com que encaram e recebem as furiosas cargas das nossas devastadoras secas.

Na execução da recente lei do serviço militar (1916) raro é o sorteado dessa terra que deixa de acudir ao chamado: talvez nenhum listado da União apresente menor número de insubmissos.

Eis aqui, a largos traços, a vida militar do Rio Grande do Norte: lutas constantes durante dois séculos, sempre aceso o sentimento de patriotismo, de abnegação, de sofrimento. E por isso mesmo, apesar de uma bissecular educação guerreira, os filhos do Rio Grande do Norte têm acentuadamente o caráter pacífico: o banditismo, o caudilhismo, e as lutas por fanatismo nunca encontraram apoio entre eles.

Para conhecerem a biografia de Felipe Guerra é só acessar esse link – https://fatosdefelipeguerra.blogspot.com/2019/10/felipe-guerra_31.html 

OS VELHOS CAMINHOS DO RIO GRANDE DO NORTE

Luís da Câmara Cascudo – Publicado originalmente no livro HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE, Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa Nacional, 1955. 1ª EDIÇÃO, Capítulo XIII, páginas 307 a 312.

A primeira estrada conhecida no Rio Grande do Norte e, durante séculos, a mais trilhada, foi pelo litoral, beirando quase o mar, rumo da Paraíba. Os colonizadores vieram pelo Atlântico, mas a parte da tropa que devia vir por via terrestre recuou na baía da Traição ante a peste de bexigas. Mascarenhas Homem, fundador do Forte dos Reis Magos, regressou por terra. Esse primeiro caminho teve, no correr da guerra contra os indígenas no final do século XVII, uma série de casas fortes, protegendo o trânsito que seria relativamente vultoso. Vinha-se pela baía da Traição ou Mamanguape, Tamatanduba, Cunhaú, Goianinha, Guaraíras (Arês), Mipibu, Potengi, Utinga, ou seguindo o vale do Cajupiranga, diretamente a Natal. A jornada para o interior ia até o vale do Ceará Mirim, limite do conhecimento geográfico, útil até mesmo depois da expulsão do holandês em 1654.

Fortaleza dos Reis Magos no período colonial

Quando o mestre de campo Luís Barbalho Bezerra realizou a famosa contramarcha de fevereiro-maio de 1640, calcou a estrada já histórica. O genealogista Pedro Taques diz ter sido o desembarque a 7 de fevereiro no porto de Aguaçu, topônimo desaparecido, junto ou nos arredores da atual cidade de Touros. Em nomeações reais encontro baixios de São Roque. O caso é que Barbalho Bezerra veio até o Potengi, quase vendo Natal ou vendo, onde se bateu, derrotou e aprisionou Joris Gartsman, capitão flamengo do Reis Magos, e o conduziu para a cidade do Salvador. De Cunhaú é que o mestre-de-campo escreveu ao conde de Nassau pedindo passagem. Encontramos sua espada vencendo Alexandre Picard em Goiana. Era a trilha secular para ó sul, Natal, vale do Cajupiranga, vale do Capió, Cunhaú, rio Guaju para a Paraíba e daí para Pernambuco, por Mamanguape e Goiana como ainda nos nossos dias é a maior rodovia interestadual.

Riacho seco no Vale do Cafundó, zona rural da cidade pernambucana de Flores, Região do Pajeú. No passado essas eram as primeiras estradas da ocupação do interior do Nordeste. – Foto de Alex Gomes.

A repressão oficial à revolta da indiaria provocou o alargamento das fronteiras corográficas. Antônio de Albuquerque Câmara bate-se em 1688 nas cabeceiras do rio Açu e entre as serras do João do Vale e Santana do Matos. A revolta abrangia as ribeiras do Açu e Jaguaribe. A zona teve de ser batida e trespassada pelas colunas militares. Nesse 1688 os paulistas vieram ajudar a corrigir a indiada e se encontraram, vindos da Paraíba, com Albuquerque Câmara que se batia no baixo Açu. Domingos Jorge Velho viera de seus currais do São Francisco, por terra e mergulhara pelo boqueirão de Parelhas, no chamado “Sertão de Acauã”, que enrolava serras e capoeirões desde os atuais Jardim do Seridó até Currais Novos. Toda essa região, Focinho dos Picos, Picuí, Caiçara e Bico da Arara, até roçar o rio Acauã, era terra do gentio da nação Canindé e Janduí (Cariri) que se alargava por Quacari, Quimbico, Quintururé, Umvibico, Amoré, Onaxi, Acinum, Quindê, Arari, Jucurutu até a misteriosa serra, do Araridu ou Papuiré até Ticoiji e Tipuí, julgadamente a serra do Coité no território paraibano. São topônimos ·cariris que orlam a peregrinação dos aldeamentos e ficaram como testemunhando a passagem dos Janduí e Canindé antes do desaparecimento. Esse povo dos Canindé foi derrotado em 1690 por Afonso d’Albuquerque Maranhão, da casa de Cunhaú, neto de Jerônimo, 1.º capitão-mor do Rio Grande. O tuxaúa Canindé, soberano do sertão da Acauã, foi batizado e tomou o nome de João Fernandes Vieira. Dois anos depois o Senado da Câmara de Natal pedia a criação de arraiais, povoados com defensão militar nos quatro pontos extremos da região pacificada: Jaguaribe, Açu, Acauã e Curimataú. As estradas ligavam entre si esses lugares e se articulavam nas duas vias-tronco para o sul, o caminho do litoral, já mencionado, e a estrada por onde nasceria a estrada das boiadas. Em 1697 os indígenas Paiacu e Caratéu, da nação cearense dos Icó que viviam desde o Catolé do Rocha até as margens do rio Piranhas, na Paraíba, fixaram-se entre as ribeiras do Apodi e Jaguaribe, formando um liame de ativa comunicação pela chapada.

Ilustração de Jean Baptiste Debret

Por onde, durante as guerras contra o cariri, entraram os Terços Paulistas, as tropas de auxílio, vindas para conter os Janduí, Icó, Paiacu, Pega e Panati insubmissos?

Desceram da Paraíba, vindos por Soledade-Picuí ou Piranhas, depois Pombal, Brejo do Cruz e Catolé do Rocha, varando a fronteira depois da reentrância paraibana, ou vinham pela mesopotâmia do Panema-Açu? As tropas que voaram em socorro de Albuquerque Câmara tomaram o primeiro caminho e as do sertanista Domingos Jorge Velho creio que escolheram o segundo, ainda hoje piso batido e tradicional.

Passada a guerra ficou a lembrança da terra pisada para baixo e para cima. Do Açu sobe-se pelo rio Paraú até o fim e apanha-se a estrada paraibana depois de Belém. Lembremo-nos que a Paraíba não tinha gado e sim açúcar. O Rio Grande do Norte possuía tanto gado que podia suprir a Paraíba, Itamaracá e Recife. Os currais paraibanos são posteriores ao domínio holandês na vigência do qual o Rio Grande exportava, de graça e a força, milhares de cabeças. Irineu Joffily (Notas sôbre a Paraíba, 124) diz que as “fazendas apareceram normalmente quando os exploradores galgaram o planalto da Borborema e os paulistas penetraram no Piancó. Depois de 1690 é que temos indícios das atividades bandeirantes dos Oliveira Lêdo no Piancó e Piranhas. Os núcleos iniciais foram o Boqueirão a leste e Piranhas a oeste até que Oliveira Lêdo reuniu e sistematizou o esquema do povoamento pela fixação das tribos disseminadas.

