O PAI DE ARIANO SUASSUNA – QUEM FOI JOÃO SUASSUNA, COMO SE DEU A SUA MORTE E COMO ESTE FATO INFLUENCIOU A VIDA E A OBRA DO SEU FILHO ARIANO

Rostand Medeiros – Escritor e pesquisador

Quando o escritor Ariano Suassuna faleceu em 23 de julho de 2014, muito de sua vida foi trazida ao conhecimento de milhares de brasileiros. Entre os muitos aspectos da biografia deste paraibano que marcou a história do Nordeste, um dos principais pontos abordados foi a importância da figura de seu pai, João Suassuna, em sua vida.

João Suassuna, pai de Ariano

Em inúmeros textos foi comentado, normalmente de maneira bem básica, que João Suassuna havia sido governador da Paraíba e que ele foi assassinado no ano de 1930, em meio às repercussões ocasionadas pela morte de João Pessoa e os acontecimentos políticos daquele período tumultuado da história do Brasil. Mas ao observamos com mais detalhes a figura do pai do grande escritor, que morreu quando Ariano tinha apenas três anos de idade, descobrimos uma história muito intensa, interessante e trágica!

Ariano Suassuna 1927 – 2014

O BACHAREL SERTANEJO

Há dez anos eu dei início a uma inacabada pesquisa por quatro estados nordestinos sobre a vida e morte do cangaceiro paraibano Chico Pereira. Esta motivação vinha do fato de ser imputado a este cangaceiro e seu bando, em fevereiro de 1927, o assalto a fazenda Rajada, em Acari, na região do Seridó Potiguar. Na época esta fazenda pertencia a Joaquim Paulino de Medeiros, meu bisavô e durante grande parte da minha juventude escutei inúmeras vezes os relatos deste episódio através de vários parentes queridos.

Fazenda Volta, zona rural de Catolé do Rocha, lugar onde viveram os primeiros membros da família Suassuna.

No desenrolar das pesquisas vi que a história de Francisco Pereira Dantas, o verdadeiro nome de Chico Pereira, possuía ligações com a trajetória política de João Suassuna. Até mesmo a sua morte, ocorrida em 1928 na zona rural de Currais Novos, em um rumoroso caso de violência estatal, que manchou a biografia do então governador potiguar Juvenal Lamartine de Farias, também possui ligações com o pai de Ariano.

Mas de maneira totalmente independente do fato de João Suassuna ser pai do autor de “Auto da Compadecida”, busquei conhecer mais sobre sua vida.

João Suassuna no início de sua carreira

Nascido João Urbano Pessoa de Vasconcelos Suassuna, veio ao mundo em Catolé do Rocha, Paraíba, no dia 16 de janeiro de 1886. Anos depois estudou na conceituada e tradicional Faculdade de Direito de Recife, onde se bacharelou em 1909. O início de sua carreira como advogado foi em Mossoró, no Rio Grande do Norte. Depois João Suassuna assumiu o posto de juiz nas cidades de Umbuzeiro e Campina Grande, ambas na Paraíba. Na sequência foi Procurador da Fazenda Nacional no seu estado natal.

Em 1 de dezembro de 1913, quando tinha 27 anos, casou com Rita de Cássia Vilar Suassuna, então com 17 anos, a quem chamava carinhosamente de Ritinha. Quando Castro Pinto esteve a frente do executivo paraibano (1912-1915), João Suassuna assumiu cargos de importância na máquina governamental.

Casa onde nasceu João Suassuna em Catolé do Rocha, que na época da foto era o Grupo Escolar Antônio Soares. Atualmente essa antiga casa não existe mais, foi demolida para a construção da nova sede da prefeitura dessa cidade paraibana.

Em 1917, após este período de governo, voltou a ser juiz, desta vez na cidade de Monteiro (PB). Foi nesta época que João Suassuna adquiriu uma propriedade chamada “Malhada da onça”, pra onde seguia ocasionalmente. A fazenda ficava em Desterro, local de nascimento de sua mulher, na época uma comunidade pertencente à cidade paraibana de Teixeira. Em 1919 deixou a magistratura e foi trabalhar no antigo Instituto Federal de Obras Contra as Secas – IFOCS e nesta época adquiriu a Fazenda Acauã, na época localizada na zona rural de cidade de Sousa[1].

Fazenda Acauã na atualidade – Fonte – http://artenapedrapolida.blogspot.com.br/

No começo da década de 1920, João Suassuna foi convidado pelo então governador Sólon de Lucena para assumir a Inspetoria do Tesouro do Estado, depois foi eleito deputado federal. Estava no exercício do mandato parlamentar no Rio de Janeiro, então Capital Federal, quando foi eleito “Presidente da Parahyba”, o que corresponde hoje ao cargo de governador.

O mandato de João Suassuna se caracterizou em grande parte por uma valorização das ações desenvolvidas pelos grandes latifundiários de terras do interior, possuidores de grandes riquezas baseadas no cultivo do algodão e na pecuária. Estes “coronéis” atuavam através de uma estrutura política arcaica, que se valia entre outras coisas do mandonismo, da utilização de grupo de jagunços armados, da conivência com grupos de cangaceiros e outras ações.

Foi nesta época, no palácio do governo da Paraíba, que servia de residência oficial do chefe do executivo daquele estado, mais precisamente no dia 16 de junho de 1927, que nasceu um dos nove filhos do casal João e Rita. Foi batizado como Ariano.

João Pessoa

João Suassuna entregou o cargo em 22 de outubro de 1928 a João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque e assumiu novamente uma das vagas de deputado federal pela Paraíba.

PROBLEMAS À VISTA!

João Pessoa discordava da forma como o grupo político que o elegera conduzia a política do seu estado e logo surgiram sérias divergências com os latifundiários. Um dos maiores embates estava na cobrança de taxas de exportação do algodão. Por esta época os coronéis exportavam o produto principalmente através do porto de Recife, provocando enormes perdas de divisas tributárias para a Paraíba. Procurando evitar esta sangria financeira e efetivamente cobrar os coronéis, João Pessoa implantou diversos postos de fiscalização nas fronteiras da Paraíba, irritando de tal forma estes caudilhos, que pejorativamente passaram a chamar o governador de “João Cancela”.

Os embates políticos entre o governador e os coronéis foram crescendo. A maior liderança entre estes poderosos foi sem dúvida o coronel José Pereira Lima. Verdadeiro imperador da região oeste da Paraíba, na área da fronteira com Pernambuco, tendo como base, a cidade de Princesa e este discordava com veemência das ações de João Pessoa. Do embate entre estes dois homens, resultou um dos maiores conflitos armados do Brasil Republicano.

Foto de 1930 – Sentado vemos Marcolino Florentino Diniz (conhecido como Marcolino Pereira Diniz, um dos líderes de Princesa, que era sobrinho e cunhado do coronel José Pereira. Em pé, da esquerda para direita, temos Pedro Inácio (proprietário de terras em Pernambuco), João Pereira e Pacífico Lopes (proprietários rurais), Joaquim Inácio (grande proprietário de terras no município pernambucano de Triunfo) e Chôcho (proprietário rural na localidade de Irerê, município de Princesa). Agradeço a atenção e participação de Natércia Suassuna Dutra, sobrinha-neta de João Suassuna, que enviou as informações aqui colocadas.

A contenda teve início em 28 de fevereiro de 1930, quando ocorreu a invasão da cidade de Teixeira por parte da polícia paraibana, com o aprisionamento dos membros da conceituada família Dantas, ligada por profundos laços de parentescos e interesses ao coronel José Pereira. Apesar de governador João Pessoa não contar com o apoio do Palácio do Catete, onde o titular, Washington Luís não viabilizou uma efetiva ajuda às forças policiais paraibanas, o governador paraibano foi à luta.

Em meio aos conflitos da chamada “Guerra de Princesa”, no dia 26 de julho de 1930, um sábado, João Pessoa estava na Confeitaria Glória, em Recife, quando foi atingido por dois disparos desfechados pelo advogado paraibano João Duarte Dantas.

Da mesma família Dantas da região de Teixeira, consta que após realizar uma viagem João Dantas encontrou seu escritório na capital paraibana violado. Entre os objetos roubados estavam cartas e poemas eróticos, além de fotografias sensuais, trocados com a sua amante, a poetisa Anayde Beiriz. Estes materiais teriam sido roubados por membros da polícia paraibana, sob as ordens de João Pessoa, sendo publicados e colocados em locais públicos. Diante dessa exibição João Dantas foi à confeitaria vingar a sua privacidade violada[2].

João Duarte Dantas

Após o crime, João Pessoa se tornou um grande herói para o povo paraibano e seu assassinato foi o estopim da conhecida Revolução de 1930. Neste meio tempo cresceu descontroladamente o radicalismo na Paraíba e muito sangue correu[3].

A PARTIDA

Por ser João Suassuna casado com uma prima de João Dantas, ter sido eleito deputado federal com o apoio dos Dantas da cidade de Teixeira e do coronel José Pereira, o pai de Ariano ficou na mira dos familiares, amigos e correligionários do falecido João Pessoa.

No dia da morte do então governador paraibano na Confeitaria Gloria, João Suassuna se encontrava no Recife. Já sua família, inclusive o menino Ariano de três anos, estava na capital paraibana, em uma casa alugada ao Dr. Mariano Falcão, na Rua das Trincheiras. Diante do aumento da tensão na capital, Rita Suassuna e seus nove filhos vão se refugiar no 22º Batalhão de Caçadores, ou 22º BC, atual 15º Batalhão de Infantaria Motorizada. Em pouco tempo João Suassuna conseguiu apoio do rico empresário Frederico João Lundgren e consegue apoio do Exército para trazer sua família para uma casa mobiliada, pertencente a este empresário e localizada na cidade pernambucana de Paulista. Um dado interessante foi que a escolta da família Suassuna era comandada pelo tenente Agildo Barata[4].  

João Pessoa morto

O deputado João Suassuna recebeu a comunicação que havia sido denunciado como cúmplice no assassinato de João Pessoa e teria que ir ao Rio de Janeiro para se defender na Câmara dos Deputados. No Porto do Recife ele embarcou no paquete “Zelândia” e lá estava toda a sua família para as despedidas. Mesmo tendo naquela ocasião apenas três anos de idade, Ariano Vilar Suassuna sempre relatou ao longo de sua vida que jamais esqueceu a partida do seu pai para a Capital Federal, pois aquela foi a última ocasião que o viu com vida. 

João Suassuna chegou a Capital Federal no dia 22 de outubro de 1930, se apresentou a Câmara Federal. Lá soube que tramitava na comissão de constituição e justiça um pedido do deputado pernambucano João Paes de Carvalho Barros, para que fosse concedida uma licença para abrir uma investigação sobre a participação de Suassuna como cúmplice no assassinato de João Pessoa. Logo o pedido foi indeferido pelo presidente da casa, o deputado federal João Santos[5].

TEMPO DE REVOLTA

Não tarda e a convulsão política eclode. A conhecida Revolução de 1930 teve seu início em 03 de outubro de 1930, uma sexta feira, com movimentos sincronizados que foram levados a efeito no Rio Grande do Sul, Paraná, Minas Gerais e Paraíba.

João Suassuna (com papéis e na mão), tendo ao seu lado esquerdo Washington Luís no Porto de Cabedelo, Paraíba.

Mesmo diante desta situação, o deputado João Suassuna se coloca ao lado do presidente Washington Luís, junto com mais de uma centena de políticos. Todos se encontraram na tarde do dia 4 de outubro no Palácio da Guanabara, atual sede do Governo do Estado do Rio de Janeiro, onde morava o mandatário que em breve seria deposto[6].

Os dias seguiam com mais notícias preocupantes vindas da Paraíba e de Pernambuco. Na capital paraibana, na madrugada do dia 4 de outubro, poucas horas após o movimento ter-se iniciado, os revolucionários atacaram o 22º BC e ali morreu o general legalista Alberto Lavenère Wanderley, comandante da 7ª Região Militar. Já o 23º BC da cidade de Sousa, opôs resistência aos revolucionários. Logo em seguida sublevaram-se o 25º BC de Teresina, o 24º BC de São Luís e o 29º BC de Natal.

Revolucionários de 1930 – Fonte – ultimosegundo.ig.com.br

Em Recife o movimento encontrou uma resistência maior por parte das forças legalistas, que haviam se colocado de prontidão ao surgirem notícias da revolução. A vitória dos revolucionários, contudo, foi garantida pelo apoio popular à insurreição, tendo ocorrido, inclusive, distribuição de armas aos populares. Já na manhã do dia 5 de outubro, o movimento havia triunfado em Pernambuco, antes mesmo que os reforços provenientes da Paraíba chegassem a Recife. No dia seguinte a posição dos revoltosos se consolidou quando o presidente do estado, Estácio Coimbra, abandonou o governo[7].

TIRO MORTAL

Enquanto as notícias das sublevações e lutas pelo Brasil afora preocupavam os cariocas e o governo Washington Luís seguia para seus últimos dias, João Suassuna se dividia entre saber notícias de sua família e a atividade parlamentar.

Nesta época o deputado paraibano morava no quarto 63, do Novo Hotel Belo Horizonte, localizado na Rua Riachuelo, 130, no bairro da Lapa.

Rua Riachuelo, em Botafogo, Rio de Janeiro – Fonte – http://www.rioquepassou.com.br

Suassuna tinha o hábito de sempre descer ao “hall” principal para ler os jornais ainda pela manhã. Naquela quinta feira, 9 de outubro de 1930, ele estava nesta atividade quando apareceu uma visita. Era o farmacêutico paraibano Caio Gusmão, que há quatro meses residia no Rio. Eram cerca de oito e quarenta da manhã, quando o deputado decidiu seguir junto com seu visitante para o Palácio Tiradentes, sede da Câmara Federal. Estava vestido de paletó de casimira cinza e sapatos pretos.

Os dois caminharam um bom trecho pela Rua Riachuelo, quando Suassuna  olhou para o céu e comentou…

 – Parece que vai chover e vou buscar minha capa no hotel!

Deu meia volta, avançou alguns passos, mas nesse momento foi atingido por um disparo de arma de fogo. Suassuna tentou sacar um revólver “Colt” que conduzia, mas caiu no chão já morto por apenas aquele único tiro. O fato ocorreu na altura do número 111, próximo a esquina com a Rua dos Inválidos[9].

Caio Gusmão nada pode fazer, o corpo ficou em decúbito dorsal, com o revólver do falecido ao lado e a sua mão manchada de sangue[10].

Logo encheu de gente. Rapidinho se espalhou a notícia sobre quem havia sofrido aquele atentado e o espanto dos transeuntes foi geral. Populares chamaram a “Assistência”, o SAMU da época, que logo chegou, mas nada puderam fazer em favor de João Suassuna.

Em pouco tempo o delegado do 12º Distrito Policial, o Dr. Eunápio Hardman Castello Branco, em companhia do comissário Antônio Pizarro de Morais, chegou ao local e depois vieram várias outras autoridades policiais. Das primeiras investigações descobriram que o assassino fugiu pela Rua Paula Matos, em direção ao Morro de Santa Tereza. Foi comentado aos policiais que o atirador possuía estatura mediana, vestia paletó branco, usava boné de casimira negra e calçava “tennis”[11].

Desde os primeiros momentos que os jornais cariocas apontavam que a razão do assassinato de João Suassuna era vingança pela morte de Joao Pessoa e mesmo com revoltas pipocando no país, os revolucionários de 1930 ainda não tinham conquistado a Capital Federal. Começou então a caçada ao assassino.

Inicialmente em uma vila, um policial encontrou um revólver de grosso calibre do tipo “buldogue” e uma pistola modelo “Liberty”. Além de toda a roupa utilizada pelo pistoleiro na hora do crime. Logo os investigadores perceberam pelas pistas deixadas que um cúmplice estava dando apoio ao matador.

Fosse pela importância de João Suassuna, ou por eficiência (ou uma soma destes dois fatores), o certo é que ás onze e meia da noite do dia 9 de outubro, policiais da 2ª Delegacia Auxiliar capturaram o assassino.

Este se chamava Miguel Alves de Souza e havia sido preso no grande sobrado que pertencia ao engenheiro Joaquim de Souza Leão, localizado na Rua São Clemente, 261, bairro de Botafogo, a poucos metros da tradicional Igreja e Colégio Santo Inácio. Assim foi preso Miguel Alves confessou o crime[12].