Estrada de rodagem do Seridó, início da década de 1920

Durante muitos anos os pontos povoados do sertão paraibano não tiveram intercomunicação. Piancó conhecia a ligação com a Bahia, e Boqueirão, nos Cariris Velhos, com Pernambuco. Entre nós, já no século XIX, sucedia o mesmo. Mossoró ia para o Aracati e Caicó para Campina Grande. O sertão escapou secularmente à capital que vegetava, humilde e minúscula, junto ao Potengi. As ligações orientavam-se para Pernambuco e Paraíba, para as grandes feiras de gado, Igaraçu, Goiana, També (Pedra de Fogo), Itabaiana e depois Campina Grande. Daí a rede de estradas e variantes que sempre aglutinaram esses lugares e os articulavam às regiões do Seridó e sertão de Piranhas, ribeira da Panema, enquanto a zona do Mossoró se escoava para o Ceará pelo chapadão do Apodi. Com o desenvolvimento do Aracati passou este a dirigir Mossoró e Mossoró ao seu sertão na linde do Oeste.

Do Mossoró, a velha estrada ia a São Sebastião (Governador Dix-Sept Rosado), como presentemente a estrada de ferro, Jurumenha, perto de Caraúbas, Atoleiros, Piranhas, Mombaça, Boa Esperança (Demétrio Lemos, atual Antônio Martins) nos batentes da serra do Martins, Carnaúba, Barriguda (Alexandria), Tabuleiro Formoso onde se bipartia. Um ramal ia para o Catolé do Rocha e outro à cidade de Sousa, tocando em Santa Rosa. Em Sousa entroncava-se com a estrada-das-boiadas que era uma reminiscência das estradas de penetração povoadora. Daí a importância de Sousa, Cajazeiras e Pombal na formação comercial de uma zona do Rio Grande do Norte. Para lá, como depois para o Caicó, envia-se o menino aos estudos do latim e o passador-de-gado, afoito e lendário.

Antiga estação ferroviária de Demétrio Lemos, atual Antônio Masrtins – Foto – Rostand Medeiros

Sousa centralizava muito e uma sua estrada vinha morrer na antiga rota dos conquistadores de Natal. Partia de Sousa e atravessava sucessivamente Catolé, Belém, Amazonas, São Miguel (já em nossa província), Serra de Santana por Flores (hoje Florânia). Santa Cruz, centro de irradiação do Seridó depois de passar a serra do Doutor nas vizinhanças de Currais Novos, daí para Nova Cruz por Campestre (São José do Campestre) onde se via o caminho que levava à Paraíba ou Pernambuco por Mamanguape. Quando se criou o correio, Mamanguape era o ponto de intersecção entre Paraíba e Rio Grande do Norte. Aí o estafeta recebia a correspondência para Pernambuco e distribuía a carga entre as duas coterminas. A posição de Mamanguape explica a predileção dos grandes latifundiários por suas terras. Os Albuquerques Maranhões, da casa de Cunhaú, possuíam vários sítios e engenhos em Mamanguape.

Vaqueiros potiguares – Foto – Rostand Medeiros

A estrada-das-boiadas na Paraíba era muito mais seguida pelos vaqueiros norte-rio-grandenses que qualquer outra nossa. Ia-se por ela para o Piauí e o Piauí, de fins do século XVIII em diante, muito valia à nossa vida de pastorícia. Irineu Joffily reconstruiu-a e posso completá-la.

Do oeste do Espinharas, ribeira de Santa Rosa, Milagres, tocando depois na lagoa do Batalhão (Taperoá), seguia-se o rio, descendo a Borborema até Piranharas e daí a Patos, Piranhas (Pombal), Sousa, São João do Rio do Peixe (Um ramal recebia a contribuição de Cajazeiras) ia-se ao Ceará pelos Cariris Novos, Icó, Tauá, atingindo-se Crateús, inesquecível pelo encontro de centenas de vaqueiros que demandavam o Piauí. Outros preferiam acompanhar a vaqueirama divertida e pousar ali mesmo, mas eram em parte menor. A maioria furava, do Tauá, diretamente para o Piauí. De Crateús comprava-se a gadaria em Santo Antônio do Surubim de Campo Maior, núcleo influenciador de cantigas sobre o ciclo do gado, Valença, Oeiras, que fora capital até 1852, Jatobá (São João do Piauí) e Picos, fornecedor dos primeiros cavalos pampas, ornamentais e vistosos, orgulho do patriarcado rural no Rio Grande do Norte. uns vaqueiros arrastavam a jornada até São Gonçalo de Amarante e outros a Jerumenha. As maiores feiras eram nas localidades citadas.

Foto – Rostand Medeiros

Os norte-rio-grandenses do oeste iam via Ceará. De Tauá para Crateús e daí seguiam galgando a Ibiapaba para Campo Maior, ·banhado pelo rio Surubim ou, dos cearenses Arneiros e Cococi, alcançavam Valença no Piauí ou em diagonal para Picos.

Essa toponímia ficou registrada na cantiga velha. Desaparecida quase a estrada das boiadas, rara a viagem do vaqueiro, a poesia tradicional guardou os nomes dos lugares de outrora. Essa toada, verdadeira canção de marcha dos vaqueiros, recorda o percurso (!) de Campo Grande (Augusto Severo) no Rio Grande do· Norte até o ·Piauí, envolvendo dois perfis femininos, cuidados amorosos do vaqueiro cantador.

Como Xiquinha não tem

Como Totonha não há;

Xiquinha de Campo Grande

Totonha do Lagamá !

Xiquinha vale dez fio (filhos)

Totonha vale dez vó. . . (avós)

Xiquinha do COCOCl

Totonha do Arneiró …

Xiquinha prá querer bem

Totonha prá carinhá;

Xiquinha é de Crateús

Totonha é lá do Tauá

Xiquinha vale uma vila,

Totonha vale ela só;

Xiquinha nasceu nos Pico (Picos)

Totonha em Campo Maió …

Um ramal da estrada das boiadas ficou popularíssimo na “cantoria”. É o do Piancó, Misericórdia, Milagres (Ceará), Missão Velha, Crato, nos Cariris Novos. Do Mossoró viajava-se outrora, como atualmente, pelo araxá do Apodi (Pedra de Abelha, atual Felipe Guerra). Outras estradas partindo de Mossoró, iam rio acima até as cabeceiras do Apodi, Portalegre, Pau dos. Ferros, São Miguel e Luís Gomes. Uma variante de Pau dos Ferros, velhíssimo rancho de comboieiros e tangedores de gado, chega a Alexandria, antiga Barriguda e seguia para Tabuleiro Formoso, pegando o caminho paraibano. De Pau dos Perros a vizinhança cearense animava as visitas por Pereiro. Do Patu ia-se para Catolé do Rocha. Do Açu caminhava-se para Campo Grande (Triunfo, Augusto Severo), Martins, no pé da serra, onde se continuava em um dos ramos para a estrada das boiadas pela Ribeira do Rio do Peixe.

Foto – Rostand Medeiros

O inverno era mais cedo. Dizia tão certo como chuva em janeiro. No Piauí as águas vinham em novembro. Iam vaqueiros de toda parte comprar bois de carro e de corte e novilhos para reprodução e engorda. Voltava-se em fins de dezembro ou começos de janeiro, tocando, para aproveitar as babugens verdes e ralas que as chuvas faziam nascer.

As datas quase infalíveis criavam ponto de reunião para que a jornada fosse menos enfadonha e monótona. Especialmente ficavam juntos no regresso para o auxílio mútuo nas travessias sem água ou passagens difíceis nos rios e riachos, estouro de boiada e moléstias súbitas na gadaria. Essas estradas todas, como vimos, em pleno sertão, determinaram a necessidade das vendas, feiras rápidas de suprimento ligeiro e descanso ao longo da rota. Fizeram casas. As fazendas se aproximaram. Ergueram a capela. Foi vila e muitas são sedes municipais.

Para o sul do Rio Grande do Norte a viagem continuava margeando. As praias, caminho feito por Nosso Senhor. Assim voltou, agonizante, Pêro Coelho de Sousa, em 1605, passando Amargosa e Guamaré na costa de Macau.

Capela de Nossa Senhora das Candeias, no Engenho Cunhaú, município de Canguaretama, no litoral sul potiguar, onde aconteceu o Massacre de Cunhaú em 16 de julho de 1645 – Foto – https://joaobosco.wordpress.com/2007/09/22/onde-esta-a-verdade-sobre-o-masacre-de-cunhau/

Em 1810 Henry Koster fez sua excursão ao Ceará partindo do Recife, por Goiana, Espírito Santo, Mamanguape (Paraíba), Cunhaú (Rio Grande do Norte), Papari (Nísia Floresta), São José de Mipibu, Natal, Açu, Santa Luzia (Mossoró), praia do Tibau, Aracati (Ceará) e Fortaleza.

Quando o bispo de Pernambuco, Dom João da Purificação Marques Perdigão, visitou o Rio Grande do Norte em 1839, vinha do Ceará. Penetrou pelo Apodi, descansando em “Sabe Muito”, nos arredores da cidade de Caraúbas, dormindo no então povoado; almoçou em Coroas, perto da vila de Campo Grande (Augusto Severo), alcançando o Açu. Atravessou Santa Quitéria, depois Patachoca (Pataxó), vila dos Angicos e pelo seu Itinerário sabemos que o prelado veio por São Romão (Fernando Pedrosa), Santa Cruz, ambas estações da Estrada de Ferro Sampaio Correia, Riacho Fechado, Várzea dos Bois, Umari, Boa Água, Ladeira Grande, Taipu do Meio (sede municipal), Capela, no vale do Ceará-Mirim e Extremoz. É a travessia do poente ao nascente, oeste-leste. De Natal, Dom João partiu para a Paraíba repetindo quase o trajeto de Mascarenhas Homem no percurso de regresso em 1598. Natal, São Gonçalo, São José de Mipibu, Papari, Arez, Goianinha, Vila Flor, Tamanduba, Comatanduba (Paraíba), Mamanguape. É a descida norte-sul.

Pelos caminhos do sertão potiguar – Foto – Rostand Medeiros.

No interior as primitivas e grandes vias de povoamento e penetração foram as margens dos álveos dos rios Piranhas e Apodi-Mossoró. A oeste a chapada do Apodi com o rush cearense. A linha Natal-Macau estirão solitário de areias inúteis, com água rara, esteve despovoado, afora os breves oásis de coqueirais plantados na segunda metade do século XVIII em diante e que abrigaram povoações de pescadores, Genipabu (estrema do mapa de Marcgrav). Pitangui, Jacumã, Muriú, Maxaranguape, Caraúbas, Maracajaú, Touros, Olhos d’Agua, Santo Cristo, Reduto, Caiçara, Galinhos; Diogo Lopes, etc.

GUERRA EM NOME DE DEUS – A PRIMEIRA CRUZADA E O CERCO A JERUSALÉM

Rostand Medeiros – https://pt.wikipedia.org/wiki/Rostand_Medeiros

No século XI, a Europa foi profundamente penetrada pelo Cristianismo que desempenhava um papel central na vida das pessoas, influenciando as suas crenças, valores e cultura. O papado, particularmente sob o Papa Urbano II, consolidou a sua autoridade e procurou expandir a sua influência.

Já a Terra Santa, incluindo a cidade sagrada de Jerusalém, era um importante local de peregrinação para os cristãos. No entanto esses peregrinos enfrentaram muitos obstáculos e violência crescente por parte dos governadores muçulmanos da região. As histórias dos seus sofrimentos desencadearam um profundo sentimento de injustiça entre os cristãos na Europa.

De uma perspectiva cristã, as Cruzadas começaram em 1095, com um discurso apaixonado proferido pelo Papa Urbano II no Concílio de Clermont, apelando para o desenvolvimento de uma cruzada para salvar os cristãos do Oriente e libertar a Terra Santa das mãos dos muçulmanos. Este apelo teve um enorme impacto e mobilizou um grande número de crentes para apoiar a luta. Não demorou e senhores, cavaleiros e camponeses de toda a Europa começaram a responder ao apelo à cruzada.

E para aumentar o contingente de participantes, Urbano II ofereceu aos que seguissem na empreitada o perdão de todos os seus pecados. Uma promessa que, em uma época de ignorância e iniquidade, foi amplamente vista como uma oportunidade de salvação espiritual. Em meio a um enorme desconhecimento geral, a ideia de que o “fim do mundo” estava próximo também era um tema recorrente nessa época e alimentou o fervor religioso dos participantes. Os crentes também acreditavam que a libertação da Terra Santa poderia ser um prenúncio da segunda vinda de Cristo.

A Primeira Cruzada foi um empreendimento extraordinário, marcado por uma viagem perigosa por terras hostis e batalhas épicas. Com a sua complexa mistura de motivações religiosas, políticas e sociais, marcaria o início de uma série de eventos que mudariam para sempre a face do Oriente Médio e da Europa medieval.

Bárbaros e Vivendo em Chiqueiros

É claro que os muçulmanos nada sabiam sobre tal discurso. Também não havia uma palavra específica para definirem as “cruzadas”. Do ponto de vista deles, a agressão dos povos vindos do norte contra as terras muçulmanas começou muito antes, nomeadamente em 1061, quando um governante normando chamado Robert Guiscard começou a atacar a Sicília islâmica. O mais chocante para os islamitas foi que ele teve sucesso na sua empreitada, pois a ideia existente sobre os europeus era a pior possível.