Este era paraibano de Alagoa Grande, tinha 30 anos, havia chegado ao Rio pelo vapor “Itapuy” no dia 18 de julho de 1929, trabalhava como tratador de cavalos de cavalos e depois se tornou empregado do engenheiro Joaquim de Souza Leão.

Em uma entrevista concedida ao jornalista Ricardo Farias, publicada no caderno especial do jornal paraibano “A União”, edição de 12 de fevereiro de 2013, página 3, Ariano Suassuna comentou que o assassino de seu pai foi preso na casa do concunhado de João Pessoa[13].

Provavelmente os algozes de João Suassuna tinham a ideia que a polícia carioca jamais concluiria que na casa de gente tão graúda, como a Dr. Joaquim de Souza Leão, encontrariam um elemento que havia matado covardemente um homem pelas costas.

TRAMA ASSASSINA

No dia 10 de outubro, enquanto as autoridades “apertavam” Miguel para ele dar conta do assassinato, no Senado Federal, para onde seguiu o corpo de João Suassuna, ocorreram várias homenagens.

O ex-governador potiguar, então senador, José Augusto Bezerra de Medeiros, proferiu um interessante discurso sobre a vida do falecido político paraibano. Houve uma missa de corpo presente, várias autoridades estiveram no velório e foram colocadas muitas coroas de flores. João Suassuna foi enterrado no túmulo número 611, no cemitério São João Batista, em Botafogo. Mas nem sua mulher e nenhum de seus nove filhos estiveram presentes!

Enquanto isso na delegacia, Miguel Alves de Souza confessou que recebeu o apoio de outro paraibano chamado Antônio Granjeiro. Este era carteiro dos Correios e Telégrafos no Rio, lhe forneceu as armas e apoiou na sua fuga. Granjeiro foi logo preso[14].

Os dois comparsas entregaram então Otacílio de Lucena Montenegro, um funcionário do Tribunal de Contas, como a pessoa que procurou Granjeiro, lhe deu o dinheiro para a compra das armas do crime e a ordem para procurar alguém disposto a apertar o gatilho.

E quem era Otacílio de Lucena Montenegro?

Na mesma entrevista concedida ao jornalista Ricardo Farias, do jornal paraibano “A União”, em fevereiro de 2013, Ariano Suassuna comentou que foi Otacílio quem intermediou junto a Granjeiro o assassinato de seu pai e que Otacílio era sobrinho do então coronel do Exército Aristarco Pessoa, irmão de João Pessoa[15].

Demorou mais alguns dias para prenderem Otacílio, mas ele foi finalmente detido na Tijuca. Para dirimir dúvidas, o investigador Silvio Terra fez uma acareação na 2ª Delegacia Auxiliar entre Otacílio, Granjeiro e Miguel Alves e para o policial ficou patente a participação de Otacílio. Mas este negou peremptoriamente quaqlquer envolvimento.

Para os policiais Antônio Granjeiro, homem pobre e com numerosa família (tinha onze filhos), era considerado “doentio e muito sugestionável” e as preleções de Otacílio, que entre outras coisas dizia “-Será que não existe um paraibano que seja capaz de vingar a morte de João Pessoa?” surtiram efeito desejado. Granjeiro foi atrás de Miguel e o crime ocorreu.

Entre outras acusações Granjeiro foi apontado como o homem que seguiu João Suassuna, conheceu sua rotina, comprou as duas armas usadas no crime e chegou a enviá-las para um armeiro quando foram detectadas defeitos nelas. Foi ele quem adquiriu a munição e no dia 7 de outubro, dois dias antes do crime, foi com Miguel Alves praticar tiro ao alvo nas margens da hoje superpovoada lagoa Rodrigo de Freitas, próximo ao Jóquei Clube do Rio.

Os três acusados, entre estes um carteiro e um tratador de animais, foram defendidos pelo ninguém menos que advogado Clóvis Dunshee de Abranches, considerado um dos maiores criminalistas do Brasil na época e famoso pelo rumoroso caso Sylvia Seraphin Thibau[16].

Mas nesta época nem foi tão necessário a participação de um jurista tão renomado para defender estes homens, pois logo os revolucionários chegaram ao Rio de Janeiro, depuseram o presidente e assumiram o poder. No vácuo institucional, em meio às alegrias da vitória, os três homens responsáveis pela morte de João Suassuna foram soltos[17].

EM BUSCA DE JUSTIÇA

Foi Rita Suassuna que não deixou a morte de seu marido cair no esquecimento.

Tempos depois ela enviou uma carta extremamente intensa e emocionada ao então Presidente Getúlio Vargas e este mandou reabrir o caso. Em pouco tempo a morte de João Suassuna voltou às páginas dos periódicos cariocas.

Antônio Granjeiro, esposa e filhos em 1933.

Foram decretadas as prisões de Antônio Granjeiro e Miguel Alves. O primeiro foi preso em casa, no Rio. O segundo foi capturado na Paraíba e recambiado de navio para a Capital Federal[18].

Já os autos do processo simplesmente haviam sumido. Para completar o quadro os jornais noticiaram que novos depoimentos alteraram a situação de Octacílio de Lucena Montenegro e ele sequer prestou mais algum depoimento[19].

O promotor Francisco Belizário Velloso Rabello se preparou para o julgamento acusando os réus de “assassinato premeditado e sem direito a defesa”. Apoiando a promotoria, a pedido de Rita Suassuna, estava o advogado e ex-senador paraibano José Gaudêncio[20].

Já o advogado Clóvis Dunshee de Abranches apresentou em favor dos réus a alegação que o crime por eles cometido “ocorreu em um período de intensa perturbação política devido à morte de João Pessoa” e isso gerou nos assassinos de João Suassuna “uma forte perturbação dos sentidos e da inteligência”[21].

O advogado Clovis Dunshee de Abranches.

Visando reforçar a defesa, o advogado Dunshee de Abranches conseguiu do “Centro Paraybano” no Rio de Janeiro, entidade de apoio aos paraibanos que viviam na Capital Federal, mas também servia de local de encontros políticos, uma carta em defesa dos réus. Produzida por Arthur Victor, presidente da instituição, a carta é uma longa peça acusatória contra João Suassuna, que mostra bem os processos da política radical daqueles tempos.

Entre outras coisas está descrito que Irineu José do Nascimento, padrasto de Miguel Alves, e um 1º sargento reformado da polícia paraibana, havia sido fuzilado “por ordem de João Suassuna”, deixando sua mãe e três irmãos no desamparo. Sua família foi obrigada a fugir para Pernambuco, onde sofreram “sérias perseguições” por parte de Estácio Coimbra, então governador daquele estado.

Já Antônio Granjeiro nasceu em 1888, chegou ao Rio em 1912, entrou nos Correios e Telégrafos e foi transferido para Diamantina (MG). Depois de retornar para o Rio começou a participar das atividades do “Centro Paraybano” e na época que iniciou os movimentos políticos contra o governo Washington Luís, o destemido Granjeiro era uma espécie de segurança e forte entusiasta pela causa liberal.

A carta do presidente do “Centro Paraybano” menciona um episódio envolvendo Granjeiro, na época que o corpo de João Pessoa chegou para ser enterrado ao Rio de Janeiro. Quando da passagem do féretro por uma grande avenida, em meio à multidão, o carteiro gritou a pleno pulmões um “De joelhos!” e docilmente se ajoelhou diante do caixão do governador assassinado e seu gesto seguido por muitos presentes. Aparentemente isso o tornou uma figura de destaque do “Centro Paraybano”[22].

O julgamento começou ao meio dia de uma quarta feira, 18 de novembro de 1931, sob a presidência do juiz Nelson Hungria. O corpo de jurados era formado por sete homens e, apesar da atenção que aquele júri despertava entre os cariocas, tudo ocorreu de forma rápida e os dois réus foram absolvidos por 5 a 2 e a promotoria recorreu[23].

NOVO JULGAMENTO

Em 8 de janeiro de 1933 houve um novo julgamento, desta vez sendo presidido pelo juiz Antônio Eugênio Magarinos Torres, tendo como promotor Rufino de Loy e novamente a frente da defesa o competente Clóvis Dunshee de Abranches. Percebemos que, tal como o julgamento ocorrido em 1931, este segundo embate jurídico atraiu a atenção dos cariocas, sendo francamente noticiado na imprensa local.

O juiz Arthur Eugênio Magarinos Torres Filho. Nasceu em Campos (RJ) em 16 de janeiro de 1889 e faleceu em 8 de julho de 1960 – Fonte – http://autorescampistas.blogspot.com.br/

O promotor Rufino fez uma longa acusação. Já o advogado de defesa, com enorme desenvoltura, busca destruir todos os argumentos da promotoria. Mostrou com extrema eloquência a sofrida história de vida dos réus, apontando-os como “nordestinos pobres”. Trás para o tribunal o clima de revolta e instabilidade política de outubro de 1930, torna a ler a carta do “Centro Paraybano” e coloca os réus fora da classe dos “criminosos vulgares”. Cita vários juristas, psiquiatras e médicos para explicar como as emoções políticas tinha haver com o assassinato de João Suassuna. Ele relembrou a epopeia dos “18 do Forte”, fazendo uma relação deste caso para justificar o clima emocional dos réus diante da morte de João Pessoa[24].

Dunshee de Abranches fez até mesmo considerações para o crime de regicídio. Em determinada hora, como era praxe no tribunal no Rio, houve a parada para o “chá”[25].

Depois do retorno e finalização dos debates, os jurados se recolheram para decidir o futuro dos réus. Em 30 minutos trouxeram para o juiz Magarinos Torres o “Veredictum”, condenando Miguel Aves de Souza há seis anos e Antônio Granjeiro a quatro anos de detenção[26].

O julgamento teve outros desdobramentos. A família Pessoa, através do filho de João Pessoa, o jornalista Epitácio Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, abriu fogo com suas baterias jurídicas, processando o promotor Rufino de Loy. Entre outras coisas consideradas um acinte pela família e ditas pelo promotor na tribuna, estava que os réus “eram conhecidos da família Pessoa”. Não sei o resultado deste processo.

A TROCA

Evidentemente que para Rita Suassuna o resultado do julgamento foi decepcionante, uma verdadeira lástima. Mas o pior foi a viúva de João Suassuna saber que Antônio Granjeiro passou pouco mais de um ano na cadeia e ainda conseguiu que os seus “serviços” pela causa liberal fossem “plenamente recompensados” com a sua liberdade. Mesmo condenado no tribunal, este verdadeiro “alpinista político”, que queria ascensão com o sangue alheio, foi reincorporado aos Correios e Telégrafos em junho de 1934 e voltou a sua primitiva função de carteiro no Rio de Janeiro.

Já o assassino Miguel Alves de Souza se perdeu no “oco do mundo”!

Na época a família Pessoa foi muito eficaz em criar em torno da morte de João Pessoa, toda uma condição de perpetuação da memória desta família na Paraíba. Começa que a atual denominação da capital paraibana é “João Pessoa”, fato único entre as capitais estaduais brasileiras. Depois basta fazer uma pequena pesquisa no Google e se percebe o alto número de ruas e logradouros com nomes e sobrenomes ligados a família do governador morto na Confeitaria Glória.

Foto provavelmente da década de 1960, onde mostr Rita Suassuna e seus filhos, da esquerda para direita, Ariano, Saulo, João, Lucas e Marcos.

Já Rita Suassuna, depois de várias mudanças e provações, levou seus filhos para a cidade de Taperoá, no sertão paraibano. Ali, em uma região onde isso era a praxe, lutou para que seus cinco filhos homens jamais partissem para vingar a morte do pai. Entretanto a família de João Suassuna sempre perpetuou a sua memória e isso se incorporou no jovem Ariano, mesmo com tão pouca idade na ocasião da morte de seu pai.

Mesmo sem saber mensurar o quanto o peso da morte de João Suassuna contribuiu para moldar o Ariano Suassuna escritor, eu creio que de certa maneira ele realizou a sua “vingança” através dos seus escritos.

Se a família Pessoa buscou se perpetuar em nomes de ruas e logradouros na Paraíba, certamente Ariano se imortalizou na mente e nos corações de milhões de paraibanos, nordestinos e brasileiros com as suas obras. O autor deste trabalho acredita que por muitas décadas e séculos no futuro, o nome e as obras de Ariano Suassuna serão obrigatórios para o entendimento do Nordeste.

Contudo, eu tenho certeza que ele, Ariano Vilar Suassuna, trocaria tudo o que conseguiu com as letras para ter tido a oportunidade de ter visto seu pai conhecer seus filhos, ter acompanhado a sua vida e estar ao lado de João Suassuna no dia de sua morte. 

VEJA NO TOK DE HISTÓRIA OUTRAS HISTÓRIAS SOBRE A PARAÍBA DAS DÉCADAS DE 1920 E 1930 

A REPERCUSSÃO DOS ATAQUES DO CANGACEIRO SINHÔ PEREIRA A PARAÍBA E A INFORMAÇÃO SE LAMPIÃO ESTEVE EM TERRAS POTIGUARES EM 1922 – https://tokdehistoria.com.br/2013/03/15/noticia-ruim-chega-ligeiro/

A HISTÓRIA DO TIROTEIO NO SÍTIO TATAÍRA E A INCRÍVEL RESISTÊNCIA DO CANGACEIRO MEIA-NOITE –https://tokdehistoria.com.br/2013/08/14/a-historia-do-tiroteio-no-sitio-tataira-e-a-incrivel-resistencia-do-cangaceiro-meia-noite/

A BATALHA DO CASARÃO DOS PATOS – https://tokdehistoria.com.br/2011/06/07/a-batalha-do-casarao-dos-patos/

BENTO QUIRINO, A VIOLÊNCIA NO SERTÃO DE OUTRORA E A BUSCA PELA HISTÓRIA

NOTAS  

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[1] Em 1945 o antigo IFOCS passou a se chamar Departamento Nacional de Obras Contras as Secas – DNOCS. A Fazenda Acauã é um importante patrimônio histórico rural paraibano. Com 300 anos de história, é a mais antiga fazenda de gado e algodão do Sertão da Paraíba. Está localizado a 409 quilômetros da capital, atualmente se localiza na zona rural da cidade de Aparecida. Ariano Suassuna morou no casarão, durante parte de sua infância, e se inspirou em Acauã para escrever suas obras. Ver http://sednemmendes.blogspot.com.br/2013/05/visitando-o-sitio-historico-da-fazenda.html

[2] Segundo material existente no site www.http//pb1.com.br , o vereador Fernando Milanez, sobrinho-neto de João Pessoa, afirmou que a versão de que o assassinato teria sido um crime passional é um “absurdo”, porque, segundo ele, João Pessoa nem conhecia João Duarte Dantas. Para a família de João Pessoa, o ex-presidente foi vítima de ambição e mentira, e a causa do assassinato teria sido política. Independente do motivo, João Dantas, junto ao seu cunhado, Augusto Caldas, que não havia participado do crime, foram presos na Casa de Detenção do Recife. Em 6 de outubro de 1930, nos primeiros dias da Revolução de 1930, os dois teriam sido assassinados. A versão oficial indicou suicídio. Ver – http://pb1.com.br/noticias_dentro.php?pt1=898

[3] No início de 1929 ainda estava em vigência a conhecida “política do café com leite”, em que políticos de Minas Gerais e de São Paulo se alternavam na presidência da república. O então Presidente Washington Luís, indicou o governador São Paulo, Júlio Prestes, como seu sucessor. Apenas três estados negaram o apoio a Prestes: Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba. Os três se uniram a políticos de oposição de diversos estados e formaram, em agosto de 1929, um grupo de oposição denominado Aliança Liberal. No dia 20 de setembro do mesmo ano foram anunciados os candidatos oposicionistas às eleições presidenciais. Getúlio Vargas seria candidato a Presidente do Brasil e João Pessoa seria o candidato a vice-presidente. Após perder as eleições, que foram realizadas em março de 1930, a Aliança Liberal alegou que a vitória de Prestes era decorrente de fraudes. Ver – http://pb1.com.br/noticias_dentro.php?pt1=898

[4] O empresário pernambucano Frederico João Lundgren (1879-1946) foi uma espécie de desbravador em seu tempo. Tratado como coronel, gerou 22 filhos, teve várias mulheres e se tornou uma espécie de lenda do comércio ao levar tecidos e outras mercadorias a dezenas de pequenas cidades do interior do país. Herdeiro de uma tecelagem, Lundgren teve, em 1908, a ideia de criar uma cadeia de varejo pela qual pudesse vender seus produtos. Era o começo das conhecidas Casas Pernambucanas. Ver – http://exame.abril.com.br/revista-exame/edicoes/0726/noticias/a-sobrevivente-m0053283 e https://tokdehistoria.com.br/2014/05/12/oxente-hitler-arquivos-e-documentos-mostram-que-os-nazistas-estiveram-na-paraiba/

[5] Ver jornal “O Paiz”, Rio de Janeiro, edição de 4 de outubro de 1930, página 4.