Para os seguidores de Maomé o mundo que eles conheciam estava literalmente de “cabeça para baixo”. Em seus mapas o sul ficava no topo e o norte embaixo. Isto porque, segundo os maiores e mais respeitados cartógrafos muçulmanos, não havia nada de interessante mais ao norte. Ali ficavam os países dos cristãos, todos chamados de “francos” pelos islâmicos.

Esses países do norte eram conhecidos por serem úmidos e escuros, com uma cultura terrivelmente atrasada, onde todos, incluindo os reis, obedeciam a um senhor ditatorial chamado “il-baba”: o Papa. E para piorar a visão mulçumana, os viajantes que lá estiveram relataram que esses francos “só se lavavam duas vezes por ano”.

Então eles eram sujos e estúpidos, pensavam os mulçumanos, e não era de admirar que os francos fossem propensos ao fanatismo religioso. Para o mundo islâmico a religião cristã parecia mais ridícula do que perigosa, sendo considerada intelectualmente pobre e onde dificilmente eles poderiam utilizar das escrituras cristãs quaisquer de suas regras para a vida quotidiana.

Os muçulmanos da Idade Média viviam, é claro, no melhor de todos os climas – onde as temperaturas eram moderadas e propício ao surgimento de uma civilização urbana e rica. Os francos, por outro lado, viviam lá no norte, numa área onde o sol pouco brilhava e o clima os condenou a permanecerem bárbaros e vivendo em chiqueiros.

Os francos pomposamente chamavam a concentração de algumas dezenas de milhares de pessoas de “cidades”, enquanto os muçulmanos viviam juntos há muito tempo em centros urbanos de centenas de milhares, com modernas infraestruturas e todos lavavam-se regularmente. Para os mulçumanos eles viviam no “Dar al-Islam”, ou seja, “o território islâmico”, o lar de uma civilização dinâmica, sustentada por uma população diversificada e uma economia robusta.

Em outras palavras, segundo Paul M. Cobb, historiador da Universidade da Pensilvânia especializado na história do mundo islâmico na Idade Média, “há mil anos no Cairo, Bagdá, ou em Córdoba, a visão da região onde viviam os francos era de uma área desagradável, cheia de lunáticos fedorentos e sobre a qual pouco se sabia”.

E esse desconhecimento faria com que os seguidores de Maomé pagassem um alto preço em sangue. Da pior maneira eles descobriram que esses francos, mesmo vivendo seu dia a dia com todos os defeitos possíveis e imagináveis, possuíam uma coragem desmedida, que os ajudavam a sobreviver em meio a uma natureza cruel e uma existência onde a belicosidade era algo permanente. Para tanto faziam uso de armas poderosas e bastante modernas para a época, além de táticas de combate desconhecidas no Islã.

A Conquista Sangrenta da Cidade Santa

Os cavaleiros e peregrinos cristãos partiram em 1096, onde as primeiras etapas da cruzada levaram-nos pela Europa Oriental. No caminho enfrentaram obstáculos como as montanhas dos Balcãs e rios caudalosos. Em Constantinopla foram recebidos pelo imperador bizantino Aleixo I Comneno.

Até chegar a Cidade Santa os cruzados realizaram numerosos cercos a fortalezas muçulmanas e participaram de batalhas ferozes. Um dos momentos mais famosos foi o Cerco de Antióquia, que começou em outubro de 1097, onde os Cruzados suportaram enorme sofrimento antes de finalmente tomarem essa cidade em junho do ano seguinte.

Demoraria mais um ano para finalmente, no início de junho de 1099, os cruzados chegarem ao seu destino final: Jerusalém. 

O problema foi que na chegada os suprimentos se tornaram escassos, o clima estava bem opressivo e os primeiros ataques falharam porque a cidade estava muito bem fortificada. Também se soube que um exército de socorro vindo do Egito estava a caminho. Para completar o quadro os defensores encheram de areia todos os poços de água que existiam em frente à cidade, mandaram cortar todas as árvores para dificultar o cerco e a água que os cruzados conseguiram de uma fonte distante era de má qualidade.

Liderados pelos franceses Godfrey de Bouillon e Raymond de Toulouse, eles partiram para um esforço final. Os cruzados – cerca de 1.300 cavaleiros e 12.000 homens de infantaria, bem como numerosos peregrinos – perceberam que as muralhas da cidade não poderiam ser superadas sem máquinas de cerco. Mesmo assim os líderes do exército cruzado decidiram atacar a cidade em 13 de junho de 1099. Apesar da tenacidade dos francos e da captura temporária das fortificações do norte, o ataque falhou.

Depois de alguma busca, conseguiu-se madeira na distante Samaria, que foi trazida para construir torres de cerco, aríetes e catapultas. Depois de um cortejo ao redor da cidade para mostrar aos inimigos o seu poderio, o assalto dos cruzados foi organizado para ocorrer na noite de 14 de julho e assim ocorreu. A luta nas muralhas foi feroz e sangrenta e não demorou para uma torre superar os fossos exteriores. Ao meio-dia de 15 de julho, os cristãos tomaram um trecho da muralha norte e pouco depois a Cúpula da Rocha caiu.

A captura de Jerusalém foi um momento de triunfo para os Cruzados, mas também um momento de grande tristeza para os moradores da cidade. O medievalista britânico Steven Runciman escreveu que os francos, completamente alucinados depois de tanto sofrimento e privação, correram pelas ruas, casas e mesquitas como que possuídos por demônios. Ele se baseia em relatos de testemunhas oculares como este: “– Eles mataram todos os inimigos que puderam encontrar com o fio de suas espadas, independentemente de idade ou posição. E havia tantas pessoas mortas e tantas pilhas de cabeças decepadas espalhadas por toda parte, que por todos os caminhos ou passagens só se encontravam cadáveres”.

Conquista de Jerusalém pelos Cruzados, por Émile Signol, no Palácio de Versalhes, Paris, França.

Cronistas cristãos e muçulmanos relatam que no massacre cruel da conquista de Jerusalém, além da população muçulmana e judaica que viviam na cidade, também foram vítimas os cristãos coptas e sírios. Segundo fontes muçulmanas, cerca de 70 mil muçulmanos, judeus e cristãos orientais foram mortos no banho de sangue. Os cronistas cruzados afirmaram que foram 10.000 vítimas. O historiador britânico Thomas S. Asbridge segue uma fonte judaica que fala de 3.000 mortes.

Os elevados números de testemunhos muçulmanos refletem, por um lado, o choque face ao sucesso inesperado da invasão estúpida e suja e por outro um alerta e incentivo para que no futuro eles não perdessem de vista a reconquista da cidade. A disputa sobre números, resume Asbridge, “– Não muda a matança sádica levada a cabo pelos Cruzados”.

Mesmo com as vestes, as mãos e as armas salpicadas de sangue, um serviço religioso de ação de graças foi organizado pelos vencedores na Igreja do Santo Sepulcro.

Depois que Raimund rejeitou a ideia de se tornar regente de Jerusalém, Gottfried assumiu o governo da Terra Santa como advocatus sancti sepulchri (“Protetor do Santo Sepulcro”) e regente do recém-estabelecido Reino de Jerusalém. Sob sua liderança, o exército do Califrado Fatímida foi derrotado na Batalha de Ascalão, em 12 de agosto de 1099. Isso encerrou a Primeira Cruzada.

Senhores de Jerusalém

Quando os autores islâmicos medievais pensavam em tais ataques observavam que os francos, mesmo sendo bárbaros e impuros, foram capazes de alcançar tais sucessos por conta da desunião interna dos próprios mulçumanos.

Na verdade, os residentes de “Dar al-Islam” não se davam muito bem. Na melhor das hipóteses, mulçumanos sunitas e xiitas viviam juntos numa espécie de guerra fria. Já os governantes Fatímidas no Egito e os seguidores do califa em Bagdá eram inimigos um do outro.

Para os estudiosos mulçumanos essa desunião fez com que os cruzados conseguissem conquistar quatro pequenos estados: o Reino de Jerusalém, o Condado de Edessa, os Principados de Antióquia e Trípoli. A unidade muçulmana chegou tarde demais!

Mas estados cruzados não eram cercados por muros e as relações entre os invasores vindos da Europa e os povos civilizados do Oriente não eram totalmente hostis. Houve fortes negociações nos mercados de Jerusalém e Acre. Os mercadores cristãos estavam interessados ​​nos seguintes produtos: pimenta, gengibre, açúcar do Vale do Rio Jordão, têxteis, marfim, ouro e porcelana. Os mercadores muçulmanos queriam em troca tecidos de lã, grãos, prata, madeira, ferro e escravos. Foi assim que o cheque (de sakh, carta de crédito) migrou para as línguas europeias. Da mesma forma a tarifa (de ta’arif, notificação). Já os muçulmanos passaram a saber o que era um “sarjand” (um sargento) e quem era o “al-ray-dafrans” (que significa “le roi de France”).

Os francos permaneceram senhores de Jerusalém por 88 anos (1099-1187).

Uma Cidade, Muitos Conquistadores

Para o mercenário sírio Usama ibn Munqidh, os francos eram a prova viva de que os caminhos de Alá eram insondáveis – afinal, apesar da sua bestialidade, conseguiram alcançar vitórias brilhantes. Ele relatou que com o passar do tempo alguns europeus se aclimataram, ou seja, civilizaram-se, e procuraram a companhia dos muçulmanos. “São muito melhores do que aqueles que chegaram recentemente dos seus países, mas são uma exceção e não devem ser considerados representativos.”

Osama não conseguia encontrar muitas virtudes nos francos, além da coragem – que ele suspeitava provir de sua estupidez. Um dia alguns cruzados tentaram atacá-lo enquanto ele orava em direção a Meca. Esses idiotas nunca tinham visto nada assim! Felizmente, seus camaradas os impediram. Mas apesar do seu desdém fundamental, Osama encontrou alguns amigos entre os francos. Um deles, um Cavaleiro Templário, chegou a chamá-lo de “seu irmão” e se ofereceu para levar seu filho para a Europa “onde ele poderia aprender a razão e o cavalheirismo com os cavaleiros”, algo que, infelizmente, não aconteceu. Pois nos privou nos dias de hoje da leitura de um emocionante relatório de viagem e poderíamos saber que efeito teria a Europa medieval sobre um muçulmano instruído!

Mas voltando ao período das cruzadas – No final foi Nácer Saladim Iúçufe ibne Aiube, mais conhecido como Saladino, um chefe militar curdo muçulmano que se tornou sultão do Egito e da Síria, que liderou com eficácia a oposição islâmica aos cruzados europeus no Oriente Médio.

Paul M. Cobb chama Saladino de favorito de “historiadores, ditadores e outros criadores de mitos”. Isto é absolutamente verdade – para a retrospecção islâmica, Saladino aparece como o libertador do Oriente Médio.

A verdade é que quando ele entrou vitoriosamente em Jerusalém em 2 de outubro de 1187 – uma sexta-feira – e limpou a mesquita de Al-Aqsa e a Cúpula da Rocha dos símbolos cristãos, ele já havia travado uma guerra contra os inimigos islâmicos durante 33 meses (especialmente os Fatímidas no Egito, a quem ele destronou e substituiu pelo seu próprio clã). A luta contra os “francos impuros” foi na verdade apenas um pós-escrito, uma reflexão tardia.

Também é verdade que Saladino, como vencedor, era capaz de magnanimidades. Ele deixou a Igreja do Santo Sepulcro, que segundo a crença cristã era o local onde Jesus foi sepultado, de pé, embora houvesse vozes instando-o a destruir este eterno objeto de discórdia.

Se Saladino foi quem recapturou Jerusalém para o mundo islâmico em 1187, ela foi novamente perdida para os cristãos 42 anos depois, na Sexta Cruzada, no ano de 1229 e quem recebeu a cidade nas suas mãos foi Frederico II da Alemanha. Dez anos depois os cristãos perderam Jerusalém mais uma vez. Quem a conquistou foi an-Nasir Da’ud, o emir de Kerak (hoje uma cidade na Jordânia). Quatro anos depois, em 1243, a cidade sagrada voltou novamente ao poder dos cristãos, mas por um período muito breve. No ano seguinte o Império Khwarezmiano, grupo muçulmano sunita de origem mameluca turca, tomou novamente a cidade para os seguidores de Maomé.

Jerusalém então permaneceu islâmica por longos 673 anos, até o dia 11 de dezembro de 1917, quando o general britânico Edmund Henry Hynman Allenby, 1º Visconde Allenby, entrou a pé com suas tropas na Cidade Santa. Isso ocorreu após os britânicos vencerem os turcos otomanos na Campanha da Palestina, durante a Primeira Guerra Mundial.

30 anos depois, em 29 de novembro de 1947, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou um plano que dividia a Palestina em dois estados: um judeu e um árabe. Cada estado seria composto por três grandes secções, ligadas por encruzilhadas extraterritoriais, mais um enclave árabe em Jaffa. A Jerusalém expandida cairia sob controle internacional como um Corpus Separatum.

Mas após a Guerra Árabe-Israelense de 1948, Jerusalém foi dividida. A metade ocidental da Cidade Nova tornou-se parte do recém-formado estado de Israel, enquanto a metade oriental, juntamente com a Cidade Velha, foi ocupada por tropas da Jordânia.

Essa situação durou até a mítica Jerusalém ter sido totalmente capturada pelas Forças de Defesa de Israel em 7 de junho de 1967, durante a Guerra dos Seis Dias. Desde então já são 57 anos de domínio judeu em Jerusalém.

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O BRASIL TAMBÉM TEVE CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO

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Durante a Segunda Guerra Mundial, também tivemos nossos campos de concentração – onde japoneses, italianos e principalmente alemães ficaram confinados. Conheça as histórias dessas pessoas.