[6] Ver jornal “O Paiz”, Rio de Janeiro, edição de 5 de outubro de 1930, na 1ª página. Apesar do Palácio do Catete ser a antiga residência dos Presidentes da República, quando tomou posse Washington Luís decidiu residir no Palácio da Guanabara.

[7] Ver – http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%A3o_de_1930

[9] Este local fica bem próximo a atual sede da renomada Editora Folha Dirigida.

[10] Os jornais listam que além de sua aliança, de 200 mil réis em dinheiro, um relógio e abotoaduras de ouro, João Suassuna levava a licença para portar sua arma e alguns papéis. Entre estes uma carta fechada para a esposa.

[11] Ver jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de 9 de outubro de 1930, 1ª página e o jornal “O Paiz”, Rio de Janeiro, edição de 10 de outubro de 1930, página 2. Desde os primeiros momentos as investigações ficaram a cargo do investigador Silvio Terra, figura lendária da polícia investigativa carioca, cujo nome atualmente batiza a Academia de Polícia Civil do Rio de Janeiro.

[12] Joaquim Souza Leão era um puro exemplo de um membro oriundo da mais alta elite agrária açucareira pernambucana. Era sobrinho de desembargador, de senador do Império, do Visconde de Campo Alegre e filho de Antônio de Souza Leão, rico fazendeiro pernambucano da região de Moreno e que havia recebido do Imperador Pedro II o título de Barão de Morenos. Um de seus filhos foi embaixador. Ver – http://morenoengenho.blogspot.com.br/

[13] Ver – http://issuu.com/auniao/docs/caderno_especial_parte_1

[14] Ver o jornal “O Paiz”, Rio de Janeiro, edição de 11 de outubro de 1930, página 2 e o jornal “Diário carioca”, Rio de Janeiro, edição de 7 de janeiro de 1933, 1ª página.

[15] Segundo Ariano Suassuna, na década de 1950, quando ele entrou na Faculdade de Direito de Recife, conheceu o filho do Joaquim Pessoa Cavalcante de Albuquerque, irmão de João Pessoa, que isentou o pai da morte de João Suassuna. Mas não o tio Aristarco Pessoa e nem a participação de Octacílio de Lucena Montenegro no crime. Ver – http://issuu.com/auniao/docs/caderno_especial_parte_1

[16] Sylvia Seraphin Thibau era uma jornalista, escritora e poetisa, era casada com o médico João Thibau Júnior e mãe de dois filhos. Sylvia foi acusada pelo jornal carioca “A Crítica” de ter traído o marido, mantendo um caso com o também médico Manuel Dias de Abreu, mais tarde inventor da abreugrafia. Irritada, ela foi à redação do jornal armada, para matar o editor, Mario Rodrigues, no dia 26 de novembro de 1929. Como Mário não estava no jornal, Sylvia acabou atirando no filho dele, o também jornalista Roberto. No local, assistindo ao crime, estava o irmão da vítima, Nelson Rodrigues, então com 17 anos. O processo criminal foi acompanhado por uma feroz campanha promovida pelo jornal, que chamava a ré de “literata do Mangue” e “cadela das pernas felpudas”. Seu julgamento foi o primeiro no Brasil a ser transmitido ao vivo pelo rádio. O advogado Clovis Dunshee de Abranches alegou que Sylvia havia se descontrolado por ter sido caluniada e conseguiu a sua absolvição. Ela suicidou-se em 1936, depois de abandonada por um tenente-aviador por quem havia se apaixonado. Ver http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%ADlvia_Serafim_Thibau

[17] Ver jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de 4 de novembro de 1930, página 9. Neste jornal temos uma longa declaração de Silvio Terra, se defendendo de acusações feitas por Octacílio de Lucena Montenegro através dos jornais. As acusações de Octávio apontam que este havia sido torturado pelos policiais para confessar sua participação na morte de Ariano Suassuna. Não encontrei a edição de jornal com a publicação de Octávio contra Silvio Terra. Mas encontrei a carta de defesa do investigador aos seus superiores e publicada nos jornais do Rio. Este investigador é muito claro, direto e contundente em suas afirmativas, além de negar veementemente o uso de tortura contra os detidos. O então coronel Bertoldo Klinger, líder revolucionário, elogiou o posicionamento do policial. Ver também “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de 11 de julho de 1931, página 3.

[18] Miguel Alves estava incluso no crime previsto no Artigo 294, parágrafo 1º, com agravantes do Artigo 39, parágrafos 2º, 7º, 8º e 13º. Já Granjeiro era acusado nos mesmos artigos, acrescentando o artigo 18, parágrafo 3º. Lembrar que estas acusações faziam parte Código Penal anterior ao que atualmente está em vigência. Ver jornal “Diário de Notícias”, Rio de Janeiro, edição de 7 de janeiro de 1933, 1ª página.

[19] Ver jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de 11 de julho de 1931, página 3. Os jornais da época não informam quem, quando e onde ocorreram estes depoimentos que livraram Octacílio de Lucena Montenegro deste processo. Nem comentam nada mais sobre o sumiço dos autos e sequer é mais comentado por qualquer razão o nome do Joaquim de Souza Leão como presumidamente envolvido no crime. Ver jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de 11 de julho de 1931, página 3.

[20] Ver jornal “A Esquerda”, Rio de Janeiro, edição de 21 de setembro de 1931, página 4.

[21] Ver jornal “Diário de Notícias”, Rio de Janeiro, edição de 19 de agosto de 1931, página 2.

[22] Ver jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de 11 de setembro de 1931, página 3. Por mais estranha que esta história de ficar de joelhos diante do caixão de João Pessoa possa parecer, naquela época, naquelas circunstâncias, isso aconteceu de verdade. Na capital paraibana o nível de fanatismo em 1930 era tal, que se alguém tocasse em um local público uma certa música criada para homenagear o morto ilustre, e alguém gritasse um sonoro “De joelhos!”, aí de quem não cumprisse a ordem. Ou era surrado, ou preso! Em outros estados também ocorreram muitas manifestações radicais. No Rio Grande do Norte, como consequência direta das mudanças das mudanças políticas da Revolução de 1930, a campanha estadual de 1934 foi uma das mais violentas da história política potiguar, com vários mortos em meio a inúmeras arbitrariedades.

[23] Ver jornal “Diário Carioca”, Rio de Janeiro, edição de 19 de novembro de 1931, página 3. É interessante comentar sobre o juiz Nelson Hungria Hoffbauer. Este nasceu em Além Paraíba, Minas Gerais, em 1891, iniciou sua vida pública como promotor de Rio Pomba, em seu estado natal. Nomeado juiz em 1924, foi magistrado por 46 anos, tendo sido nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal em 1951, do qual chegou à presidência e se aposentou em 1961. Hungria é tido como um dos luminares de nossa cultura jurídico-penal, onde deixou escrito 17 obras e 150 monografias. Foi considerado o líder intelectual da redação do Código Penal de 1940, além de ter participado da elaboração do Código de Processo Penal, da Lei de Contravenções Penais e ainda da Lei de Economia Popular. Seus Comentários ao Código Penal (8 volumes) influenciaram gerações de juristas brasileiros e constituíram referência obrigatória para a compreensão de nosso sistema jurídico penal. Ver –  http://www.memorial.mppr.mp.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=114

[24] A Revolta dos 18 do Forte de Copacabana foi uma revolta tenentista ocorrida na cidade do Rio de Janeiro em 5 de julho de 1922. Foi a primeira revolta tenentista da República Velha. Teve a participação de 17 militares e um civil. Suas causas principais estão no descontentamento dos tenentes com o monopólio político do poder no Brasil por parte das oligarquias (principalmente ricos fazendeiros) de Minas Gerais e São Paulo. Embora o movimento tivesse sido planejado em várias unidades militares, somente o Forte de Copacabana e a Escola Militar se levantaram no dia 5 de julho de 1922. O forte foi bombardeado e a rendição dos rebeldes foi exigida.  O tenente Siqueira Campos e um grupo de militares rebeldes pegaram armas e marcharam pelas ruas em direção ao Palácio do Catete (sede do governo federal na época). Durante a marcha alguns militares desistiram, ficando apenas 17 que receberam o apoio na rua de um civil, totalizando 18. Os rebeldes foram cercados pela tropa do Governo Federal. Após forte tiroteio em frente ao posto 3 da praia de Copacabana, somente Siqueira Campos e Eduardo Gomes sobreviveram e foram presos. Os outros dezesseis integrantes do movimento foram mortos no combate.

[25] Regicídio é o assassinato de um rei, seu consorte, de um príncipe herdeiro ou de outras formas de regentes, como presidentes e primeiro ministros. Ver http://pt.wikipedia.org/wiki/Regic%C3%ADdio

[26] Ver o periódico “Diário de Notícias”, Rio de Janeiro, nas edições de 7 e 8 de janeiro de 1933, sempre nas 1ª páginas. Igualmente ver o jornal “Diário Carioca”, Rio de Janeiro, edição de 7 de janeiro de 1933, 1ª e 5º páginas.

LUGARES ESQUECIDOS – CAMINHOS DA REPORTAGEM

UM TRABALHO EM QUE TIVE O PRIVILÉGIO E A HONRA DE PARTICIPAR

PRÓXIMO dia 12 DE MARÇO, ás 22:00 (QUINTA-FEIRA), vocês vão poder conferir na TV BRASIL, no programa CAMINHOS DA REPORTAGEM, o maravilhoso trabalho LUGARES ESQUECIDOS.

Casa antiga em Serra Talhada (PE)
Casa antiga em Serra Talhada (PE) – CLIQUE NAS FOTOS PARA AMPLIAR.

Neste programa a equipe da TV BRASIL de São Paulo, tendo a frente a competente jornalista Bianca Vasconcelos, vão apresentar antigas casas e locais hoje esquecidos, mas que no passado tiveram muita importância histórica. São locais que possuem uma beleza e uma áurea própria, que proporcionam uma reflexão do abandono geral em relação ao conhecimento do nosso passado.

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Uma parte deste programa foi realizado em São Paulo e a outra parte no ensolarado sertão nordestino. Tive o privilégio e a honra de estar junto com estes profissionais em um trabalho maravilhoso. Além da Bianca, estive junto ao cinegrafista Alexandre Nascimento e Eduardo Domingues. Este é nosso segundo trabalho com a TV BRASIL, o primeiro foi em 2013, junto com a jornalista Carina Dourado e o cinegrafista Osvaldo Santos e o tema foi sobre cangaço.

Sobre este primeiro tralho veja aqui nestes links;

JUNTO COM A TV BRASIL NAS TRILHAS DE LAMPIÃO EM PERNAMBUCO

JUNTO COM A TV BRASIL NAS TRILHAS DE LAMPIÃO EM PERNAMBUCO II

LINK PARA O PROGRAMA CAMINHOS DA REPORTAGEM E A ROTA DO CANGAÇO – TV BRASIL

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Percorremos centenas de quilômetros pelos caminhos ensolarados dos sertões da Paraíba e de Pernambuco, onde busquei apresentar a Bianca e a sua equipe locais bem interessantes e com antigas casas que testemunharam as lutas do tempo da colonização, do tempo do cangaço de Lampião e da Guerra de Princesa.

Para isso contei com a inestimável ajuda de grandes amigos que tenho pelo sertão afora.

Antônio Antas sendo entrevistado
Antônio Antas sendo entrevistado

Com Antônio Antas (Manaíra-PB) a equipe da TV BRASIL de São Paulo pode conhecer a “Casa Grande dos Patos”, em Patos de Irerê, próximo a São José de Princesa (PB), onde em 1930 ocorreu uma grande batalha da chamada Guerra de Princesa.

Junior Alves defronte a casa do coronel José Pereira, em Princesa Isabel (PB)
Junior Alves defronte a casa do coronel José Pereira, em Princesa Isabel (PB)

Ainda sobre este conflito, através do conhecimento de Junior Alves (Tabira-PE), eles adentraram pela casa do coronel José Pereira, na cidade de Princesa Isabel (PB), local que é um verdadeiro símbolo do poder no sertão antigo.

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Com a ajuda de André Vasconcelos (Triunfo-PE), estivemos em Santa Cruz da Baixa Verde (PE), em uma casa simples, onde em 1924 ocorreram dois grandes combates entre Lampião e Clementino Quelé, um dos mais valentes inimigos do Rei do Cangaço.

Francisco Mourato e Álvaro Severo, de Serra talhada (PE)
Francisco Mourato e Álvaro Severo, de Serra talhada (PE)

Junto com Álvaro Severo e Francisco Mourato (Serra Talhada-PE), dois verdadeiros baluartes em relação à preservação da memória de sua região, conhecemos as histórias de uma das primeiras casas do período da colonização do Sertão do Pajeú e a presença do cangaço na secular Fazenda Barreiros. E foi nesta fazenda que encontramos Edvan, conhecido como Edvan Loló.

Este é um homem simples, que montado no seu cavalo, utilizando todos os utensílios de couro existentes para o trabalho de vaqueiro, cavalga entoando cânticos e abios que trazem nos seus versos a memória da sua região.

Edvan ao lado de um jovem vaqueiro que mantém a tradição dos homens encourados da caatinga nordestina
Edvan ao lado de um jovem vaqueiro que mantém a tradição dos homens encourados da caatinga nordestina

Edvan é um conhecedor profundo da arte de conduzir o gado pela caatinga, veste o gibão de couro com orgulho e enfrenta a caatinga com paixão e valentia.

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Edvan é também um dos personagens de um programa da TV BRASIL que vai trazer as histórias das antigas casas sertanejas que foram palcos de luta.

Junto a equipe da TV BRASIL de São paulo. Uma honra trabalhar com vocês.
Junto a equipe da TV BRASIL de São Paulo, Bianca, Eduardo e Alexandre. Uma honra trabalhar com vocês!

NÃSO ESQUEÇAM, PRÓXIMO dia 12 DE MARÇO, ás 22:00 (QUINTA-FEIRA), na TV BRASIL, no programa CAMINHOS DA REPORTAGEM, vocês vão poder conferir o maravilhoso trabalho LUGARES ESQUECIDOS.

Um forte abraço a todos!

Rostand Medeiros

AS BATALHAS ENTRE CLEMENTINO QUELÉ E LAMPIÃO EM SANTA CRUZ DA BAIXA VERDE – PE

Lampião, o Rei do Cangaço
Lampião, o Rei do Cangaço

“HOJE SÓ SE SALVA QUEM AVÔA”

Autor – Rostand Medeiros

Em um dia de agosto de 2006, uma sexta feira, na cidade pernambucana de Santa Cruz da Baixa Verde, em Pernambuco, tivemos a oportunidade de conhecer um homem, nascido em 1912, que pela sua lucidez e saúde, foi como encontrar um verdadeiro tesouro da história oral do cangaço.

Clementino José Furtado, o Clementino Quelé.
Clementino José Furtado, o Clementino Quelé.

Seu nome era Antônio Ramos Moura, sua residência uma casa ampla no sitio Conceição e o assunto foi os dois ataques perpetrados por Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, e seus cangaceiros, contra a casa do seu antigo parceiro, Clementino José Furtado, o Clementino Quelé, que após estes embates se tornou um dos mais esforçados perseguidores do “Rei do Cangaço”.

Antônio Ramos Moura, então com doze anos, foi testemunha destes episódios e detalhou vários aspectos de sua vida na época e rememorou inúmeros fatos. 

A Santa Cruz 

O atual município de Santa Cruz da Baixa Verde está localizado na região do Sertão do Alto Pajeú, na fronteira com a Paraíba. Fica distante 455 quilômetros de Recife, possui um agradável clima serrano e a cidade se caracteriza por concentrar na atualidade a maior quantidade de engenhos de rapadura de Pernambuco. Já as origens do local são oriundas do antigo “sítio Brocotó” e a atual denominação tem origem na ação de um missionário nordestino que possui uma história extraordinária.