Manhã de 2 de março de 1944. Na Estação Experimental de Produção Animal de Pindamonhangaba, uma fazenda no interior de São Paulo, ouviu-se um som que não era comum no local. Era o choro de uma criança nascendo. Mas não uma criança qualquer. O choro era de Carlos Johanes Braak, o único brasileiro nascido em um campo de concentração – e em seu próprio país. Durante a Segunda Guerra Mundial, o Brasil manteve 31 campos de concentração, para onde mandava os cidadãos de países do Eixo – a coligação formada por Itália, Japão e Alemanha. Os pais de Carlos, que eram alemães, estavam entre as centenas de pessoas que viveram esse lado menos cordial da história brasileira. “Era uma fazenda. O estábulo virou um dormitório. Minha mãe ficava numa casa, separada. Foi onde passei os dois primeiros anos da minha vida”, lembra Carlos.

O pai de Carlos se chamava August Braak. Sua mãe, Hildegard Lange. Eles partiram de Hamburgo, na Alemanha, em direção à Cidade do Cabo, na África do Sul. Estavam a bordo de um navio chamado Windhuk, no qual August trabalhava como comissário e tesoureiro.
O Windhuk era uma embarcação turística, mas também coletava mercadorias. Quando a 2ª Guerra começou, o navio já estava no continente africano – em Lobito, Angola, recebendo um carregamento de laranjas. O navio não tinha como voltar para a Alemanha em guerra, pois estava sendo perseguido por embarcações inglesas. O capitão decidiu fugir para o Brasil. E a embarcação acabou chegando ao Porto de Santos disfarçada de navio japonês, com o nome de Santos Maru, em 7 de dezembro de 1939.

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Assim que o navio chegou aqui, ficou evidente que ele não era japonês coisa nenhuma. Mas os alemães foram bem recebidos. August e Hidelgard, bem como os outros 242 tripulantes, viviam em Santos e redondezas. Alguns moravam no próprio barco, outros, em pensões. Todos recebiam salários do governo alemão, e levavam uma boa vida. Em 19 de abril de 1940, os pais de Carlos se casaram numa festa a bordo do navio.

Mas, em 1942, tudo mudou. O Brasil rompeu relações diplomáticas com os países do Eixo – cujos cidadãos passaram a ser considerados inimigos. “O governo brasileiro precisava fazer isso [criar os campos de concentração] para se alinhar com as estratégias dos Aliados e dos EUA”, explica a pesquisadora Priscila Perazzo, autora do livro Prisioneiros da Guerra (Ed. Humanitas). Alguns estrangeiros foram mandados para presídios comuns – como os de Ilha Grande e Ilha das Flores (RJ). Mas a maioria foi para campos de concentração, organizados pelo Ministério da Justiça.

Os pais de Carlos foram parar num desses campos – a fazenda em Pindamonhangaba, onde ficaram confinados 136 alemães do navio Windhuk. Eles foram presos porque seu navio tinha chegado ao Brasil durante a guerra, coisa que o governo interpretou como uma ameaça.

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Os prisioneiros não podiam manter suas tradições. Nada de ler livros em alemão, por exemplo. Mas o clima era relativamente tranquilo. Alguns prisioneiros podiam visitar o centro da cidade aos sábados, aonde iam acompanhados pelos guardas. “Era comum os presos chegarem carregando os fuzis dos guardas, que sempre voltavam bêbados”, diz Carlos.

Trabalhos forçados 

A outra parte da tripulação do navio foi parar no campo de Guaratinguetá – entre eles Horst Judes, também tripulante do Windhuk, que tinha 19 anos. Quando desembarcou em Santos, foi um dos que ficaram vivendo no navio, até ser preso em 1942. No campo de concentração de Guarantinguetá, o tratamento não era tão bom. “Éramos obrigados a trabalhar no campo”, conta o alemão em entrevista em 2011, com 87 anos e dono de uma chácara no interior de São Paulo. A rotina no campo de Guarantinguetá era acordar cedo, pegar enxada e picareta e dar duro. Cada prisioneiro levava um número nas costas. “O meu era 17”, conta Horst. O café da manhã tinha dois pãezinhos e uma caneca de café. No almoço e no jantar era só arroz com feijão. Às quintas e aos domingos, era dia de macarrão. Mas a comida nem sempre era suficiente, e os prisioneiros dependiam de padrinhos, geralmente alemães livres, que os ajudavam de diversas maneiras. Alemães livres? Sim. A maior parte dos imigrantes não foi presa. Iam para os campos aqueles que chegavam ao Brasil em plena guerra, ou eram suspeitos de espionagem.

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Foi graças a esse apadrinhamento que Horst conseguiu sobreviver depois de ser solto, em 1945. “Saímos do campo sem dinheiro nem emprego. Foram os padrinhos que nos ajudaram. O meu era de São Paulo. Trabalhei como mordomo e até como taxista”, conta. Como a maioria desses estrangeiros, ele também constituiu uma família brasileira, e diz gostar do país que adotou de maneira forçada.

Na época, o governo brasileiro fazia de tudo para mostrar que os prisioneiros de guerra eram bem tratados – o que nem sempre era verdade. O tempo de internamento variava. Houve pessoas que ficaram 3 anos presas, mas outras conseguiam ser libertadas mais cedo. Também é difícil definir exatamente o número de presos que foram mandados para os campos de concentração brasileiros entre 1942 e 1945, pois os registros são vagos. Mas existe uma documentação que revela nomes e, em alguns campos, o número exato de prisioneiros que passaram por lá. Os registros comprovam que a maioria era de alemães, seguidos de japoneses em bem menor número, italianos e um ou outro austríaco.

Juventude Hitlerista 

Poucas pessoas foram tão afetadas com o internamento nos campos quanto Ingrid Helga Koster, cujas memórias registrou no livro Ingrid, uma História de Exílios (Ed. Sagüi). Nascida no Paraná, ela se tornou órfã de pai com apenas 1 ano de idade. Quando tinha 5 anos, sua mãe se casou novamente, com um alemão. Seu padrasto, Karl von Schültze, tinha migrado para o Brasil em 1920, para fugir da crise que castigava a Alemanha depois da 1ª Guerra Mundial. Schültze chegou aqui e, junto com outros estrangeiros, começou a trabalhar em uma empresa alemã, a AEG, fazendo instalações elétricas em vários lugares do país. Ele se casou com a mãe de Ingrid no início dos anos 30, em Rio Negro, no Paraná. Pouco depois a família, já com duas outras filhas, se mudou para Joinville, em Santa Catarina, cidade dominada pela cultura alemã. Ingrid se lembra de ouvir no rádio um novo chanceler que assumira o poder na Alemanha, cujo carisma a deixava emocionada. “Eu ficava arrepiada. Ele sabia falar com o povo. Nós não imaginávamos o que estava acontecendo”, conta Ingrid. O tal chanceler era Hitler.

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Então começou a guerra, e o pai de Ingrid pressentiu que as coisas ficariam ruins. Ele proibiu, mais de uma vez, que Ingrid se unisse ao movimento Juventude Hitlerista que existia em Joinville. Na Alemanha, esse grupo foi criado para reunir e doutrinar ideologicamente os jovens de 6 a 18 anos. No Brasil, o grupo assumiu um tom mais brando – servia principalmente como ponto de encontro para os imigrantes alemães. Mas o pai de Ingrid não quis nem saber. E também queimou todos os livros em alemão que tinha em casa. Entre eles o famoso Mein Kampf (Minha Luta), de Hitler.

Até que, em 1942, a polícia bateu à porta. “Eles chegaram procurando pelo meu pai, o levaram e ficamos dias sem notícias. Até que chegou um comunicado dizendo que ele estava preso aqui em Joinville”, lembra ela, que depois de algum tempo passou a levar marmitas para seu pai no Hospital Oscar Schneider, adaptado como campo de concentração à época. O governo brasileiro acreditava que Karl fosse um espião nazista.

Por isso, o regime de confinamento dele era rígido. Nos dois meses em que ficou em Joinville, nenhum familiar pode visitá-lo. A marmita era entregue aos guardas. Até que certo dia, quando Ingrid foi levar a comida, lhe avisaram que seu pai não estava mais lá: tinha sido transferido para o Presídio da Ilha das Flores, no Rio de Janeiro. “Nosso dinheiro acabou e tivemos que voltar para o Paraná, viver do jeito que dava”, diz Ingrid. “Nossa casa era apedrejada, pichavam a suástica nos muros. Nós éramos o inimigo.”

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Daí em diante, ela só pôde visitar o padrasto uma vez por ano – no Natal. Quando a guerra acabou, Karl foi libertado por falta de provas. Mas seu chefe na AEG, Albrecht Gustav Engels, acabou condenado a 8 anos de prisão por fazer espionagem nazista. “Meu pai nunca falou sobre os tempos em que ficou preso. Mas acredito que tenha sofrido muito, inclusive tortura, porque antes era uma pessoa alegre e depois se tornou calado, triste”, conta Ingrid. Ela chegou a perguntar antes de o padrasto morrer, em 1966, se ele realmente espionara. Karl deu uma resposta vaga, e disse apenas que não foi condenado. Então ele era mesmo um espião nazista? “Até hoje não tenho certeza”, admite Ingrid.

Mesmo tendo passado por sofrimentos e humilhações, os prisioneiros alemães não quiseram deixar o Brasil depois da guerra. Como o padrasto de Ingrid. “Quando eu perguntava se ele não gostaria de voltar, ele dizia que, apesar de tudo, agora era brasileiro.”

Os principais campos de detenção
1. Tomé-Açú (PA)
A 200 km de Belém. Recebeu alemães e japoneses.
2. Chã de Estêvão (PE)
Abrigou empregados alemães da Cia Paulista de Tecidos (hoje conhecida como Casas Pernambucanas).
3. Ilha das Flores (RJ)
Nessa cadeia, prisioneiros de guerra foram misturados com detentos comuns – uma violação das leis internacionais.
4. Pouso Alegre (MG)
O campo de Pouso Alegre reunia presos militares: os 62 marinheiros do navio Anneleise Essberger.
5. Guaratinguetá e Pindamonhangaba (SP)
Fazendas que pertenciam ao governo e foram adaptadas para receber alemães.
6. Oscar Schneider (SC)
Hospital transformado em colônia penal.

FONTE – http://noitesinistra.blogspot.com.br/2013/09/o-brasil-tambem-teve-campos-de.html

 

E SE A MODA PEGA? – MEMBROS DO MOVIMENTO O SUL É MEU PAÍS DEFENDEM QUE RIO GRANDE DO SUL, SANTA CATARINA E PARANÁ SE SEPAREM DO RESTO DO BRASIL

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Fonte – http://www.chuvaacida.info/2012/04/tolice-e-o-meu-pais.html

MOVIMENTO SEPARATISTA NO SUL DO PAÍS ORGANIZA PLEBISCITO INFORMAL EM 2 DE OUTUBRO PRÓXIMO

Historicamente derrotado desde 1845, quando se encerrou a Revolução Farroupilha, o intento separatista, de tempos em tempos, volta à tona a partir de iniciativas de adeptos da ideia.

Desta vez, o movimento O Sul é o meu País organiza um plebiscito informal em 2 de outubro, mesmo data das eleições municipais, para fazer a seguinte pergunta: “Você gostaria que Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul formassem um país independente?”

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Bandeira do movimento O Sul é o Meu País – Fonte – https://pt.wikipedia.org/wiki/O_Sul_%C3%89_o_Meu_Pa%C3%ADs#/media/File:Bandeira_do_sul.svg

Os integrantes do grupo são favoráveis à separação do Sul do resto do Brasil. Eles pretendem espalhar quatro mil urnas em todos os 1.191 municípios dos três Estados. As seções serão posicionadas a cerca de cem metros dos locais oficiais de eleição. O objetivo é alcançar 5% dos votos do sul, o que significa cerca de um milhão de eleitores. O movimento afirma estar angariando simpatia, com mais de 10 mil voluntários cadastrados para atuar no plebiscito informal. A comunicação e divulgação das ações são concentradas nas redes virtuais, com aproximadamente 900 grupos de Facebook e 650 de WhatsApp.

Organizadores dizem que o financiamento das atividades é feito com doações espontâneas de afiliados e simpatizantes. No último final de semana, foram distribuídos sete mil panfletos da causa na Festa do Peixe, em Tramandaí, no Litoral Norte.

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Fonte – http://www.oeldoradensems.com.br/2015/10/separatistas-movimento-o-sul-e-o-meu.html

As motivações para o separatismo remontam os idos da Revolução Farroupilha de 1835, quando os estancieiros estavam desgostosos com o pagamento de impostos ao Império.

Está presente no mito farroupilha também a ideia de um Rio Grande do Sul unido contra as forças imperiais, quando boa parte do Estado, na Capital e no litoral, não só não aderiu à revolução como a combateu com ímpeto. Para Maestri, é apenas durante a Revolução Federalista, em 1893, que a Revolução Farroupilha, com seus aspectos republicanos e separatistas, passa a ser apresentada como um ideal comum a unir os gaúchos. O interessante, como lembra o historiador Günter Axt, é que o conflito escolhido pelo tradicionalismo do século 20 como basilar para a tradição gaúcha seja o de 1835, e não o de 1893, mais curto mas, segundo ele, muito mais cruento.

– A Revolução Federalista foi mais curta, mas, sob muitos aspectos, foi mais importante. Foi uma guerra civil brasileira, não uma revolta regional, houve um governo paralelo localizado na cidade de Cerro, em Florianópolis… E nela pereceu, segundo alguns historiadores, 1% da população gaúcha. Talvez não se olhe com tanta atenção para essa guerra em particular porque se tem uma dificuldade muito grande de explicar os níveis de violência que nela se estabeleceram – comenta Axt.

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Fonte – http://www.sulconnection.com.br/noticias/1132/colatto-defende-o-sul–meu-pas-e-desencadeia-surto-psictico

A polêmica desencava um debate que volta e meia reaparece no Rio Grande, o ímpeto separatista e os argumentos defendidos por aqueles que acreditam que o Estado estaria melhor sozinho, separado da federação que compõe o Brasil. Para muitos estudiosos do fenômeno, a chave para compreender esse sentimento é vê-lo como um tipo de resposta às mudanças pelas quais o Brasil – e o Estado dentro dele – passaram no último século.