Nascido em 5 de agosto de 1806, na Vila de Sobral, Ceará, José Antônio Pereira Ibiapina teve uma origem confortável. Mas devido a participação do seu pai Francisco Miguel Pereira na insurgência conhecida como Confederação do Equador, este foi fuzilado em 1825, e o irmão Alexandre seguiu preso para a ilha de Fernando de Noronha, onde morreu pouco tempo depois. Ibiapina teve que assumir e manter financeiramente a família.

Imagem mais conhecida do Padre Ibiapina - Fonte - http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/index.php?option=com_content&view=article&id=852&Itemid=1
Imagem mais conhecida do Padre Ibiapina – Fonte – http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/index.php?option=com_content&view=article&id=852&Itemid=1

Algum tempo depois ingressou no Curso de Direito do Recife, concluindo em 1832. No ano seguinte exerce o cargo de professor substituto de Direito Natural na Faculdade de Olinda. Depois foi eleito Deputado Geral e nomeado, em dezembro, Juiz de Direito da Comarca de Campo Maior, no Ceará. Concluídos os trabalhos legislativos, em 1837, Ibiapina voltou para o Recife e resolve exercer a advocacia. No entanto, ele passa a trabalhar efetivamente na profissão no estado da Paraíba. Em 1840 volta ao Recife e continua sua luta junto aos tribunais.

A partir de 1850 Ibiapina resolve abandonar seus trabalhos forenses e inicia um período dedicado à meditação e exercícios de piedade. Após três anos de meditação e reflexão, Ibiapina decide-se pelo sacerdócio. Nesse sentido, em 12 de julho de 1853, aos 47 anos de idade, ele se torna o Padre Ibiapina. Logo após sua ordenação, o Bispo Dom João da Purificação o nomeia Vigário Geral e Provedor do Bispado, além de professor de Eloquência do Seminário de Olinda.

Mas contrariando seus superiores, opta pela vida missionária. Padre Ibiapina começou então seu trabalho missionário pelo interior do Nordeste. Em diversas vilas construiu casas de caridade, destinadas a moças pobres. Em cada lugar ele pregava, orientava, promovia reconciliações, construía açudes, igrejas, cemitérios, cacimbas e cruzeiros. Um destes cruzeiros foi erguido no sítio Brocotó e ficou conhecido como Santa Cruz, sendo esta a denominação na época do cangaço.

Região serrana de Santa Cruz da Baixa Verde, Pernambuco.
Região serrana de Santa Cruz da Baixa Verde, Pernambuco.

Com o passar do tempo, pelo fato da pequena urbe está no alto da Serra da Baixa Verde, o lugar passou a denominar-se Santa Cruz da Baixa Verde e pertencia administrativamente à bela cidade serrana de Triunfo.

Careta 

O pai do nosso entrevistado chamava-se Miguel Moura, tinha uma pequena bodega, além de trabalhar como tropeiro, ou almocreve. Tinha uma tropa de animais e fazia a linha entre as cidades de Triunfo, Serra Talhada e Arcoverde, na época denominada Rio Branco, trazendo e levando cereais. Antônio Ramos comentou que seu pai viajava para vários locais, transportando rapaduras. Inclusive o Rio Grande do Norte foi um dos seus destinos, onde esteve em Mossoró para comprar sal e também em Caicó.

O autor e o memorioso Antônio Ramos Moura.
O autor e o memorioso Antônio Ramos Moura.

Para nosso entrevistado Clementino Quelé, era chefe de sua família, tinha como irmãos Pedro, Quintino, Antônio, José e Manuel (nezinho), todos considerados homens dispostos, valentes e que “gostavam da espingarda”. Antônio Ramos comenta que na sua infância tinha um enorme respeito por aquele homem. Pouco falou com ele, mas obteve muitas informações sobre Quelé através de seu sogro Joaquim de Fonte, sobrinho do chefe da família Furtado.

Clementino é descrito como um homem forte, de tez acentuadamente branca, que realmente ficava com a pele vermelha quando tinha raiva e esta teria sido a razão de Lampião apelidá-lo pejorativamente como “Tamanduá Vermelho”.

praça principal da atual Santa Cruz da Baixa Verde, com a estátua do Padre Ibiapina em destaque.
praça principal da atual Santa Cruz da Baixa Verde, com a estátua do Padre Ibiapina em destaque.

Já para o pesquisador Frederico Pernambucano de Mello (in “Guerreiros do Sol”, 2004, págs. 220 a 225), Quelé era natural da ribeira do Navio, onde seguiu jovem para Alagoas, afastando-se de Pernambuco por questões de disputa familiar. No retorno a sua família vem para Triunfo, no sítio Santa Luzia. O antigo membro de volante João Gomes de Lira (in “Lampião-Memórias de um soldado de volante”, 1990, págs. 123 e 124) comenta ser a Santa Luzia a morada do bravo pernambucano.

Fachada da igreja de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, em santa Cruz da Baixa Verde.
Fachada da igreja de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, em santa Cruz da Baixa Verde.

Para Antônio Ramos, na época das grandes “brigadas” de Quelé contra Lampião, ele morava no sítio Conceição.

Independente desta questão consta para nosso entrevistado que Quelé e seus irmãos eram analfabetos “-De tudo”. Do tipo que “-Não assinavam nem o A” e nem faziam “-Garrancho” do nome. Dizia Quelé ao tio de Antônio Ramos que ele era “careta”, outra denominação para seu analfabetismo. Pois quando olhava para qualquer texto escrito, franzia a testa, mostrava o rosto carregado, com uma careta, por não saber ler.

Mas se Quelé e seus irmãos não sabiam ler, sabiam atirar e muito bem. 

De Homem da Lei a Cangaceiro 

Para Mello (op. cit.), o bravo Quelé alcançou o posto de subdelegado do seu lugar e impunha a ordem, mas igualmente angariava inimigos. O autor informa que em uma diligência Quelé matou dois ladrões de cavalo, respondeu processo e foi destituído do cargo. Em seu lugar assumiu seu irmão Pedro José Furtado, ou Pedro Quelé.

Em 1922, para livrar o valente chefe da família Furtado do processo, o líder político Aprígio Higino D’Assunção solicita deste e de seus irmãos votos na próxima campanha eleitoral em Triunfo. Diante da recusa de Quelé em apoiá-lo, Aprígio ordena que uma força policial com um oficial e quatorze praças saíssem à caça do valente.

Na tranquilidade do alpendre de sua casa, o sertanejo Antônio Ramos contou que um dia, certo morador do lugar chamado Tomé Guerra, antigo amigo de Quelé, arranjou uma encrenca com o mesmo e entendeu de matá-lo. Tomé chamou outro morador do lugar, também “chegado na espingarda”, de nome Cícero Fonseca. Estes, juntos com um grupo de policiais, colocaram uma tocaia contra Clementino ás cinco da manhã, “-Para pegá-lo com as mãos”.

O "major" Aprígio Higino D’Assunção,  que por três ocasiões foi prefeito em Triunfo e dono de cartório.
O “major” Aprígio Higino D’Assunção,
que por três ocasiões foi prefeito em Triunfo e dono de cartório. Foto reproduzida a partir do livro “Triumpho, a corte do sertão”, de Duana Rodrigues Lopes, pág. 234.

Quelé ao perceber o ardil, pulou desviando dos tiros e respondeu ao fogo, atingindo certeiramente a cabeça de Cícero Fonseca, tendo o mesmo caído mortalmente ferido em um barreiro. Os outros membros da emboscada “botaram” em Quelé, que conseguiu fugir para sua casa. Clementino teria escapado através de um local onde havia um curral que pertencia a um cidadão conhecido como Sebastião Pedreiro e por uma área onde existia certa quantidade de cactos do tipo palma, utilizados como comida para o gado.

De paletó claro vemos  Aprígio Higino.  Para o pesquisador Frederico Pernambucano de Mello ele foi o pivô que levou Clementino Quelé  a entrar no cangaço.  Foto reproduzida a partir do livro “Triumpho, a corte do sertão”, de Diana Rodrigues Lopes, pág. 373.
Aprígio Higino e parentes. Para o pesquisador Frederico Pernambucano de Mello ele foi o pivô que levou Clementino Quelé a entrar no cangaço.
Foto reproduzida a partir do livro “Triumpho, a corte do sertão”, de Diana Rodrigues Lopes, pág. 373.

Mello (op. cit.) aponta que um “certo Tomé de Souza Guerra”, do sítio Santana e outros homens engrossaram a força policial que perseguia Quelé. Mas Cícero Fonseca era um companheiro de Quelé, onde os dois bebiam na bodega de Sebastião Pedreiro, quando a polícia cercou o lugar e deu voz de prisão. Na versão do respeitado pesquisador, que conseguiu suas informações através do relato de Miguel Feitosa, o antigo cangaceiro Medalha, o pobre Cícero ao colocar o pé para fora da bodega foi crivado de balas.

Vendo que a força policial e os paisanos não vinham para prendê-lo, mas para exterminá-lo, Quelé solicita aos gritos o apoio de amigos das proximidades, estes atenderam ao chamado e a balaceira foi grande. Diante da resistência inesperada a força policial e os paisanos batem em retirada. 

Independente de qual a versão correta, todos são unânimes em afirmar que a partir deste confronto os perseguidores passam a “apertar” Quelé, sendo esta a verdadeira razão para ele e seus irmãos entrarem no cangaço junto a Lampião. 

A Briga de Quelé com o Cangaceiro Meia Noite 

O comerciante e almocreve Miguel Moura nutria uma boa relação com Clementino, a quem chamava de “primo”. Este comentou com seu filho que a razão de sua saída do bando de Lampião foi uma briga com o valente cangaceiro “Meia Noite”. 

Este era alagoano, do lugar Olho D’água, atual Olho D’água do Casado, próximo a cidade de Piranhas. Seu nome verdadeiro era Antônio Augusto Correia e pelo fato de possuir a pele negra, recebeu a famosa alcunha. Para o genitor de Antônio Ramos, o negro Meia Noite foi o mais valente de todos os homens que andaram com Lampião, do tipo de gente que “-Dava medo só de olhar”.Segundo Mello (op. cit.), a razão da briga entre Quelé e Meia Noite foram dois irmãos cangaceiros chamados José e Terto Barbosa. Este último havia assassinado no Ceará o irmão de um chefe cangaceiro, tendo se refugiado com seu mano na serra do Catolé, a cerca de 30 quilômetros da cidade pernambucana de Belmonte, próximo às fronteiras do Ceará e da Paraíba.

A região montanhosa de Santa Cruz da Baixa Verde, a partir da estrada que liga esta a cidade ao vizinho município de Manaíra,  já na Paraíba.
A região montanhosa de Santa Cruz da Baixa Verde, a partir da estrada que liga esta a cidade ao vizinho município de Manaíra, já na Paraíba.

Em uma ocasião que os cangaceiros de Lampião e Quelé se encontravam na fazenda Abóbora, pertencente ao tradicional coiteiro Marçal Diniz, chegou uma mensagem de José e Terto para seus tios Neco e Chico Barbosa, igualmente cangaceiros do bando de Lampião. O que os dois sobrinhos solicitavam aos tios era uma maneira de salvarem a pele.

Neco e Chico sabendo que o chefe cangaceiro cearense, conhecido como “Casa Velha”, cujo irmão foi morto por Terto, era amigo de Lampião, acharam por bem pedir a Clementino Quelé que recebesse os dois sobrinhos. O chefe dos Furtados,  junto com seus irmãos, se sobressaía cada vez mais no cangaço e não pôs obstáculo à entrada dos dois rapazes no seu grupo.

Quando Meia Noite soube da história se colocou totalmente contrário, pois foi amigo do homem morto por Terto Barbosa e disse que se ele viesse para o bando iria atirar nele. O resumo da ópera foi que após Quelé tomar conhecimento da alteração de Meia Noite, este se coloca ao lado de Terto. Quelé corajosamente disfere uma saraivada de impropérios contra Lampião, Meia-Noite e os outros cangaceiros. Segundo Mello (op. cit), Clementino teria dito textualmente “-Que juntassem tudo que ele brigava do mesmo jeito”.

O chefe dos Furtados percebeu que após este fato, ficar ao lado de Lampião e seu bando seria o mesmo que praticar um suicídio, pois o mais famoso cangaceiro do Brasil era conhecido pelo seu rancor.

A região de Santa Cruz da Baixa Verde, a partir da PE-365, que liga Triunfo a Serra Talhada.
A região de Santa Cruz da Baixa Verde, a partir da PE-365, que liga Triunfo a Serra Talhada.

Já nosso informante Antônio Ramos transmitiu uma versão diferenciada. Na ocasião destes episódios, o chefe dos Furtados estava junto com Lampião e seu bando em um esconderijo próximo a povoação de Patos, já na Paraíba, onde o problema ocorreu no momento em os tios de Terto trouxeram uma carta dos sobrinhos para Quelé e lhe contaram o problema. Quelé então teria solicitado que alguém lesse a dita mensagem em voz alta. Nisto o cangaceiro Meia Noite ouviu sobre o conteúdo da missiva e desconfiou que Quelé fosse colocar aqueles indivíduos como integrantes do bando.

Vista da Serra do Catolé, em Belmonte, Pernambuco.
Vista da Serra do Catolé, em Belmonte, Pernambuco.

Segundo o entrevistado, Meia Noite conhecia os “Barbosas”, contra quem já havia brigado, era inimigo dos mesmos, principalmente de Terto. O negro alagoano ficou cismado que Quelé, ao colocar aquela turma de valentes no bando, seria um meio para Terto, dos “Barbosas da Serra do Catolé”, dar fim a sua vida.

Quelé ao saber do fato negou. Disse a Meia Noite que “-Gostava de homem valente”, que os “Barbosas” eram pessoas que ele tinha “-Para onde botar”. Meia Noite comentou que sendo Terto seu inimigo, se por acaso ele trouxesse os “Barbosas” para perto do bando, “-Sabia que ia ser uma desgraça, que nóis briguemo e ficou para quando nóis se encontrar, a bala cortar”. Antônio Ramos narrou que Quelé ponderou, afirmando que “-Quando o homem é valente, que pede uma proteção, eu gosto de amparar”.

A discussão entre estes guerreiros foi gradativamente aumentando de tom, crescendo na ferocidade, até que os dois valentes partiram para a luta corporal. Lampião chamou seus homens rapidamente dizendo “-Acode, acode, se não estes homens se matam” e conseguiram apartar a briga. Para o entrevistado Lampião disse a Quelé “-Que deixasse o negro Meia Noite com ele, pois parecia que ele tinha saído do inferno” e pediu a Clementino e seus irmãos para irem para o sítio Conceição. 

Antônio Ramos relata que depois da discussão, Quelé aparentemente não se satisfez com o posicionamento de Lampião e reclamou. No entendimento do chefe dos Furtados, Lampião “-Teria dado mais valor a um negro do que a ele”. Sentindo-se rebaixado no seu racismo tardio, Quelé abandonou a vida do cangaço e ficou marcado por Virgulino.Outra informação ouvida por Antônio Ramos dá conta que no momento em que Clementino Quelé e seus parentes saíram da região dos Patos e do bando de Lampião, um dos seus parentes, filho de certa “Luzia Lalau” e um tal de Ricardo, pessoas de Santa Cruz, ficaram no bando de Lampião.

Os tiroteios de Lampião contra Quelé 

Seja através de uma, ou de outra versão, o certo é que tempos depois desta desavença no seio do bando, o chefe Lampião, apoiado pelo fazendeiro Marcolino Diniz, filho do coronel Marçal, vem para Santa Cruz com o objetivo de matar Clementino e seus irmãos. Este encontro ocorreu no dia 5 de janeiro de 1924, um sábado.

Segundo informações coletadas em Santa Cruz da Baixa Verde, esta casa reformada teria sido a fortaleza de Clementino Quelé. Entretanto este dado ficou inconclusiva devido a divergências em relações a outras informações que foram apuradas na região.
Segundo informações coletadas em Santa Cruz da Baixa Verde, esta casa reformada teria sido a fortaleza de Clementino Quelé. Entretanto este dado ficou inconclusivo devido a divergências em relações a outras informações que foram apuradas na região.

Antônio Ramos informa que era um “-Meninote de doze anos”, que a sua casa antiga era próxima a sua atual morada e seu pai possuía uma bodega pequena, mas bem surtida. 