– Esse anseio é calcado na saudade de uma época imaginada. A partir dos anos 1950, houve um êxodo rural muito forte, a pecuária foi entrando em declínio, o tipo sociológico do gaúcho foi desaparecendo. O tipo gaúcho foi incorporado na cidade, estilizado, moderno, quando o tipo real estava desaparecendo. O pessoal se apega a essas fantasias, imaginar uma comunidade que historicamente não houve. O separatismo cobre uma lacuna, um vazio existencial, uma saudade de uma época imaginada do gaúcho – diz o historiador Paulo Fagundes Visentini, professor titular de Relações Internacionais da UFRGS.

Mestre em comunicação e informação pela UFRGS, Érika Caramello, autora de uma dissertação estudando o debate sobre separatismo em uma comunidade virtual direcionada aos cultores do tradicionalismo, também aponta que essa necessidade de afirmação pela diferença é o motor de manifestações sectárias no território aparentemente sem fronteiras da internet. E ainda identifica o crescimento dos anseios de separação como uma forma de compensar a progressiva queda de importância do Estado nos rumos econômicos e políticos do país.

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Fonte – http://www.folhapolitica.org/2014/10/movimentos-que-pedem-separacao-de-sul-e.html

– Há um sentimento, dentro do Estado, de que o Rio Grande do Sul está à margem do centro das decisões, mesmo tendo na presidência uma mulher formada no Estado. Acho muito interessante a forma como a cultura gaúcha é documentada pelo MTG (Movimento Tradicionalista Gaúcho). A gente não vê isso em outras manifestações culturais. Os gaúchos se preocupam demais com a representação de seu passado, e acho que às vezes isso gera uma forçação de barra em querer ser diferente a qualquer custo, quando a própria característica do Brasil como país é sua variedade.

Mas para a microempresária Anidria Rocha, 46 anos, moradora de São Jerônimo, distante 70 quilômetros de Porto Alegre, e uma das coordenadoras do movimento, argumenta que “A nossa população está sendo maltratada pelo poder central, pela forma como se distribuem os tributos. Sustentamos oligarquias políticas. Não somos melhores nem piores, mas somos diferentes do norte, do nordeste, do centro-oeste”.

Mesmo com os Estados do Rio Grande do Sul e do Paraná endividados e com dificuldades até para o pagamento de salários, Anidria entende que a república do sul poderia ser “de primeiro mundo”, baseada no municipalismo.

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Comissão Municipal do Movimento O Sul é o Meu País em Brusque – SC – Fonte – http://www.sullivre.org/movimento-o-sul-e-o-meu-pais-planeja-plebiscito-consultivo-em-brusque/

— E por que estamos quebrados? Mandamos todo o dinheiro para Brasília e retorna uma migalha de 20% — diz.

Professor titular de Direito Constitucional da UFRGS e da Fundação Escola Superior do Ministério Público (FMP), Eduardo Carrion diz que o primeiro artigo da Carta Magna veda o separatismo.

— É flagrantemente inconstitucional. O Brasil é a união indissolúvel de Estados, não pode haver a secessão de um membro para formar novo país ou Estado soberano. O que é possível é a incorporação de Estados entre si, subdivisão ou desmembramento, desde que seja para se manter como território federal — explica Carrion.

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Logotipo do movimento – Fonte – https://pt.wikipedia.org/wiki/O_Sul_%C3%89_o_Meu_Pa%C3%ADs#/media/File:O_Sul_%C3%A9_o_Meu_Pa%C3%ADs.gif

O promotor Rodrigo Zilio, coordenador do Gabinete de Assessoramento Eleitoral do Ministério Público, sustenta que os plebiscitos, para terem valor legal, precisam ser convocados pelo Poder Legislativo, obedecendo as regras da lei 9.709 e a resolução 23.385, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

— Isso que eles pretendem fazer não é vedado, mas não tem valor jurídico nenhum — diz Zilio.

Os separatistas reconhecem as barreiras legais às suas intenções.

— Se conseguirmos os 5% dos votos, vamos enviar à ONU (Organização das Nações Unidas) e tentar chamar um plebiscito oficial. Vamos tentar achar um caminho, assim como outros países acharam — explica Edison Estivalete Bilhalva, também integrante do O Sul é meu País, indicando que a ideia pretende ser uma ferramenta de pressão.

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Fonte – https://agenciaprefixo.com/2016/05/17/o-sul-e-o-meu-pais-golpe-ou-dentro-da-lei/

O grupo também quer enviar os resultados, em caso de sucesso, para a Organização das Nações e Povos Não Representados (UNPO), em que minorias buscam apoio na luta por independência.

Candidato ao Palácio Piratini em 2014, Estivalete auferiu 10.154 votos. Ele cita a corrupção e a incapacidade da política tradicional como motivações e diz que a tentativa de separação da Catalunha do restante da Espanha é inspiração ao esforço. Reconhece, contudo, que as últimas cisões ocorreram em nações mais modestas, como o Sudão do Sul, em 2011, que teve sua história recente entrecortada por guerras civis e conflitos étnicos.

— Quem se separou foram, realmente, os países menores. Mas, em 1914, existiam 96 países. Em 2014, eram 206. Não queremos revolução. É pelo voto — defende Estivalete.

Ex-presidente do Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG), Manoelito Savaris é contrário ao separatismo.

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Fonte – https://agenciaprefixo.com/2016/05/17/o-sul-e-o-meu-pais-golpe-ou-dentro-da-lei/

— Não tem uma razão plausível para dividir o Brasil. Não é essa a solução dos problemas. Gaúchos acima de tudo, mas somos brasileiros — diz Manoelito.

Os três Estados reuniriam cerca de 29 milhões de habitantes. Isso é considerado suficiente para o desenvolvimento de um país. A população do Uruguai, por exemplo, é de cerca de 3,5 milhões.

Mas as dificuldades financeiras e de mercado, avalia Marcelo Portugal, professor do Programa de Pós-graduação em Economia da UFRGS, seriam significativos.

— Não teríamos mais petróleo, precisaria importar. Não produzimos toda a costela que comemos. Também precisaria importar. E seria necessária uma nova moeda. E quanto à dívida pública brasileira, quanto dela ficaria com o novo país? — questiona Portugal.  

AUTORES E FONTES – 

Por: Carlos Rollsing

http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2016/07/movimento-separatista-organiza-plebiscito-informal-em-2-de-outubro-6881217.html#showNoticia=K2FyMGlzMjQyNDc2ODQ1MDUxNzI5MTcwNDMyUGwwNDk0NTc0MzQzNjM1OTA5MDYwNFFtJjI1OTQ1NjA4MjgxODMxNTA1OTI5fkZrWWtWTUFtam8ufiUrXjw

Por: Carlos André Moreira e Larissa Roso

http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/proa/noticia/2014/07/por-que-o-separatismo-permanece-vivo-no-estado-4543932.html#