Era ainda de madrugada, quase amanhecendo, quando o jovem Antônio Ramos acordou com o barulho de muitas vozes de homens no oitão da sua casa. Era um grupo numeroso de cangaceiros. O garoto notou que todos vinham alegres, animados, equipados, armados e com muita munição. Muitos deles estavam embalados por aguardente e segundo suas próprias palavras, os cangaceiros pareciam estar “-Com fogo saindo pelas orelhas”.Eles pediram tudo que seu pai tivesse de comida no estabelecimento, além de mais cachaça. Este prontamente passou a servir o bando, especialmente Lampião. Os homens armados não fizeram nada com seu pai ou sua família nesta ocasião.

Antônio assistiu Lampião comendo uma rapadura com queijo e comentando alegremente com a rapaziada sobre a futura luta. Ele se apresentava animado, doido para brigar. Neste momento pronunciou uma frase que Antônio Ramos jamais esqueceu.

“-Da família de Quelé, hoje só se salva quem avoa”.

O Rei do cangaço ainda afirmou que “

 Hoje eu vou beber o sangue de todo mundo”.

Nesta ocasião, durante o nosso encontro, o nonagenário entrevistado alterou-se, ficando visivelmente emocionado. Ele recordou que se tremeu todo, no momento que escutou estas frases do famoso bandoleiro. Comentou veementemente que viu Lampião falar exatamente da forma anteriormente descrita e narrou este fato agarrando fortemente o braço do autor, tal a emoção.

Outra imagem da casa onde pretensamente ocorreu a batalha.
Outra imagem da casa onde pretensamente ocorreu a batalha.

Ele descreveu Lampião como sendo moreno, alto, rosto comprido, cego de um olho, não usava óculos naquele dia e que mesmo assim enxergava bem. Pouco tempo depois o bando saiu da bodega. 

A desproporção da luta que se avizinhava era enorme, pois Quelé tinha junto com ele apenas outros cinco companheiros para lhe ajudar. Para Antônio Ramos os cangaceiros seriam em torno de “-Uns cinquenta homens”. Já Carvalho (op. cit.) afirma que seriam quarenta e cinco.O pesquisador Geraldo Ferraz de Sá Torres Filho (in “Pernambuco no tempo do Cangaço-Volume I”, 2002, págs. 328 a 330) reproduz o “Boletim Geral nº 05”, emitido pela polícia pernambucana no dia 7 de janeiro de 1924, onde consta que o número de cangaceiros era de sessenta homens. 

Mas para os familiares de Antônio Ramos, naquele momento o que importava era buscar de alguma maneira se proteger dentro de casa diante do que iria acontecer e em pouco tempo “-A bala comeu”. Ele e seus familiares ficaram escutando o tiroteio, mas não lembra a duração, só comentou que “-Demorou muito”.

Falou que “-Quando deu fé”, chegou a sua casa um rapaz da família de Quelé com cerca de 16 anos, dizendo que estava dentro de um partido de mandioca quando os cabras chegaram e comentou que “-A bala tava cortando tudo”. Narrou que o rapazinho tinha escutado os gritos dos cangaceiros prometerem: “-Derrubar a casa” e o pessoal da casa avisando aos gritos para os atacantes que 

“- Se derrubar e entrar um, nóis mata na faca”.

A testemunha da batalha de 5 de janeiro de 1924 afirmou que este rapaz avisou que iria a Triunfo buscar uma volante. Nesta cidade o delegado era o tenente Malta e havia uma volante comandada pelo sargento Higino José Belarmino.

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Edição do jornal recifense “A Notícia”, de 14 de janeiro de 1924, existente na hemeroteca do Arquivo Público do Estado de Pernambuco, informando erroneamente sobre a ação da polícia, durante o segundo ataque de Lampião contra Quelé.
Edição do jornal recifense “A Notícia”, de 14 de janeiro de 1924, existente na hemeroteca do Arquivo Público do Estado de Pernambuco, informando erroneamente sobre a ação da polícia, durante o segundo ataque de Lampião contra Quelé.

O jovem disse que seguiria através de um caminho alternativo, evitando a vereda que levava normalmente para esta cidade, pois com certeza os cangaceiros deviam ter “-Botado uma emboscada aculá na frente”. O jovem deixou a casa de Ramos, seguindo em direção a serra dos Nogueiras, saindo no lugar chamado Gameleira e de lá para Triunfo.

Entretanto, para nosso entrevistado, a polícia ficou “insonando”. No seu linguajar típico, onde Antônio Ramos utilizava expressões difíceis de serem ouvidas atualmente no sertão nordestino, ele quis dizer que os homens da lei ficaram enrolando e só foram chegar a Santa Cruz por volta das 11 horas da manhã.

Esta volante levou várias horas para percorrer os seis quilômetros entre as duas localidades. Provavelmente para os policiais, a ocorrência em Santa Cruz era um problema entre bandidos e quanto mais deles se matassem entre si, melhor. Mas diante da resistência feroz realizada por Clementino e seus companheiros, a polícia se deslocou para evitar a pecha de conivência e covardia.

Apesar da evidente falta de vontade dos policiais de irem a lutar, ficamos imaginando o conflito dentro da própria volante, entre aqueles que queriam ir e dos que não queriam, pois certamente nem todos eram covardes e honravam a farda que vestiam.

Enquanto isso a família de Quelé, literalmente “comia chumbo” e o tiroteio não dava mostras de diminuir. A casa sofria diante da quantidade de tiros, em mais de seis horas de batalha ininterruptas. Antônio Ramos e seus familiares, até por razões bastante óbvias, não viram nada da refrega, apenas escutaram assustados a troca de disparos.

Nosso entrevistado comentou que nesta época morava na sua casa um primo chamado Augusto e foi este quem primeiro ouviu um tiro de fuzil. Esta arma possuía um som característico e bem diferente dos rifles Winchester, de calibre 44, ainda bastante utilizados pelos cangaceiros e pelo pessoal de Quelé. O som lhe chamou a atenção e mostrava que a polícia estava chegando, vindo pelo caminho que seguia para a pequena Santa Cruz, que nessa época era um simples arruado “-Com no máximo quatro casas”.

Aparentemente a Força Policial começou a atirar com seus fuzis muito antes de chegar ao local do confronto, esperando que assim os cangaceiros debandassem. Mas segundo o nosso informante, foi nesse momento que o tiroteio ficou ainda mais forte, “-Com a fumaça cobrindo tudo” e as balas “-Zunindo por riba de casa”, o que deixou os membros da sua família extremamente assustados. Podemos deduzir através de suas informações que, de alguma maneira, a sua casa ficou entre o fogo cruzado.

O aposentado coronel Higino José Belarmino,  em foto de Josenildo Tenório, de 1973.  Reprodução feita a partir da página 50 do livro “Lampião, o cangaceiro e o outro”, de Fernando Portela e Claudio Bojunga, edição 1982.
O aposentado coronel Higino José Belarmino,
em foto de Josenildo Tenório, de 1973.
Reprodução feita a partir da página 50 do livro “Lampião, o cangaceiro e o outro”,
de Fernando Portela e Claudio Bojunga, edição 1982.

Segundo Ferraz (op. cit.), no “Boletim Geral nº 05” encontramos a informação que o tiroteio morreu o irmão Pedro Quelé e Alexandre Cruz, ficando ferido Deposiano Alves Feitosa. Antônio Ramos narra que seu pai considerava Pedro Quelé como um homem valente. Na região ficou conhecido o fato que quando acabou a sua munição, este pediu garantias para sair, mas ao colocar a cabeça para fora da janela, foi impiedosamente morto.

Depois de toda uma batalha tenaz onde não tivera êxito, Virgulino Ferreira da Silva não refreou sua vontade de acabar com o atrevido Clementino Quelé.Ferraz (op. cit.) mostra que no “Boletim Geral nº 07”, da polícia pernambucana, emitido no dia 9 de janeiro de 1924, reproduz um bilhete do tenente Malta informando “Acha-se grupo de Lampião proximidade de Santa Cruz”. O militar ainda comentou na missiva que contava com “89 praças” para defender Triunfo e região.

Mesmo com esta força nas proximidades, seis dias depois, no dia 11 de janeiro, uma sexta-feira, Lampião e seus homens voltaram para aplicar uma segunda dose de chumbo em Quelé e seus companheiros.

Santa Cruz da Baixa Verde em 1951, durante uma visita de Frei Damião.
Santa Cruz da Baixa Verde em 1951, durante uma visita de Frei Damião.

Antônio Ramos recordou muito bem que em relação a este combate, percebeu que o sol já vinha saindo quando o tiroteio teve início e novamente a história se repetiu. De um lado os cangaceiros sedentos de sangue e do outro um pequeno grupo de homens se defendendo como podiam.

Segundo Lira (op. cit.), Lampião despejava todo tipo de impropérios e palavrões conhecidos contra o destemido Quelé e seu pessoal. Mas os sitiados respondiam, cantavam e assim irritavam o chefe dos cangaceiros.

Mesmo com uma força policial numerosa em Triunfo, novamente os agentes de segurança do Estado levaram outras seis longas horas para chegarem a Santa Cruz, repetindo-se o que ocorreu no domingo anterior. De toda maneira Clementino só conseguiu se safar pela chegada do destacamento policial baseado em Triunfo.
Para Antônio Ramos, consta que Quelé tinha um parente de nome José, apelidado “José Caixa de Fósforo”, que parece ter estado nos dois tiroteios.

Apesar do antigo cangaceiro de Lampião sair vivo nestes combates, a família Furtado foi praticamente exterminada. Segundo Mello (op. cit.), tanto neste, como em combates futuros, morreram três irmãos, dois genros e um sobrinho. Além destes seis parentes, segundo o pesquisador, mais cinco amigos do valente Quelé pagaram com a vida e inúmeros outras pessoas ligadas a Clementino ficaram feridos.

Casa antiga da região de Santa Cruz da Baixa Verde.
Casa antiga da região de Santa Cruz da Baixa Verde.

Em relação aos confrontos de janeiro de 1924, Antônio Ramos contou que uma das casas que foi palco dos dramas ainda existia e que na época era considerado um sítio afastado da então vila. Tentamos localizar o local. Chegamos a fotografar uma residência antiga, mas reformada. Entretanto houve divergências com outros informantes, que comentaram ter sido as casas da família de Quelé derrubadas há muito tempo. 

Independente da residência correta onde aconteceram os tiroteios, fomos informados por pessoas da região, nascidas anos após os episódios, que seus parentes mais velhos narravam que quando estes seguiam para capinar nas proximidades das antigas vivendas, a coisa mais comum era encontrar capsulas deflagrada de rifles e fuzis. 

O Vingador do Sertão 

Depois dos tiroteios, Quelé ficou meio perdido pela região, sendo protegido por Higino Berlarmino. Para Antônio Ramos, foi o coronel José Pereira, o chefe político da vizinha cidade paraibana de Princesa, que deu o apoio decisivo para Quelé se tornar um implacável caçador de Lampião.

Sentado vemos Marcolino Diniz e seus comandados durante a Guerra de Princesa.
Sentado vemos Marcolino Diniz e seus comandados durante a Guerra de Princesa.

Após o grande assalto de cangaceiros ocorrido na cidade de Sousa, em 27 de julho de 1924, Pereira exigiu que seu parente Marcolino Diniz não desse mais apoio a Lampião e o expulsasse da região dos Patos. Por indicação de alguém que Antônio Ramos não recorda, foi sugerido ao “dono” de Princesa o nome de Quelé, para que este servisse no comando de uma volante em perseguição a Lampião. A solicitação foi feita ao então governador paraibano João Suassuna e Clementino Furtado passa a ser conhecido como o Sargento Quelé. (Sobre um episódio envolvendo o Sargento Quelé na Guerra de Princesa ver – https://tokdehistoria.wordpress.com/2011/06/07/a-batalha-do-casarao-dos-patos/)

Sua volante, a famosa “Coluna Pente Fino”, ficou marcada na história do cangaço pela selvageria como combatia os cangaceiros e infligia o terror aos coiteiros. Muitos parentes fizeram parte do grupo. Se não faltam relatos de valentia do seu pessoal, infelizmente não faltam informações que inúmeros inocentes sofreram nas mãos dos homens de Quelé, além de inúmeros atos de pura rapinagem.

De toda maneira o “investimento” do governo da Paraíba em Quelé não foi em vão. Três anos e meio depois dos combates em Santa Cruz, no dia 14 de junho de 1927, ele e seus homens serão a primeira força policial a adentrar em Mossoró, após a fracassada tentativa de Lampião para conquistar a maior cidade do interior potiguar. Nesta ocasião consta que no currículo de combates de Quelé contra o Rei do cangaço, estavam listados vinte e um tiroteios.

Para Antônio Ramos, mesmo com toda coragem e capacidade para caçar cangaceiros, foi o analfabetismo de Quelé que deixou que ele permanecesse nas fileiras da polícia da Paraíba apenas com a graduação de sargento.

Provável túmulo do Sargento Clementino Quelé, na cidade da Prata, Paraíba.
Provável túmulo do Sargento Clementino Quelé, na cidade da Prata, Paraíba.

Quelé morreu já idoso na Paraíba, na cidade de Prata, próximo ao município de Monteiro. Segundo Antônio Ramos, ele sempre vinha visitar o sítio Conceição e a pequena Santa Cruz. (Ver – https://tokdehistoria.wordpress.com/2011/08/22/o-descanso-de-um-guerreiro-nordestino-no-riacho-da-prata/)

As histórias das lutas entre Clementino Quelé e Lampião se tornariam verdadeiras lendas no imaginário dos nordestinos. Aparentemente um destes que se encantou com as lutas de Quelé foi Luiz Gonzaga, o “Rei do Baião”. Em parceria com José Marcolino, o sanfoneiro de Exu compôs a música “No Piancó”, onde em um trecho diz;

“Lá viveu o Clementino / Que brigou com Lampião.”

Não posso garantir que o Clementino descrito na música do grande artista pernambucano, seja o mesmo homem que perseguiu implacavelmente Lampião.

Mas houve outro?

A morte do pai de Antônio Ramos

Um dia, em 1926, segundo o entrevistado, o terrível chefe bandoleiro Sabino, acompanhados dos cangaceiros Juriti, Ricardo e outros, vieram de um lugar próximo chamado Lagoa do Almeida, da família dos Marianos e seguiram para a casa do senhor Manuel da Cruz. Este era um fazendeiro, tendo sido comentado aos cangaceiros ser um homem que possuía muito dinheiro Como este não foi encontrado, os cangaceiros continuaram seguindo em direção a pequena povoação de Santa Cruz.

Sabino fotografado montado em 1927, na cidade cearense de Limoeiro do Norte,  logo após o fracassado ataque a Mossoró.
Sabino fotografado montado em 1927, na cidade cearense de Limoeiro do Norte,
logo após o fracassado ataque a Mossoró.

No caminho passaram adiante da casa de Miguel Moura. Como um dos cangaceiros era afilhado de batismo da mãe do entrevistado, por força do parentesco, pediu a Sabino, Juriti e Ricardo, que fossem na casa do sítio Conceição, ver se “arranjavam alguma coisa” com sua madrinha, que ele ficaria de fora.

A chegarem ao pequeno comércio, Sabino e os outros entram e passam a torturar Miguel Moura a ponta do punhal, para o mesmo dar conta do dinheiro que conseguia com o transporte nos burros. Na casa do pai do entrevistado se encontrava uma empregada da vizinha Isabel Correia, conhecida como Zabê e esta senhora foi a vivenda do entrevistado para moer milho. Os cangaceiros quiseram lhe arrebatar uma aliança, mas ela conseguiu tirar a joia do dedo e colocou-a na boca. Os cangaceiros exigiram o objeto de valor e a mesma recusou-se a entregar. Os bandidos passam a ação, tentando forçar a mulher a entregar a aliança e começa uma luta. A empregada lutou tão bravamente que teria quebrado o nariz do seu atacante. O próprio Sabino mandou soltá-la, tendo dito que “-Esta é uma desgraça que nem o diabo pode”. A mulher foi embora correndo com a aliança.Na casa da vizinha Zabê, que possuía certa quantidade de ouro, eles chegaram e arrastaram o que puderam, mandando inclusive a mulher tirar os brincos ou “-Cortariam com o pedaço da orelha”. O marido da mesma, Manuel Correia, foi chegando a casa e os cangaceiros o renderam com pistolas, que colocaram no pescoço do mesmo.

Para o pai do entrevistado a sorte não foi tão boa. Disseram que ele era rico, mas Miguel Moura comentou que gastava muito na propriedade. Daí Sabino ordenou que em oito dias ele conseguisse um conto de réis, sob pena de morrer.

O pai do entrevistado sofria do coração e diante de toda a tensão provocada pelas ameaças, veio a ter um ataque cardíaco. Sem assistência médica, que era muito difícil na época, morreu nove dias depois da “visita” dos cangaceiros.

Depois destes fatos, o nosso entrevistado e a família foram para Triunfo, onde perderam a roça e tiveram muitos prejuízos. Seguiram depois ao Juazeiro, para uma entrevista com o Padre Cícero, que os aconselhou a não voltar logo para casa.

Este fato foi testemunhado pela irmã de Antônio Ramos, criança a época, que se encontrava brincando defronte a casa no momento da passagem dos cangaceiros, tendo ela visto e escutado tudo.

Se para alguns, Sabino é apontado como “revolucionário”, para Antônio Ramos, ele é tão somente um arrogante bandido, cruel ladrão e frio assassino.

Me foi informado que esta antiga edificação amarela teria sido a casa comercial da família Campos em Triunfo, atacada por Sabino em 1926.
Me foi informado que esta antiga edificação amarela teria sido a casa comercial da família Campos em Triunfo, atacada por Sabino em 1926.

No dia 7 de julho de 1926, Sabino e seu grupo foram a Triunfo para assaltar a cidade. O bando fez muita bagunça, atacando a loja de tecidos de Antônio de Campos, o maior comerciante da cidade. Os cangaceiros levaram até um machado para furar o cofre, mas não conseguiram, passando a tocar fogo n estabelecimento. Segundo Ramos, na ocasião se encontravam na cidade dois soldados, de nome José Sabiá e José Piauí, que foram atacados pelo bando. O inusitado foi que Sabiá morreu com apenas um tiro e o Piauí, mesmo levando sete tiros, escapou com vida.

Início da extensa reportagem divulgada no jornal recifense “A Província”,  edição do dia 10 de julho de 1926, dando conta do ataque de Sabino a Triunfo.
Início da extensa reportagem divulgada no jornal recifense “A Província”,
edição do dia 10 de julho de 1926, dando conta do ataque de Sabino a Triunfo.

Para Lira (op. cit. pág.401) Sabino e seus homens entraram na cidade serrana quando se encontravam apenas quatro militares para protegê-la e corrobora a afirmação de Antônio Ramos quando escreve que “o soldado que foi morto tinha o apelido de Sabiá”.

A última vez que Antônio Ramos viu Lampião e seu bando

Depois que o nosso informante e sua família voltaram à antiga casa do sítio Conceição, eles procuraram seguir a vida. Mesmo diante da situação, o jovem Antônio Ramos não deixou de estudar. Em um dia de 1927, estava ele por volta das onze da manhã em uma escola nas proximidades de Triunfo, junto com um professor nascido na cidade de Floresta, quando chegou um grupo de cavalarianos armados e equipados. A princípio o mestre pensou que fossem policiais, mas o entrevistado comentou com segurança que “-Aquele ali é Lampião, eu conheço”. Segundo ele eram em torno de “-130 cangaceiros”, todos equipados, com chapéu de couro quebrado, cheio de medalhas, fuzis, cada um levando dois bornais e cartucheiras. Antônio Ramos ficou se perguntando como eles lutavam com tanto equipamento.

Antônio Ramos
Antônio Ramos

Entre os cangaceiros, nosso entrevistado conhecia um deles. Chamava-se Isaías Vieira, e era de um lugar conhecido como Xique-Xique. Havia sido ladrão de bodes, que após ser preso apanhou muito e havia entrado no cangaço por vingança.

Nesta ocasião todos os cangaceiros estavam a cavalo, pegando animais descansados e deixando os que estavam viajando. Comentou que apenas às seis da noite, uma volante da polícia de Alagoas passou na região seguindo o bando. Este grupo era comandado por um militar conhecido como “tenente Arlindo”. A ocasião desta visita foi próximo ao mesmo período em que ocorreu o ataque a Mossoró.

Cruz em Santa Cruz da Baixa Verde, que mostra um local onde alguém morreu de "morte matada".
Cruz em Santa Cruz da Baixa Verde, que mostra um local onde alguém morreu de “morte matada”.

A bibliografia mostra o quanto aparentemente nosso informante estava certo, mesmo com algumas pequenas alterações. O Pesquisador José Alves Sobrinho, da cidade de Serra Talhada, em Pernambuco (in “Lampião e Zé Saturnino-16 anos de luta”, 2006, pág. 112), comenta que na mesma época que Lampião seguia para Mossoró, passou na zona rural de Vila Bela, a antiga denominação do município de Serra Talhada, na fazenda Barreiras, de propriedade de Martins Venâncio Nogueira, conhecido como Martins da Barreira. Segundo o autor, o proprietário da fazenda Barreira conversou longamente com Lampião naquele dia e afirmou que junto ao chefe estavam “118 cangaceiros”. 

Segundo Lira (op. cit pág. 379.) comenta que em fins do mês abril de 1927, este grande grupo de cangaceiros estava sendo realmente sendo seguido por uma força volante comandada pelo militar Arlindo Rocha, que salvo engano seria da polícia pernambucana e possuía a patente de sargento. 

Antônio Ramos informou que nunca leu um livro sobre cangaço, que conta por que sabe e viu. Os fatos envolvendo Lampião e o cangaço era informação corrente na região. Tudo era narrado de boca em boca, nas feiras, nas ruas. Detalhes sobre a intriga dos Ferreiras com os Saturninos de Vila Bela, a história do chocalho, as brigadas e tudo mais que levou Lampião a entrar no cangaço, era muito repetido. Apenas em uma ocasião Antônio Ramos viu uma revista com a foto das cabeças cortadas em Piranhas, Alagoas, após o ataque que deu cabo de Lampião e acha que era ele mesmo.

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FAZENDA ABÓBORA – UM IMPORTANTE LOCAL PARA HISTÓRIA DO CANGAÇO E DO NORDESTE

Autor – Rostand Medeiros

Desde que comecei a ler temas relacionados ao ciclo do cangaço, a sua figura maior, Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, e a história do Nordeste no início do século XX, um local em especial me chamava atenção pelas repetidas referências existentes em inúmeros livros. Comento sobre uma antiga propriedade denominada Abóbora, localizada na zona rural do município de Serra Talhada, próximo a fronteira com a Paraíba e não muito distante das cidades pernambucanas de Santa Cruz da Baixa Verde e Triunfo.

A cidade de Triunfo a Noite

Vamos conhecer um pouco de sua história e da visita que realizei a este local.

Uma Rica Propriedade

Quem segue pela sinuosa rodovia estadual PE-365, que liga as cidades de Serra Talhada a Triunfo, antes de subir em direção a povoação de Jatiúca e as sedes dos municípios de Santa Cruz da Baixa Verde e Triunfo, percebe que está em um vale cercado de altas serras, que dão uma beleza singular a região. Atrás de uma destas elevações se encontra a Fazenda Abóbora.

Até hoje esta fazenda chama atenção pelas suas dimensões. Segundo relatos na região, suas terras fazem parte das áreas territoriais de três municípios pernambucanos. Aparentemente no passado a área era muito maior. Ali eram criados grandes quantidades de cabeças de gado, havia vastas plantações de algodão, engenho de rapadura e se produziam muitas outras coisas que geravam recursos. No lugar existem dois riachos, denominados Abóbora e da Lage, que abastecem de forma positiva a gleba. [1]

Com tais dimensões, circulação de riquezas, no passado o lugar era ponto de parada de muitos que faziam negócios na região e transportavam mercadorias em lombo de animais, os antigos almocreves. No lugar estes transportadores do passado eram recebidos pelo “coroné” Marçal Florentino Diniz, que junto com irmão Manoel, dividiam o mando na propriedade.

Documento que aponta os proprietários da Fazenda Abóbora na década de 1920

Informações apontam que Virgulino Ferreira da Silva, quando ainda trabalhava como almocreve, realizou junto com seu pai e os irmãos vários transportes de mercadorias entre as regiões de Vila Bela (sua cidade natal, atual Serra Talhada) e Triunfo.[2]

Sentado vemos Marcolino Diniz e seus "cabras"

Certamente em alguma ocasião, o jovem almocreve teve a oportunidade de conhecer a fazenda do “coroné” Marçal e de seu irmão Manoel. Além destes o almocreve da família Ferreira conheceu o impetuoso filho do fazendeiro Marçal, Marcolino Pereira Diniz.[3]

Uma ótima Relação

Chefe de bando inteligente e perspicaz, Lampião buscava antes do confronto, o apoio e as parcerias com os antigos proprietários rurais e assim agiu junto aos donos da Fazenda Abóbora.

Lampião

Após assumir a chefia efetiva de seu bando, depois da partida do seu antigo chefe, o mítico cangaceiro Sinhô Pereira, Lampião frequentou em várias ocasiões as terras da Abóbora, onde o respeito do chefe e dos seus cangaceiros pelo lugar estava em primeiro lugar.

Rodrigues de Carvalho, autor do livro “Serrote Preto” (1974), informa nas páginas 252 a 254 que ocorreu uma intensa e positiva relação de amizade entre Lampião e a família Diniz principalmente com o “jovem e pretensioso doutor” Marcolino Diniz, que chegou há cursar durante algum tempo a Faculdade de Direito em Recife, mas não concluiu.[4]

Esta relação ambígua de amizade entre estes ricos membros da elite agrária da região e o facínora Lampião foi posta a prova em duas ocasiões.

Antiga Cadeia Pública de Triunfo, em breve um novo centro cultural

A primeira no dia 30 de dezembro de 1923, quando Marcolino Diniz é preso pelo assassinato do juiz de Direito Ulisses Wanderley em um clube de Triunfo. Marçal solicita apoio de Lampião para tirar Marcolino da cadeia, se necessário a força. Juntos vão acompanhados de um grupo que gira em torno de 80 a 100 cangaceiros armados. Não Houve reação dos carcereiros.

A segunda ocorreu no mês de março do ano seguinte. Após o episódio do ferimento do pé de Lampião na Lagoa Vieira e o posterior ataque policial na Serra das Panelas, onde o ferimento de Lampião voltou a abrir e quase gangrenar, é a família Diniz que parte em socorro do cangaceiro. Marçal e Marcolino cederam apoio logístico para a sua proteção, transporte, medicamentos e plena recuperação com o acompanhamento dos médicos José Lúcio Cordeiro de Lima, de Triunfo e Severino Diniz, da cidade paraibana de Princesa. Sem este decisivo apoio, certamente seria o fim do “Rei do Cangaço”.[5]

Lagoa Vieira-Foto-Alex Gomes

Foi igualmente na propriedade Abóbora que Lampião conheceu Sabino Gomes de Gois, também conhecido como “Sabino das Abóboras”.[6]

Frederico Pernambucano de Mello, autor do livro “Guerreiros do Sol-Violência e banditismo no Nordeste do Brasil” (2004), nas páginas 243 a 246, informa que Sabino efetivamente nasceu na Fazenda Abóbora, sendo filho da união não oficial entre Marçal e uma cozinheira da propriedade. Consta que ele trabalhou primeiramente como tangedor de gado, o que certamente lhe valeu um bom conhecimento geográfico da região.

Sabino

Valente, Sabino foi designado comissário (uma espécie de representante da lei) na região da propriedade Abóbora, certamente com a anuência e apoio do pai. Organizava bailes e em um destes envolveu-se em um conflito, tendo de seguir para o município paraibano de Princesa. [7]

Depois, entre 1921 e 1922, acompanhou seu meio irmão Marcolino para Cajazeiras, no extremo oeste da Paraíba. Marcolino Diniz desfrutava nesta cidade de muito prestígio. Era presidente de clube social, dono de casa comercial, de jornal e tinha franca convivência com a elite local. Sabino por sua vez era guarda costas de Marcolino e andava ostensivamente armado. Nesta época Sabino passou a realizar nas horas vagas, com um pequeno grupo de homens, pilhagens nas propriedades da região.

Outra imagem de Lampião

O autor de “Guerreiros do Sol” informa que teria sido Sabino que coordenou a vinda do debilitado Lampião para ser tratado pelos médicos José Lúcio Cordeiro de Lima e Severino Diniz. A amizade entre o “Rei do Cangaço” e o filho bastardo de Maçal Diniz, nascida na Fazenda Abóbora, teria então se consolidado a ponto deste último se juntar a Lampião e seu bando, em uma posição de destaque, no famoso ataque de cinco dias ao Rio Grande do Norte, ocorrido em junho de 1927.

Outros Episódios do Ciclo do Cangaço na Fazenda Abóbora

Pelos muitos autores que se debruçaram sobre o tema cangaço e pelos relatos da região está mais que provado a franca convivência entre os membros da família Diniz e os cangaceiros no seu verdadeiro feudo na Abóbora.

Oficiais de forças volantes que perseguiram Lampião e outros cangaceiros ao longo da história

Mas no meio desta história, onde estava o aparato de segurança do estado?

Segundo informações colhidas pelo autor deste artigo, que esteve na região em várias ocasiões, a polícia frequentava a Fazenda Abóbora, mas o poder dos Diniz era tal, que os homens da lei tinham que avisar com antecedência que iriam lá.

Daí, no caso de cangaceiros estarem acoitados na grande gleba, estes eram informados por Marçal, Marcolino ou alguém de confiança, e seguiam tranquilamente para coitos nas Serras Comprida, da Pintada, ou da Bernarda, ou nas propriedades denominadas Xiquexique, Pau Branco, Areias do pelo Sinal e outras.

Essa verdadeira promiscuidade praticamente só vai ter um fim diante da extrema repercussão do ataque dos cangaceiros a cidade de Sousa, na Paraíba. Ocorrido na noite de 27 de julho de 1924, o fato logo ganha destaque nas páginas de vários jornais e assusta as autoridades nas capitais da Paraíba e de Pernambuco. Em pouco tempo os líderes sertanejos são instados a negarem a proteção dada aos bandos de cangaceiros. [8]

Theophanes Ferraz Torres

Tanto assim que três dias após o assalto a Sousa, ao meio dia, uma força volante sob o comando do major Theophanes Ferraz Torres, trava um combate contra um grupo de cangaceiros comandados por Sabino, que foge sem dar prosseguimento à luta. Certamente Sabino tentava chegar ao seu conhecido “lar” e teve esta desagradável surpresa. [9]

Ao longo do mês de agosto de 1924 vários combates serão travados na região. Tiroteios nos lugares Areias do Pelo Sinal, Serra do Pau Ferrado, Tataíra e outros vão marcar a história de luta contra os cangaceiros. Não havia propriedade que não pudesse ser adentrada e varejada pela polícia.

Mas não seria o fim da presença de cangaceiros no local.

"Diário de Pernambuco", 4 de agosto de 1926

Em uma pequena nota existente na página quatro do jornal “Diário de Pernambuco”, edição de quarta feira, 4 de agosto de 1926,  encontramos a informação que por volta das três horas da tarde do dia 30 de julho, na área da Fazenda Abóbora, foram mortos pela polícia pernambucana e paisanos, depois de demorado tiroteio, os cangaceiros Juriti e Vicente da Penha.

Juriti era erroneamente apontado pelo jornal como sendo o comandante de um ataque ocorrido no dia 7 daquele mesmo mês, a uma casa comercial em Triunfo. No caso o comandante da ação foi Sabino.

O “Coito” do Coronel José Pereira

Com o declínio da ação de cangaceiros na região de Triunfo, discretamente a Fazenda Abóbora deixa de ser local de combates, mas não deixaria de servir como um ótimo esconderijo.

O Coronel José Pereira

Em 1930, eclodiu um grave conflito armado na vizinha Paraíba, mais precisamente no município de Princesa.

Entre as origens deste sério problema, estavam as divergências entre o governador eleito da Paraíba em 1927, João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, e os coronéis monopolizadores da economia e política do interior do estado.

João Pessoa

João Pessoa discordava da forma como este grupo político, que o elegera, conduzia a política paraibana. Entre estes poderosos era valorizado o grande latifúndio de terras do interior, possuidores de grandes riquezas baseadas no cultivo de algodão e na pecuária.

Casarão de onde José Pereira comandava suas forças no conflito de Princesa

Estes fazendeiros, como vimos no exemplo de Marçal Diniz, atuavam através de uma estrutura política arcaica, que se valia entre outras coisas do mandonismo, da utilização de grupos de jagunços armados, da conivência com cangaceiros e outras ações as quais o novo governo não concordava.

Um dos pontos mais fortes da discórdia era cobrança de taxas de exportação do algodão. Os ditos coronéis paraibanos exportavam a produção desta malvácia pelo porto do Recife, causando perdas tributárias para o estado da Paraíba. O governador estabelece diversos postos de fiscalização nas fronteiras do Estado. Por esse motivo os coronéis do interior passaram a apelidar João Pessoa de “João Cancela”.

José Pereira (em destaque) e seu estado maior durante a chamada Guerra de Princesa

O fazendeiro e líder político José Pereira Lima, mais conhecido como “Coronel Zé Pereira”, da cidade de Princesa, era o mais poderoso entre todas as lideranças do latifúndio na sua região. Para muitos ele é descrito como verdadeiro imperador do oeste da Paraíba, na área da fronteira com o estado de Pernambuco. Zé Pereira contava com o apoio dos governadores de Pernambuco e do Rio Grande do Norte, respectivamente Estácio de Albuquerque Coimbra e Juvenal Lamartine de Faria.

Diante do impasse com o governador João Pessoa, Pereira declarou Princesa “Território Livre”, separando-o do estado da Paraíba, tornando-o absolutamente autônomo.

Combatentes durante o conflito-Fonte - http://rotamogiana.blogspot.com

A reação do governo estadual foi pesada e uma verdadeira guerra começou. Princesa se tornou uma fortaleza inexpugnável, resistindo palmo a palmo ao assédio das milícias leais ao governador João Pessoa. O exército particular do Coronel José Pereira era estimado em mais de 1.800 combatentes, onde diversos lutadores eram egressos das hostes do cangaço e muitos eram desertores da própria polícia paraibana.

Combatentes da Guerra de Princesa-Fonte - http://rotamogiana.blogspot.com

A força do governador João Pessoa possuia cerca de 890 homens, organizados em colunas volantes. Essas colunas eram chefiadas pelo coronel comandante da Polícia Militar da Paraíba, Elísio Sobreira, pelo Delegado Geral do Estado, o Dr. Severino Procópio e José Américo de Almeida (Secretário de Interior e Justiça).

Marçal Florentino Diniz e Marcolino, ligados por parentesco com José Pereira, se juntam a luta na região. Houve muitos episódios sangrentos na conhecida Guerra ou Sedição de Princesa.

João Pessoa assassinado. Estopim da Revolução de 30

Após a morte do governador João Pessoa, ocorrida em Recife, houve a consequente eclosão da Revolução de 30 e o conflito em Princesa acabou. Durante os quatro meses e vinte e oito dias que durou sua resistência, Princesa não foi conquistada pela polícia paraibana. Após a eclosão da Revolução, as tropas do Exército Brasileiro, de forma tranquila, ocuparam a cidade.

Para muitos pesquisadores José Pereira Lima organizou de tal maneira a defesa dos seus domínios, que provocou baixas estrondosas à força pública paraibana.

Diante da derrota, José Pereira e muitos dos que lutaram com ele fugiram da região. A família Diniz se retraiu diante do novo sistema governamental imposto e a fortuna de Marçal e Marcolino ficou seriamente comprometida.

O tempo dos caudilhos do sertão estava chegando ao fim, pelo menos naquele formato utilizado por Marçal Diniz e José Pereira.

José Pereira deixa Princesa no dia 5 de outubro de 1930 e fica escondido em propriedades de pessoas amigas, em diversas localidades existentes em outros estados. Segundo o Sr. Antônio Antas, depois de percorrer vários locais, segundo lhe informou o próprio Marcolino Diniz, José Pereira passou muito tempo escondido na Fazenda Abóbora, até que em 1934 o novo regime lhe concedeu anistia e ele decidiu permanecer em território pernambucano.

Antônio Antas, conviveu quando jovem com Marcolino Diniz, seu parente. Este é um grande amigo que tenho na região e memória viva da história local

Mas segundo o Sr. Antônio Antas, a situação na Fazenda Abóbora não foi fácil. Um ano depois da anistia, por ordens de Agamenon Magalhães, então Interventor Federal em Pernambuco, a polícia estadual cerca a Fazenda Abóbora. José Pereira escapa, volta a Princesa e recebe garantias dos líderes estaduais paraibanos.

Visitando a Fazenda Abóbora

Em recente ocasião estive na cidade de Triunfo, onde mantive contato com Lucivaldo Ferreira e André Vasconcelos. Há tempos que mantemos parcerias entre o nosso blog “Tok de História” e o ótimo blog que eles comandam, chamado “Boom! Triunfo”.

A principal igreja católica de Triunfo e a névoa da época de inverno na serra

Tive oportunidade de travar contato com ambos, onde pude entregar-lhes meu último livro “João Rufino-Um Visionário de Fé” e conversar muito sobre cangaço. Os dois são verdadeiramente apaixonados por Triunfo, sua história, sua cultura e lutam para que isso seja divulgado entre os mais jovens.

Lucivaldo é professor de artes da Escola Nova Geração Triunfense, atua como produtor cultural independente. Ele concilia o trabalho de Regente da Filarmônica Isaias Lima, com o de cantor, compositor, arranjador, vocalista da Banda Templários e participante da Orquestra Maestro Madureira.

O autor deste artigo e André Vasconcelos

Já André é bacharel em hotelaria, já foi secretário de cultura de sua cidade, é funcionário do SESC-Serviço Social do Comércio, trabalhando no belo hotel que esta entidade mantem na cidade serrana e é um grande pesquisador do tema cangaço. Acredito que tudo que diz respeito ao cangaço em Triunfo e região, se ele não souber, chega perto.

Com extrema boa vontade, ambos se colocaram a disposição para apresentar as características e fatos históricos de Triunfo, de uma forma tranquila e aberta.

Nas nossas andanças me chamou a atenção como às pessoas na região são extremamente tranquilas e comunicativas, sempre buscando ajudar. Percebi que na busca de informações, é difícil alguém que não tenha algum fato em sua história familiar, relacionado a episódios relativos ao cangaço.

Na busca da Fazenda Abóbora, com a Serra Grande ao fundo. Mais de 900 metros de altitude.

Em um dos dias em que lá estive, busquei alugar uma moto 125 e fui com André desbravar os difíceis, longos e enlameados caminhos até a Fazenda Abóbora. Devido às chuvas, o trajeto foi bem complicado e quase caímos em algumas ocasiões. Mas o legal foi que André não perdeu a animação.

Durante o trajeto foi bonito ver a distância a famosa Serra Talhada. Neste caso não era a cidade, mas a elevação com mais de 800 metros de altitude que nomeia o lugar.

A Serra Talhada

A sede da Fazenda Abóbora fica praticamente escondida pelos contrafortes da chamada Serra Grande e seus mais de 900 metros de altitude. Já a passagem dos Riachos Abóbora e da Lage foi uma verdadeira aventura, pois ambos estavam com água corrente e, devido a ser final da tarde, não dava para ver a profundidade. Mas o negócio era encarar e seguir em frente. Graças a Deus deu certo.

Percebe-se com clareza no trajeto o quanto a região ainda é isolada. Existem serras cercando todos os quadrantes da propriedade, o que de certa maneira deixa a área bastante intocada. Tudo é muito bonito em termos naturais e paisagísticos.

Aspecto da região

Em meio a tantas situações interessantes, em um ponto mais alto, avistamos a casa grande da fazenda Abóbora. À primeira vista, à distância, confesso que fiquei até um pouco decepcionado. Achei que era “história demais, para casa de menos”. Mas não era bem assim.

Sede da Fazenda Abóbora

Devido à distância e as condições da estrada, chegamos praticamente à noite. Era estranho tentar imprimir velocidade na 125, em meio a uma estrada terrível, desconhecida, cheia de curvas, altos e baixos e o medo de não conseguir as fotos devido a falta de iluminação natural. Ainda bem que André foi um passageiro bem tranquilo na moto. Mas deu certo.

Na casa os proprietários não se encontravam, mas os moradores foram extremamente solícitos em nos receber e abriram as portas do local.

Oratório de São Sebastião

O interessante é que a residência está mantida praticamente na sua forma original. Com exceção do pequeno pátio, do murinho, portal e escadarias localizados na parte frontal, eles afirmaram que o resto da casa é todo original e a intenção dos donos é mantê-la como está. Ao redor existem antigas casas de moradores, a grande maioria desocupadas, mostrando que a quantidade de trabalhadores que havia no local já foi bem maior.

A antiga e preservada cozinha

Fizemos muitas fotos, mas por questão de respeito aos proprietários, apresentamos apenas o interessante oratório com a figura de São Benedito e a original cozinha com seu fogão a lenha.

Os caseiros do local informaram que vivem há anos no lugar e tiveram oportunidade de ouvir através dos moradores mais velhos, a maioria já falecidos, inúmeras histórias sobre a passagem de Lampião pela casa . Eles nós garantiram que era a primeira vez que conheciam pessoas que vinha à casa da Fazenda Abóbora em razão do tema cangaço.

A nossa visita foi rápida, mas valeu e muito.

Mas uma vez agradeço ao André Vasconcelos pelo apoio.

[1] Relatos transmitidos em entrevista gravada junto ao Sr. Antônio Antas, da cidade paraibana de Manaíra, em dezembro de 2008. O Sr. Antônio, parente de Marcolino Diniz, conviveu com o filho de Maçal quando este estava idoso e vivendo na Comunidade de Patos do Irerê. Vale ressaltar que é relativamente pequena a distancia da sede da Fazenda Abóbora para a cidade de Manaíra.

[2] Relato transmitido ao autor em entrevista gravada junto ao Sr. Antônio Ramos Moura, em agosto de 2006, em Santa Cruz da Baixa Verde.

[3] Para Frederico Pernambucano de Mello, autor do livro “Guerreiros do Sol-Violência e banditismo no Nordeste do Brasil” (2004), na página 244, afirma que Maçal Diniz conheceu Lampião e seus irmãos quando os mesmo já eram membros do bando de Sinhô Pereira, cangaceiro que igualmente recebeu proteção e apoio deste fazendeiro em 1919.

[4] Entrevista gravada com Antônio Antas, dezembro 2008.

[5] Sobre o combate de Lampião na Lagoa Vieira ver – tokdehistoria.wordpress.com/2011/02/10/quando-lampiao-quase-foi-aniquilado

[6] Segundo Frederico Pernambucano de Mello, Sabino também era conhecido como Sabino Gomes de Melo, Sabino Barbosa de Melo, ou ainda com os denominativos Gore, Gório ou Goa. Ver “Guerreiros do Sol-Violência e banditismo no Nordeste do Brasil” (2004), pág. 243.

[7] Rodrigues de Carvalho (pág. 164) afirma que Sabino nasceu na Paraíba, no lugar denominado Pedra do Fumo, então município de Misericórdia, atual Itaporanga. Pela lei estadual nº 3152, de 30 e março de 1964, o antigo distrito de Pedra de Fumo foi desmembrado do município de Itaporanga e elevado à categoria de município com a denominação de Pedra Branca. Está localizado a cerca de 20 quilômetros de Itaporanga. Pelo que escutamos durante nossas visitas a região, acreditamos que a versão do autor de “Guerreiros do Sol” é mais correta.

[8] Sobre o ataque a Sousa ver o livro “Vingança, Não”, de Francisco Pereira Nóbrega.

[9] Sobre este combate ver “Pernambuco no tempo do Cangaço – Theophanes Ferraz Torres, um bravo militar (2 volumes)”, de Geraldo Ferraz de Sá Torres Filho, págs. 379 e 380.

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A BATALHA DO CASARÃO DOS PATOS

Um episódio da (quase) esquecida Guerra de Princesa, na Paraíba

Autor – Rostand Medeiros

Ao longo da história da região Nordeste do Brasil, não faltam ocorrências que perpetuam a valentia de alguns e a covardia de muitos. Onde muitas histórias são regadas a sangue, com muitos tiros, correrias e tropelias.

Em toda a região os relatos sobre estes fatos são continuamente passados as novas gerações, muitas vezes através da tradição oral, do folheto de cordel, sendo depois documentados em livros, servindo então de temas para teses acadêmicas, que contestam ou corroboram os fatos. Outras vezes o espectro é ampliado e estas sagas chegam ao teatro, a televisão e ao cinema. Mas a tônica é uma só; estes episódios são sempre conhecidos e repetidos pela região.

Localização de Patos do Irerê e Princesa Isabel no mapa da Paraíba, onde está o casarão

Neste sentido, é de se estranhar que atualmente na região ocorra um acentuado desconhecimento e uma estranha falta de informações sobre o conflito deflagrado no ano de 1930, na região da atual cidade paraibana de Princesa Isabel, próximo à fronteira com Pernambuco e conhecido como a “Guerra ou Sedição de Princesa”.

Um Cruel Momento da História Paraibana

Esta guerra (e não a nenhum exagero de assim chamá-la) foi pródiga de episódios interessantes e cruéis, onde tudo começou através de discórdias políticas e econômicas, envolvendo poderosos coronéis do interior do estado e o governador eleito da Paraíba em 1927, João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque.

Governador João Pessoa

João Pessoa discordava da forma como o grupo político que o elegera conduzia a política paraibana, onde era valorizado o grande latifundiário de terras do interior, possuidores de grandes riquezas baseadas no cultivo do algodão e na pecuária. Estes “coronéis” atuavam através de uma estrutura política arcaica, que se valia entre outras coisas do mandonismo, da utilização de grupo de jagunços armados, da conivência com grupos de cangaceiros e outras ações as quais o novo governador não concordava.

Entre os embates ocorridos, podemos listar uma maior perseguição do governo estadual aos grupos de cangaceiros e a cobrança de taxas de exportação do algodão. Por esta época, os coronéis exportavam o produto principalmente através do principal porto de Pernambuco, em Recife, provocando enormes perdas de divisas tributárias para a Paraíba. Procurando evitar esta sangria financeira e efetivamente cobrar os coronéis, João Pessoa implantou diversos postos de fiscalização nas fronteiras da Paraíba, irritando de tal forma estes caudilhos, que pejorativamente passaram a chamar o governador de “João Cancela”.

O coronel José Pereira

Os embates políticos entre o governador e os coronéis foram crescendo. A maior liderança entre estes poderosos, sem dúvida foi o coronel José Pereira Lima, verdadeiro imperador da região oeste da Paraíba, na área da fronteira com Pernambuco, tendo como base, a cidade de Princesa. Do embate entre estes dois homens resultou em um dos maiores conflitos armados do Brasil Republicano.

Sertão em Armas

A contenda teve início em 28 de fevereiro de 1930, quando ocorreu a invasão da então vila do Teixeira (PB), por parte da polícia paraibana, com o aprisionamento da família Dantas, ligada por profundos laços de parentescos e interesses ao coronel José Pereira.

Apesar de governador João Pessoa não contar com o apoio do Palácio do Catete, onde o titular, Washington Luís, não viabilizou uma efetiva ajuda as forças policiais paraibanas, o mandatário paraibano foi à luta.

José Pereira e seus comandados durante a Guerra de Princesa

Com o apoio discreto, mas efetivo, do Presidente da República e dos governadores de Pernambuco, Estácio de Albuquerque Coimbra, e do Rio Grande do Norte, Juvenal Lamartine de Faria, o coronel José Pereira decidiu criar o “Território Livre de Princesa” com absoluta autonomia, separando-se durante o período do conflito do restante do estado da Paraíba.

Princesa se tornou uma fortaleza inexpugnável, resistindo palmo a palmo ao assédio das milícias leais ao governador João Pessoa. O exército particular do coronel José Pereira era estimado em mais de 1.800 combatentes, onde diversos desses lutadores eram egressos das hostes do cangaço e muitos eram desertores da própria polícia paraibana.

No lado do presidente João Pessoa, suas tropas estavam sob o comando do Coronel Comandante da Polícia Militar da Paraíba, Elísio Sobreira, do então Delegado Geral do Estado, Severino Procópio, e do Secretário de Interior e Justiça, José Américo de Almeida. Na tentativa de desbaratar os sediciosos de Princesa, estes comandantes dividiram os efetivos policiais, compostos por cerca de 890 homens, em colunas volantes.

Como a guerra era vista no Rio de Janeiro

No povoado de Olho D’Água, então pertencente ao município de Piancó (PB), estava aquartelado o comando geral de operações da polícia paraibana, que decidiu enviar à Princesa uma de suas colunas volantes, conhecida como “Coluna Oeste”. Esta coluna era comandada pelo Tenente Raimundo Nonato, que tinha entre seus principais comandados o valente sargento Clementino Furtado, mais conhecido como Clementino Quelé, ou “Tamanduá Vermelho” (por ser branco e ficar “avermelhado” quando nervoso).

Clementino Quelé

Quelé era a valentia em pessoa, calejado nas lutas do sertão, podia se vangloriar de possuir no seu “currículo”, mais de vinte combates contra Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião. Foi a volante de policiais comandadas por Quelé, a primeira a entrar em Mossoró, em 13 de junho de 1927, perseguindo Lampião e seu bando, logo após este ter tentado invadir esta importante cidade potiguar.

Composta de valentes combatentes foi para a “Coluna Oeste”  que o comando designou uma missão especial.

Marcolino Diniz na época da Guerra de Princesa

Em Princesa, entre um dos mais importantes líderes das tropas locais estava o fazendeiro Marçal Florentino Diniz, poderoso e influente agropecuarista da região, que juntamente com seu filho, Marcolino Pereira Diniz, eram parentes e pessoas da inteira confiança do coronel José Pereira. O coronel Marçal Diniz possuía no então distrito de Patos de Princesa, a 18 quilômetros da cidade, uma fazenda localizada no sopé da grande serra do Pau Ferrado, o segundo ponto mais elevado da Paraíba, com cota máxima em torno de 1.120 metros de altitude e foi para esta fazenda que o comando da polícia paraibana ordenou que Clementino Quelé atacasse a casa grande do poderoso coronel.

O Assalto de Quelé

Este episódio é conhecido na região como o “Fogo ou Batalha do Casarão dos Patos”.

A ideia deste ataque visava dividir as forças do coronel José Pereira, que teria de retirar homens da frente de combate de Teixeira, para socorrer os familiares da família Diniz que estavam no casarão, bem como formar com as reféns uma espécie de cordão de isolamento, um escudo humano, que objetivava garantir a segurança dos militares. Pensavam que, agindo assim, nenhum defensor de Princesa ousaria atirar nos combatentes do governo paraibano.

A imprensa oficial potiguar e o próprio governo de Juvenal Lamartine eram contra João Pessoa e a favor de José Pereira

Outra teoria seria a de levar as mulheres como prisioneiras, ou reféns, para a cidade de Paraíba do Norte (atual João Pessoa) e forçar os comandantes de Princesa a alguma espécie de negociação.

No dia do ataque, 22 de março de 1930, Quelé e seus policiais, em número estimado entre sessenta para alguns, e entre setenta a cem homens para outros, seguiram atravessando a zona urbana da pequena vila de Alagoa Nova (atual MANAÍRA-PB) e daí subiram a grande Serra do Pau Ferrado. Ao passarem pela propriedade de Antônio Né, pessoa ligada à família Diniz, no homônimo Sítio Pau Ferrado, assassinaram um cidadão por nome Silvino, depois, desceram a serra.

Dona Xandu, imortalizada pelo grande Luís Gonzaga na música “Xandusinha”

Não havia muitos defensores pertencentes aos grupos do coronel José Pereira, ou de Marcolino Diniz e a força policial de Quelé ocupa o local sem maior oposição. Na casa estavam entre outras pessoas, às mulheres de Marcolino Diniz, Alexandrina Diniz (também conhecida como Dona Xandu, ou Xanduzinha) e a de Luís do Triângulo, Dona Mitonha. Luís do Triângulo era um dos mais valentes e destacados chefes dos combatentes de José Pereira.

Neste interregno, o grupo de combate comandando por Marcolino encontrou um soldado da polícia de nome Zeferino, o qual seguia com uma mensagem do Sargento Quelé ao Delegado Geral do Estado, Severino Procópio, informando da ação contra o casarão.

O Casarão em 2006

José Pereira e Marcolino Diniz recebem a notícia da prisão de seus familiares. Eles tomam esta ação como um acinte, uma falta de respeito e preparam o contra ataque. Ordenam que uma parte de suas tropas que combatiam as forças policiais do governador João Pessoa na região de Tavares, se deslocasse para Patos de Princesa e ordenam que os homens levem farta munição. Outros combatentes conclamam moradores da região para o ataque, enaltecendo a covardia de Quelé, que usava mulheres como escudos. Este chamamento dos líderes de Princesa e de seus homens encontra eco entre membros das comunidades de Princesa e Alagoa Nova e estes decidem seguir com o grupo que vai retomar o “Casarão dos Patos”.

A Batalha Pela Reconquista do Casarão

Na noite do segundo dia após o bem sucedido ataque de Quelé, a situação permanece inalterada. Segundo relatos dos reféns, os soldados, com raras exceções, se portaram de forma vândala e arrogante durante a ocupação.

Na minha última visita a casa já praticamente coberta pelo mato

Enquanto isso os combatentes de Princesa vão discretamente fechando o cerco ao casarão. Aparentemente, por falta de comunicação com seus comandantes, Quelé não abandonou a posição e levou seus prisioneiros. Outros acreditam que ele logo percebeu que estava cercado e esperou o inevitável.

O certo é que na manhã do terceiro dia de ocupação, o céu se apresentava nublado, os defensores do casarão estavam tranquilos, apesar da tensão existente na região. Alguns esperavam o café, outros até jogavam uma improvisada partida de futebol (possivelmente com uma bola de meia), no pátio defronte a casa. É quando o primeiro tiro é detonado em um soldado que vinha do Sítio Pedra e trazia um carneiro para abate, aí tem início um inferno no “Casarão dos Patos”.

A polícia estava cercada na casa, se defendendo como podia, o sargento Quelé vai animando seus policiais em meio a uma intensa troca de tiros e insultos entre as forças combatentes.

Lateral do casarão, mostrando a construção maciça

Marcolino Diniz, à frente dos seus homens, está com o “cão no couro”, comandando, disparando e mandando buscar cachaça nas bodegas da pequena vila de Patos de Princesa para “esquentar” seus “cabras”. Esta cachaça era trazida em sacos, distribuída francamente entre seus combatentes. Até hoje se comenta na região como os distribuidores da bebida terminaram os combates totalmente embriagados e sem dispararem um só tiro.

O tiroteio é cerrado. Colocar a cabeça muito exposta nas janelas do casarão é motivo para que algum policial se torne um alvo fácil. Já os homens de Diniz continuam disparando sem cessar. Eles estão espalhados em todo o perímetro, protegidos por árvores, pedras, pelos muros e paredes das poucas casas vizinhas.

O combate prolongou-se até às dezesseis horas do mesmo dia, quando a polícia praticamente estava sem munição e seus disparos tornam-se esparsos. É quando os homens de Marcolino, aproveitando uma forte chuva que desabava e a existência de um canavial nas imediações do casarão, partem para o assalto final.

Sótão do casarão. Neste local, segundo os moradores da região, vários soldados paraibanos foram mortos. Até algum tempo atrás ainda haviam marcas de sangue nas paredes

Durante a invasão é travado um forte combate corpo a corpo em cada uma das dependências da casa. Gritos, pancadas, socos, pontapés, dentadas, tiros, facadas e sons de lutas ocupam o ambiente. Os homens de Quelé procuram à fuga, mas estando o casarão cercado, muitos são abatidos impiedosamente pelos combatentes de Marcolino.

Alguns policiais fugiam feridos ou não, pelo mesmo canavial que serviu de abrigo para os atacantes e de lá seguiam para a serra do Pau Ferrado. Nesta fuga, muitos combatentes se cruzavam, às vezes cara a cara, dentro do canavial e tiros ou facadas eram desferidas a curta distância.

O mato é tanto, que só derrubando algumas plantas para entrar no local

Marcolino, atiçado pela bebida e já dentro do casarão, prometia aos gritos “vou sangrar todo mundo, até Xandu” que no seu entendimento de valentão do sertão, com um pensamento extremamente machista, imaginava que a sua mulher já havia sido estuprada e aí só “sangrando para limpar o corpo”. Mas Xandu e as outras mulheres estavam bem e foram preservadas por Quelé e seus homens. Todas estavam em um quarto, acompanhadas de um soldado ferido na perna, que conseguira desarmar uma bomba (ou granada?), que o sargento Quelé colocara no recinto. O soldado salvou a vida das reféns, sendo igualmente salvo pelas mulheres de ser impiedosamente sangrado por Marcolino e seus “cabras”.

Marcas do passado

Após isto, Marcolino e seus homens seguiram pelos vários recintos do “Casarão dos Patos”, chacinando os policiais que não fugiram. Dos militares que lá dentro se encontravam, não sobrou nenhum vivo, pois até o soldado que havia salvado as mulheres, morreu no mesmo dia, devido aos ferimentos, quando era transportado para a vizinha cidade pernambucana de Triunfo.

Marcas Sangrentas

Segundo relatos dos moradores da região, havia até recentemente, em alguns quartos da casa, registros de mãos ensanguentadas nas paredes, mostrando a agonia deste dia terrível.

Um esquecido oratório dentro do casarão

Quanto a Quelé, vendo-se acossado pelos homens de Marcolino e escutando o próprio caudilho dos Patos de Princesa gritando dentro do casarão que “queria pegar Clementino e matá-lo sangrado”, pulou do andar superior, juntamente com dois soldados e juntos fugiram em direção ao canavial. Já era noite quando conseguiram chegar à serra do Pau Ferrado, depois seguem para Alagoa Nova e ao encontro das forças de João Pessoa. O restante dos militares que escapou com vida embrenhou-se em território pernambucano.

Uma dispensa aberta na parede, para guardar mantimentos

Das forças de José Pereira e Marcolino Diniz houve apenas uma baixa, um senhor de nome Sinhô Salviano, possivelmente sob efeito da cachaça, desprezou as ordens e ficou sob a mira dos soldados. Para alguns pesquisadores, as forças paraibanas perderam mais da metade do efetivo, mas segundo os relatos que se perpetuam na região, contados por aqueles que participaram do conflito e transmitidos para seus descendentes, foram mortos em torno de cinquenta policiais, sendo seus corpos enterrados em uma vala comum nas proximidades do casarão. Os equipamentos bélicos dos policiais mortos foram recolhidos pelos combatentes de Princesa para reforço de arsenal.

Fato comum; morador da região com um cartucho de fuzil Mauser intacto, encontrado ao arar o terreno próximo ao casarão.

Final da Guerra de Princesa

Houve outros episódios sangrentos e terríveis na Guerra de Princesa, mas após a morte, em Recife, do governador João Pessoa e a consequente eclosão da Revolução de 30, o conflito em Princesa acabou, era o dia 26 de julho de 1930.

O coronel José Pereira Lima organizou a defesa dos seus domínios de forma impressionante, provocando baixas estrondosas à força pública paraibana durante os quatro meses e vinte e oito dias que durou sua resistência.

A partir de um caminhão foi desenvolvido em Campina Grande um veículo blindado para combater os revoltosos de Princesa

Princesa não foi conquistada pela polícia paraibana. Após a eclosão da Revolução de 30, tropas do exército, de forma tranquila, ocuparam a cidade.

O coronel José Pereira e muitos dos que lutaram com ele fugiram da região e a família Diniz se retraiu diante do novo sistema governamental imposto. O tempo dos caudilhos do sertão estava chegando ao fim, pelo menos naquele formato utilizado por José Pereira.

Com o fim da guerra, a fortuna da família Diniz ficou seriamente comprometida. O combate e, principalmente, a ira dos soldados, destruiu tudo. Canaviais, engenhos de rapadura, moendas, casas e outros bens foram alvo da vingança dos fardados, quase nada escapou.

Depois da Guerra

Mesmo com as perseguições sofridas após o fim da guerra, todos os anos Marcolino Diniz e sua gente, comemoravam o aniversário da retomada do casarão com muita festa.

Marcolino Diniz próximo a sua morte

Marcolino sempre foi um homem controverso, valente, prepotente, astuto e sagaz. Era proprietário das fazendas Saco dos Caçulas e Manga, onde diversas vezes Lampião descansava dos combates. Esta polêmica amizade entre Marcolino e Lampião é bem retratada em um episódio; em 30 de dezembro de 1923, Marcolino, juntamente com seu guarda-costas conhecido por “Tocha”, por conta de uma briga, matam o então magistrado da cidade de Triunfo (PE), o Dr. Ulisses Wanderley. Marcolino fica ferido e é feito prisioneiro na cadeia pública local. Seu pai, o coronel Marçal, recorreu aos préstimos do cangaceiro a fim de libertar o filho. Não demora muito e um grupo armado, com um número de homens estimado em torno de 100 a 150 homens, retira tranquilamente o prisioneiro ferido da cadeia.

Igreja de Patos do Irerê, onde está enterrado Marcolino Diniz

Marcolino e a sua adorável Xandu, continuaram unidos até a morte, tendo seu amor sido imortalizado em 1950, por Luís Gonzaga e Humberto Teixeira, com a música “Xanduzinha”. Marcolino nasceu em 10 de agosto de 1894 e faleceu em Irerê, em 21 de dezembro de 1980, com 86 anos, conforme está inscrito em sua lapide, na igreja deste atraente lugarejo.

Casa de Marcolino e Xandu em Patos do Irerê

Já o sargento Clementino Quelé sobreviveu à Guerra de Princesa e ainda teria fôlego para perseguir, no ano de 1936, o bando do cangaceiro Virgínio Fortunato da Silva. Conhecido como “Moderno”, foi cunhado de Lampião, homem de sua mais alta confiança, que neste ano investiu contra a região conhecida como “Tigre paraibano”, atacando várias fazendas na área próxima a cidade de Monteiro. Quelé, possivelmente pelo analfabetismo, nunca passou da patente de sargento, tendo morrido idoso na cidade paraibana de Prata. Coincidentemente, Quelé também foi lembrado em uma música de Luís Gonzaga intitulada “No Piancó”.

Quem visita atualmente a antiga Patos de Princesa, atual Irerê, município de São José de Princesa, com suas casas antigas e bem preservadas, nem imagina que o carcomido e arruinado casarão existente no fim da rua principal, foi palco de tamanho conflito.

O grande amigo Antônio Antas apontando a área onde o pessoal de Princesa atacou as tropas de Quelé. Uma verdadeira memória viva da região

Mesmo em ruínas, o casarão impressiona pela imponência da sua estrutura, pela grandiosidade da sua construção. Nele existe um andar superior, com dois sótãos independentes, vários quartos e dependências, sendo um exemplo do poder emanado pelos coronéis da região. Em meio ao silêncio atual, se o visitante puxar pela imaginação, é possível ouvir os sons da batalha ali ocorrida no longínquo ano de 1930.

Nota – Especificamente sobre o “Fogo do Casarão dos Patos”, utilizo principalmente as lembranças de várias pessoas que vivem na região de Princesa Isabel, Irerê e Manaíra. Sendo as informações do senhor Antônio Antas Dias, residente na cidade de Manaíra, as narrativas mais utilizadas. Este senhor comentou sobre este momento histórico, em uma entrevista concedida no dia 14 de agosto de 2006. O Sr. Antônio Antas tinha 61 anos na época da entrevista, onde as informações que ele prestou lhe foram transmitidas principalmente por Marcolino Diniz, de quem era parente, pelo guarda costas deste último, Manoel “Ronco Grosso” Lopes, por José Florentino Dias, seu pai, e pelo senhor Sebastião Martins, morador do atual distrito de Irerê.

Igualmente utilizei os trabalhos do amigo e professor de geografia José Romero Araújo Cardoso, lotado na UERN-Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, em Mossoró. Estes artigos são “Marcolino Pereira Diniz e Xanduzinha: Imortalizados através da arte de Luiz “Lua” Gonzaga”, no link –

http://www.turismosertanejo.com.br/?target=artigos&id=69

Outro Trabalho do professor Romero, ao qual utilizei material para a confecção deste artigo, foi uma série de interessantes entrevistas realizadas entre 1989 e 1991, com diversas testemunhas sobre episódios do cangaço e da Guerra de Princesa, que está inserido no link –http://www.marcoslacerdapb.hpg.ig.com.br/romero/cangaco.htm

 – Este artigo já havia sido anteriormente publicado e reproduzido em sites de vários de amigos por este Nordeste afora, que colocam a devida referência em relação ao autor e vários outros sites que nem se preocupam com isso. Mas decidi colocar o meu próprio blog, com novas fotos para quem gosta destas antigas histórias do nosso sertão.

Um detalhe importante. Já faz um tempo que não vou por lá, nem sei se o casarão está mais de pé, mas se tiver, visite enquanto é tempo.

 Um abraço a todos

 Rostand 

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